Ensaio: África

As árvores de Évora têm galhos fortes igual à voz de Ralimí quando teve que nos deixar e deu um adeus tão triste quanto o tronco ferido de um pinheiro que já não estava tão inteiro assim. Também não estavam inteiros os corpos daqueles meninos etíopes abandonados sem qualquer razão. A guerra não tem olhos, por isso ela não enxerga as vidas que ela destrói. Era uma vez um bosque que foi destruído pela guerra. Era outra vez uma família destruída pela guerra. No início eram árvores de Évora, agora é a guerra. Por quê?

As montanhas da Bretanha têm picos altos que lembra a altura do amigo que o Pilme trouxe certa vez, ele tinha um sotaque tão diferente quanto o céu meio vermelho meio laranja meio violeta de um fim de tarde antes da chuva na distante Barueri. Que lugar é esse? – pergunta uma pequena menina sudanesa. Fica muito longe daqui. Longe igual o Sol está da Terra? – pergunta ela de novo. Nem tanto, mas nesse lugar parece que o Sol está bem acima desse telhado. Ontem um leão matou o irmão daquela menina, mas nada é mais feroz do que o esquecimento que os grandes países têm desse lugar. As montanhas bretãs têm seus segredos, mas o que se passa com aquelas crianças não é segredo para ninguém.

O rio é caudaloso. Sua água é doce, fresca, agradável, mas não chega a quem precisa. A noção de doce que se tem é de algumas pessoas que chegam a certos lugares na dura tentativa de mudar a vida de outras pessoas. Elas tentam ser doces onde tudo é amargo. Encontram-se pessoas sedentas de atenção, famintas de afeto, mas encontram resistência de pessoas desagradáveis que atrapalham o serviço dessas doces pessoas. O rio parece que seca diante de tanta maldade, tanto egoísmo e desinteresse.

A aurora em Gana. Meio-dia no Zaire. Noite em Moçambique. Dia após dia e a África continua vítima da exploração, de feiticeiros, ditadores, líderes tribais, enfim são escravizados por eles mesmos, mortos por eles mesmos e por terceiros que ao invés de acabar com essa maldição acabam contribuindo ainda mais. Diamantes que valem mais que vidas, o turismo que enriquece, mas por que esse dinheiro não pode ajudar quem precisa? Continente repleto de gente precisando de atenção.

14/04/2012

Miguel Rodrigues
Enviado por Miguel Rodrigues em 14/04/2012
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