Marcador

O Marcador de um livro tem muito a nos revelar, pois não bastando um abrir de páginas, demonstrando laudas à revelia. Necessitamos de pontos com marcar, limites, demarcações.

Ao demarcarmos um determinado momento paginal, damos importância a uma fração, contemplamos um hiato que sabre na brochura, abertura exposta feito ferida a sangrar.

Abrimos a fresta, adentrando no espaço localizado pelo objeto que marca, podendo fazer da própria folha uma marcadora, dobrando-lhe a ponta, fazendo orelha, uma fascinante dobra do objeto sobre si.

Marcadores podem criar, em uma mesma obra, diversas divisas, uma cartografia de fronteiras muito bem assinaladas.

Rasuramos com horizontais margens, pilares rígidos, tão evidentes que em dado momento os substituímos por canetas que destacam, forma de chamar a atenção, em aspecto de texto singular, seja por recordação de escrita ou mesmo solicitação de encaminhamento a uma leitura em curso.

Lâminas que cortam o conteúdo, independente da formatação livresca, causando fissuras na encadernação, evacuando fragmentos conforme a vontade do leitor, a contragosto do literato.

Recortes rústicos que historiadores fazem de forma mais sutil em suas pesquisas, mas sob o símbolo material da guilhotina da marcação, enxergamos com clareza a mutilação durante a execução de uma apropriação textual que faz sangrar o contexto, ainda que se faça com o texto, dentro do texto, a partir do texto.

Realmente parte, decepa, rasga, viola, violenta, irrompe, corrompe, um vão que deixar escapar uma claridade sutil, que num platonismo emergente, faz cegar num primeiro momento, sendo que num segundo ato, continua a obscurecer, mesmo que pareça já clareado.

Abrimos páginas feito pernas, introduzimos esse falo em régua, para imiscuir a cavidade, sendo que agregamos mais esoterismo, por mais que queira desvelar o penetrado.

Não seremos socráticos a ponto de crer nessa vulva parir idéias, mesmo com nossas ejaculações de estupradores literários, pois pisamos em solo já visto e revisto, simulado, infértil, no máximo um clone muito mal induzido.

Esse marcador é nosso bisturi, como bons cirurgiões, abriremos corpos livrescos, expondo organismos gramaticais em uma lógica de clínica semântica. O corte é preciso, por exigir o desejo de criar sulcos lingüísticos que venham escapar desse cárcere bibliômano, feito de celas em tomos.