A ESSÊNCIA DA DESNECESSIDADE

A vida, principalmente para quem vive na cidade, tem-se pautado pela satisfação de uma necessidade. Ora é a necessidade de um carro novo, de uma geladeira com freezer, um novo microndas, ou até mesmo, uma nova calça, um sapato assim assado, enfim, nessa loucura que é a vida moderna, nós, sábios seres humanos, não estamos nunca satisfeitos, cada vez mais criamos, ou não seria, inventamos, novas necessidades. Nada, por mais que tenhamos, é o suficiente. Acumular, acumular e acumular, esse é o novo dogma e o deus mercado, com seus querubins, marketing e promoções, tem mais adeptos que todas a religões juntas. Nem com mais de três mil anos de história, Egito e China, conseguiram colocar seus protetores celestiais no topo do olimpo mítico. Mas o deus mercado, tem se fortalecido dia a dia, não importando quem quer que seja. O deus mercado não distingui credo, cor, raça. O deus mercado abraça a todos sem distinção. O deus mercado é único. Seu mantra, COMPRA, COMPRA, não precisa ser repetido feito ladainha. Ele se apresenta por todos os meios e vias. É nesse trajeto, nessa via crucis moderna, que a vida, somente a vida por ela mesma já não basta. A vida baseada no consumo adequado, sem excesso, não mais se justifica, ela precisa ser alimentada por novas e renovas necessidades. É preciso Ter, não Ser, para ser reconhecido. O tipo ideal do homem, aquele com preceitos como honestidade, honradez, amigizade, perdeu terreno para aquele que se apresenta segundo necessidades formais, isto é, precisa estar dentro de determinado padrão aceitável para ser recebido ou aceito como um igual. E é para atender a essas expectativas, que o homem moderno, imbuído de expectativas que lhe criam outras expectativas, perde-se e anda como se estivesse sobre pântanos. Daí nascem as depressões, as ansiedades, as síndromes das mais variadas, enfim, o homem moderno é patológicamente infeliz, depreciativo e depressivo; descartável. O homem moderno não sorri, não brinca. Ele tem que ser, religiosamente, sério e responsável. Ele não pode errar. O fracasso é sua pena de morte. Ele tem que ser CAMPEÃO! Ele é um ator nato: ele representa, ele é viril, é decidido, é engraçado. Ele está sempre rodeado de colegas, não de amigos. E para mantê-los, cria-se outras necessidades, que não se esgotam mesmo quando está sozinho. Não se esgotam porque o deus mercado é onipresente, é o Big Brother, está sempre de olho, seja no rádio, na TV, no Out door, no tablet, no celular. Aliás, esse tem sido o companheiro mais fiel do homem moderno. E sempre tem um que acabou de sair no mercado e que todos vão ter, ah, sim, vão ter porque é preciso estar ligado, conectado, ter amigos na rede. Quem não tiver hoje mil amigos virtuais, ou é um dinossauro ou maluco mesmo. Então, é precido saciar as necessidades. Mas eu faço um apelo, meu apelo, para que novas gerações sejam menos tristes: proponho que defendemos a Essência da Desnecessidade, que consiste, em nada mais nada menos, que deixar a vida fluir sem as amarras, impostas, do sucesso a qualquer preço. Que a vida seja simples e bela, como tem que ser tudo que se faz sem interesse. É isso.