OSCAR WILDE E O ETERNO JOVEM DORIAN GRAY

1. Introdução

Quem nunca sonhou em ter a aparência jovem por toda a vida? Ao longo dos anos a mudança intelectual é notada e observada por todos ao nosso redor, mas a mudança física é a que mais pode ser percebida, ou seja, que fica em evidência.

Muitos já almejaram essa perspectiva e isso não foi diferente para o autor Oscar Wilde. Em 1889, ele escreveu a primeira versão do romance “O Retrato de Dorian Gray”, o único dentre outras estilos literários como contos, novela, poesia, teatro e ensaios que produziu. A versão final foi publicada apenas dois anos depois.

2. Sobre o autor

Oscar Fingal O’Flahertie Wills Wilde, irlandês nascido em Dublin no ano de 1854 foi criado roteado pela literatura. Jane Francesca Wilde, sua mãe, era poeta nacionalista que colaborava na imprensa com seus poemas e artigos, muitos deles polêmicos por defender a identidade irlandesa.

William Wilde, seu pai, era médico com especialização de oftalmologista e otorrinolaringologia. No entanto, gostava muito de escrever, diz à lenda que muitas vezes em vez de cobrar pelas consultas, pedia que os pacientes lhe contassem lendas, superstições locais, receitas medicinais e feitiços, material que reunirá e transformaria em livros sobre a cultura popular do povo irlandês.

Pode-se dizer que Oscar Wilde cresceu em um ambiente de fartura. Embora tenha passado por problemas familiares, como a morte de Isola, irmã mais nova que morrerá aos nove anos. Ele, juntamente com seu irmão Willie, estudaram em Portora e logo após em Trinity College, onde tiveram uma formação humanística bem intensa.

Durante esse período em que Wilde estava em Trinity foi que ele iniciou seu interesse por cultura clássica e principalmente pela estética, característica bastante presente em seu único romance.

Cursou letras clássicas em Oxford, e foi durante as aulas com os professores John Ruskin e Walter Pater que Wilde buscou sua visão de estética, de uma vida estética.

Após se formar, Wilde se tornou porta-voz da corrente esteticista na Inglaterra e também em outros países. Logo após o lançamento de seu primeiro livro, Poems, o qual obteve sucesso e polêmica, o escritor passou um longo período nos Estados Unidos, nessa época ministrou palestras e suas vestimentas exuberantes e esteticismo acentuado foram motivos para chocar a sociedade local.

Nesse momento que entrou em cena o Oscar Wilde que conhecemos, desfilava com seu dandismo em uma corrente de estética e ideológica que repercutia na impressa e na sociedade vitoriana. Após uma viagem a Dublin, ele conheceu a jovem Constance Lloyd com quem se casou em 1884. Foram pais de dois filhos, Cyrill e Vyvyan. Não demorou muito para que Wilde trocasse esse lado de marido e família e revelasse seu lado homossexual.

Wilde era daquelas pessoas que têm respostas para tudo, criava frases incisivas nas quais revelava sua inteligência e facilidade para a concisão de pensamento. Com isso, continuou sua vida de conferencista atraindo sempre um público significativo.

3. Sobre a obra

O livro “O Retrato de Dorian Gray” é uma obra encantadora. Esse romance trata da vida de um jovem de admirável beleza que se deixa retratar pelo pintor Basil Hallward, este sustenta por ele uma paixão secreta.

Nesse romance podemos encontrar vários fatores como a moral, a ética, a religião, a tragédia e principalmente a estética. No entanto, é a tragédia o fator condutivo desse enredo.

O narrador aparece poucas vezes, por isso, grande parte da história se dá através de diálogos. Esse drama é caracterizado por atos teatrais movimentos, gestos e com conversas filosóficas.

O livro nos traz essas e outras figuras, cujas atitudes vão se apresentando no desenrolar da narrativa. E é através dos personagens principais: Dorian, Basil e Henry. Que podemos conhecer e analisar detalhadamente a sociedade inglesa no final do século XIX.

Nas primeiras páginas do livro, Basil Hallward mostra ao seu amigo Lorde Henry sua obra prima e nesse momento relata como conheceu o modelo que retratou. No decorrer da narração, fica evidente o carinho que Basil passa a ter por Dorian a partir do momento em que se conhecem.

Lorde Henry questiona Basil “Com que constância você o vê?” Basil responde: “—Todos os dias. Eu não seria feliz se não o visse todos os dias, para mim, ele é absolutamente necessário.”. É notável também o sentimento de ciúmes por parte de Basil, quando Henry e Dorian passam a cultivar uma amizade.

Dorian e Basil fazem inúmeros programas juntos, são quase almas gêmeas, vão ao teatro, tavernas, parques, sempre juntos. No entanto, a presença de Henry, que é casado, cria praticamente um triângulo amoroso. Sendo que nessa situação, Basil se sente ameaçado, com medo de perder a amizade de Dorian.

Portanto, a questão da homossexualidade é abordada desde o princípio da obra, muitas vezes entre linhas.

É no segundo capítulo que Dorian vê pela primeira vez o retrato. Ao vê-lo fica perplexo e admirado com a sua própria beleza. Isso fez com que ele viesse a pensar sobre a questão natural de envelhecimento do ser humano. E nesse momento em que ele fala aos seus amigos, Basil e Henry:

—Como é triste! Eu vou ficar velho, horrível, pavoroso. E este quadro permanecerá jovem, para sempre. Não envelhecerá um dia além deste dia específico de junho... Ah, se fosse o contrário! Se fosse eu a permanecer jovem para sempre, se fosse o quadro a envelhecer! Eu daria... eu daria tudo por isso! É isso mesmo, não há nada neste mundo que eu não daria em troca! Daria até mesmo minh’alma. (p.43)

Nota-se que é nesse fragmento que Dorian reflete sobre a possibilidade de ficar eternamente jovem.

Quando visualiza o quadro, Dorian fica com ciúmes do próprio retrato e assim, reafirma o seu insólito pedido sobre ficar sempre com uma aparência de moço. E fala para Basil:

—Tenho ciúmes de qualquer coisa cuja beleza não morra. Tenho ciúmes do meu retrato, que você pintou. Por que ele vai ficar com as coisas que vou perder? Cada momento que passa leva alguma coisa de mim e dá alguma coisa a ele. Ah, se fosse o contrário! Se fosse o quadro a mudar, e eu a permanecer como sou agora! Por que você o pintou? Um dia, ele vai zombar de mim... vai zombar muito de mim! (p.44)

A questão do esteticismo está presente em toda a obra. A valorização da aparência em si, da beleza do ser humano, o dandismo – modo de se vestir – pode ser observado a todo o instante no transcorrer da história.

A amizade entre Dorian e Henry fica mais forte, ele apresenta ao jovem algumas teorias em defesa do individualismo, da arte pela arte, da não importância à vida comum, do prazer extremo etc., esses fatores influenciam diretamente na vida de Dorian, fatores que Basil não aprova. Pois, após os conselhos de Henry, o jovem passa a mudar seu comportamento. Ideias sobre a beleza eterna, o hedonismo, assuntos mundanos entre outros, passaram a fazer parte do cotidiano do jovem de beleza invejável.

É percebível que Dorian realiza seu desejo a partir do momento em que ele, ao apreciar seu retrato, observa que estranhamente a pintura começa a envelhecer e aparecer novas marcar na face e mancha de sangue nas mãos. Mas, ao mesmo tempo ele se olha no espelho e vê seu rosto e corpo perfeito e jovial.

Coincidentemente, isso ocorre posteriormente ao suicídio de Sibyl Vane, após ser abandonada por Dorian. No início do relacionamento, ambos apaixonados, trocam juras de amor eterno e o jovem a idolatra de forma compulsiva, tanto que para a surpresa de todos, a torna sua noiva em questão de pouco tempo. Mas Dorian não admite a má interpretação de Sibyl no palco – motivada pelo amor de Dorian, ela acredita que não precisa mais atuar depois que o conhece – e por isso, abandona-a.

Você costumava mexer com minha imaginação e agora nem mesmo mexe com minha curiosidade. Você já não produz efeito algum. Eu a amava porque você era maravilhosa, porque possuía genialidade, intelecto, porque realizava os sonhos dos grandes poetas, dava forma e substancia às sombras da arte. Você jogou tudo fora. Você é superficial, é maçante. Meus Deus! E eu que estava tão louco de amor por você! Que tolo fui! Você já não é mais nada para mim. Jamais mencionarei seu nome [...]. (p.118)

Logo que Dorian abandona a atriz, a mesma não perde tempo e tira a própria vida por causa do relacionamento frustrado. Ao receber a notícia do falecimento da Sibyl, Dorian age friamente, fato que impressiona todos seus conhecidos, principalmente Basil.

Após esse acontecimento, ao notar mais mudanças no retrato, Dorian passa a esconder a imagem no sótão e resolve seguir com a libertinagem e prazeres de toda ordem. Já que o retrato se encarregaria do peso de sua vergonha.

Ele poderia acompanhar a própria mente adentro de seus locais secretos. Esse retrato seria, para ele, o mais mágico dos espelhos. Já que lhe revelara o próprio corpo, revelaria também a própria alma. E no momento em que o inverno viesse descer sobre o quadro, ele ainda estaria no ponto em que o inverno viesse descer sobre o quadro, ele ainda estaria no ponto em que a primavera estremece com o raiar do verão. (p.141)

No livro há intertextualidade de fragmentos do escritor Skakespeare das obras Romeu e Julieta (p.112).

Ofendeis vossa mão, bom peregrino,

Que se mostrou devota e reverente.

Nas mãos dos santos pega o paladino.

Esse é o beijo mais santo e conveniente...

E de Hamlet (p.272)

“É como pintar a tristeza

Um semblante sem coração.”.

O fator que predomina na obra realmente é o esteticismo. Todo instante pode-se perceber os elogios, muitas vezes exagerados, que Dorian recebe. Muitos o nomearam como ícone da beleza.

A princípio, Dorian estava satisfeito, já que todos os pecados e as coisas terríveis que cometia era o quadro que sentia. Mas, com o passar do tempo, ele quase se torna uma figura fria, vazia, como se fosse uma estátua.

4. Bibliografia

Oscar Wilde se dedicou a vários trabalhos como contos e novelas “O Príncipe Feliz” e “O Fantasma de Canterville”. Poemas e ensaios também fazem parte de sua bibliografia.

Seu único romance foi “O Retrato de Dorian Gray” publicado em 1891.

Por um período, Wilde se dedicou ao teatro. Escreveu peças como “O leque de lady Windermere” de 1892, “Uma mulher sem importância” datada 1893, “Um marido ideal” escrito em 1895 e “A importância de ser prudente” escrita no mesmo ano.

Durante o período em que esteve preso, escreveu o texto confessional “De profundis” e ao sair da cadeia, escreveu “A balada do cárcere de Reading” um relato sobre os dias em que ficou na prisão.

As histórias de Wilde chegaram a ser comparadas com contos de fadas, justamente por serem, muitas vezes, demasiadamente fantasiosas.

5. Conclusão

Aos lermos sobre o escritor Oscar Wilde e sua esplêndida obra “O Retrato de Dorian Gray”, podemos observar certas semelhanças entre o escritor e o protagonista do livro. Inclusive, certa vez Wilde confessou a uma amiga: “Receio que se pareça bastante com minha vida – repleto de conversas e nenhuma ação”. Por coincidência ou não, Wilde era homossexual, assim como Dorian.

Essa obra é certamente uma ótima maneira de aprendermos sobre o esteticismo. Pode-se dizer que Dorian foi um herói por conseguir ter aquilo que muitos desejam – a eterna beleza – no entanto, é notável que a personagem levou esse fator às últimas consequências, ou podemos dizer que ele apenas foi uma ingênua vítima do sua própria ambição.

Dorian, o jovem de beleza invejável, desfrutou da libertinagem e de uma vida mundana. A verdadeira tragédia foi recolhida nas camadas de tinta, em toda a sua crueza.

6. Referências

OSCAR, Wilde. O Retrato de Dorian Gray. Tradução de José Eduardo Ribeiro Moretzsohn. São Paulo: Abril, 2010. (Clássicos Abril Coleções; v.4)