Resenha: Livro Água Viva, de Clarice Lispector

CEFET – Diretoria de Graduação - Departamento de

Linguagem e Tecnologia - Curso de Letras

Disciplina: Oficina de Texto Acadêmico e Comunicação Científica

Prof. Dra. Maria Raquel de A. Bambirra

RESENHA

Livro: Água Viva

Autora: Clarice Lispector

Editora: Rocco

Rio de Janeiro

1988

Autor da resenha: Luís Antônio Matias Soares

Água Viva, uma das mais belas obras da nossa literatura, foi composta em meados da década de 70, período histórico e político relacionado à ditadura militar no Brasil e no qual a censura e a opressão se fizeram dramaticamente presentes sobre todas as formas de arte e jornalismo. É um texto profundamente libertário tanto nos aspectos linguísticos e formais quanto naqueles referentes ao conteúdo. Dele se pode inicialmente afirmar ser um intenso monólogo no qual lentamente se vai expondo diante do leitor o panorama de um eu feminino que escreve a um tu masculino de forma lírica e poética, extravasando suas emoções, intuições, contradições e angústias. É nesse sentido, talvez, que se tenha comentado que a obra de Lispector (Wikipedia, 2011) “ultrapassa qualquer tentativa de classificação. A escritora e filósofa francesa Hélène Cixous vai ao ponto de dizer que há uma literatura brasileira A.C. (Antes da Clarice) e D.C. (Depois da Clarice).”

Mas, afinal, o que vem a ser de fato essa Água Viva: um romance, um conto, uma novela...? Água Viva se compõe de um único bloco textual que se estende ininterruptamente por 87 páginas recheadas de muitas confissões, considerações e sedução. Para além da arrojada proposta teórico-literária existente na formatação da obra, Água Viva nos remete, acima de tudo, a uma percepção mais apurada acerca da liberdade de uma autora e da própria autonomia do texto literário, visto aqui como algo vivo ou existindo por si mesmo. Nesta obra, Lispector tratará das questões que sempre atormentaram o ser humano. Ali elas circulam livres e se movimentam de um lado para o outro do texto: às vezes retrocedem, voltam-se sobre si mesmas e retornam ao ponto de partida para, em seguida, tomarem novo impulso e se lançarem na busca de novas indagações a respeito da realidade e da constituição da obra literária.

Um das principais preocupações do livro é, por exemplo, aquela relacionada à qiestão do tempo ou - como melhor designa a própria autora - ao instante-já. Logo nas linhas iniciais da obra, Lispector (1998, pag. 09) nos apresenta uma inquietante definição desse conceito: “estou tentando captar a quarta dimensão do instante-já que de tão fugidio não é mais porque agora tornou-se um novo instante-já que também não é mais. Cada coisa tem um instante em que ela é. Quero apossar-me do é da coisa”. Essa - e outras escavações personalíssimas! - fazem parte da busca da autora dentro e para além do próprio texto, sendo constituídas, desmembradas e reconstruídas a partir da sensação irremediavelmente terrível e maravilhosa captada na liberdade do eu através da expressão literária.

Finalizando, talvez seja por motivos como estes que os leitores mais arrojados e arrebatados costumem dizer que os livros de Lispector devem ser devorados de imediato e antes que eles próprios nos devorem. E é exatamente isso o que se passa com essa obra-prima da literatura nacional: como uma água viva marinha, este pequeno livro possui o dom de se fazer ardente o bastante para tocar diretamente no peito das pessoas, dispondo, em suas linhas e entrelinhas, de uma forma lingüística ricamente moderna e de um conteúdo que decerto incendiará a alma e o coração dos leitores mais apaixonados.

Referências

- Lispector, Clarice. Água Viva. Rio de Janeiro: Editora Rocco, 1988.

- Clarice Lispector. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Clarice_Lispector Acesso em 17 de abr. 2012