Sobre o Moralista.

“O Moralista” é uma narrativa ou um conjunto de histórias que ganham, ao longo da leitura, o status de romance. No entanto, Evan do Carmo não segue o padrão convencional de romance: As histórias são fragmentadas, nenhuma levando a outra, e, nesse caminho, não há nem linearidade, nem cronologia.

As narrativas podem ser lidas de modo isolado, mas, na montagem, oferecem um quadro pungente da prática da agiotagem e do Brasil atual, onde esbarramos aqui e ali com um turbilhão de mesquinharia, injustiças, corrupção e exploração. Há de se observar que tudo acontece: desde impressões e lembranças do narrador, mediadas por um moralismo exacerbado, até retratos acurados de personalidades que compõem a sociedade atual brasileira.

No livro, Evan do Carmo faz com que o narrador, Vagner, se coloque a nu, e se colocando nos dá oportunidade de perceber algumas particularidades de sua alma: embora seja um agiota, é um observador das ações humanas, um moralista que tenta ver e compreender aquilo que é (e por que não aquilo que somos? ).

“O moralista” reúne fatos fictícios e verídicos, todos servindo para ilustrar a temática central do livro: na lei capitalista, sobrevivem apenas os mais fortes. Além dessa, outros temas demarcam o rico estilo da obra literária de Evan do Carmo: as facetas da relação do homem com o dinheiro, questões morais e moral cristã (como: a fé como vitalidade ou não).

As surpresas do romance não param por aí. Tudo nos é apresentado com uma abordagem filosófica, ou melhor, com argumentos filosóficos, o que faz com que “O moralista” ganhe também um caráter filosófico. O homem não é bom; O homem é só instinto, pura expressão do caos que procura em primeira instância o seu próprio bem, sem, contudo desconsiderar o bem dos que lhe são mais próximos; O homem não é obrigado a se curvar diante de Deus para ser feliz, uma vez que não há castigo pelo pecado, nem recompensa pela virtude.

O projeto de Evan do Carmo tem outras ambições mais: não se contenta apenas com as narrativas. Em nota final, ele dá pistas sobre sua proposta: “Eu, o Autor desta despretensiosa obra recomendo: Muita prudência aos homens de bem, afastem-se da política...”

A meu ver, as notas de rodapé não deveriam constar no livro, uma vez que todas as citações ficaram claras no texto. Mas isso não reduz em nada o valor do livro.

Pela diversidade de temáticas que discute, pela ousadia crítica que expõe, é um livro que merece ser lido e debatido.

Perseguir o propósito de Evan do Carmo é um desafio a que o leitor precisa perseverar. A recompensa é que uma vez descoberto, haveremos de nos transformar, em leitores críticos.

Rosemary Chaia Rodrigues