A PSICOLOGA

A PSICOLOGA

Nos intermeios onde a mente se confunde,

A razão deixa de ser a autora dos sentimentos.

No olhar que projeta uma luz opaca

A voz se confunde na ansiedade

Que dita os parâmetros sem fundamento

Na indecisão que regala as atitudes.

O suor frio que agasalha as mãos tremulas

Tinge o vestido amarrotado

Onde no armário escuro

Guardou seu destino.

Os cabelos em desalinho,

O hálito por perfumar,

Os dentes amarelos,

É modelo irreal

Para quadros surrealistas

Onde Picasso vibra, nas cores e formas,

Daquela alma e figura

Fora do contexto.

Diante dela, a testemunha que a ouve,

Procura chaves e segredos

Para amenizar aquela louca procura.

Sente no coração daquele ser

Que o abismo é fator real

As estradas se confundem

Numa profusão de sentidos

Que nenhum mapa consegue organizar.

Na escolha das palavras e gestos,

Tenta uma aproximação da jaula

Onde a fera acuada

Mostra os dentes da rejeição

E os “porquês” sem sentido.

A ouvinte tenta abrir livros em sua mente

À cata de ensaios e projeções,

Onde professores e estudiosos

Colocaram em evidencia em salas de aulas

O prognóstico para cada situação.

Procura mostrar com delicadeza

Sem exagerar na doçura;

Que existe um segundo sol,

Uma segunda montanha,

Outra ponte paralela,

E a convida a trocar o cenário.

Porém a dona do armário

Engole a chave.

Tesa os músculos e dentes,

Seus olhos vermelhos fixam-se na doutora:

Sinal vermelho aceso,

Perigo,

Atenção,

Contenção,

Às palavras e postura.

Mais um abismo criado,

Mais uma ponte caída,

Mais uma corda rompida.

Os segundos que se seguem são fatais.

A necessidade de romper esse clima é crucial.

Paginas e mais paginas folheiam na sua mente,

Anotações em papeis soltos,

Seus bolsos mentais

Esvasiam-se rapidamente,

E a doutora tenta uma saída:

Criar um som fora do contexto,

Algo que a paciente se concentre

E consiga quebrar o silencio da sua mente.

Tenta o blefe:

Ela finge que vai pegar algo

Que está ao lado de um copo com agua

E o derruba deliberadamente,

Com uma segunda intenção.

Eureca! Fato consumado e aplaudido na sua mente.

Quem está a sua frente

Num lampeja rápido

Tenta segurar o copo, em vão.

A agua corre livre sobre a mesa,

Dessa vez o dique rompido

Salvou a cidade.

Foi estabelecido uma conexão:

Quem estava precisando

Percebeu que tinha condições de ajudar

E sorriu, um sorriso pequeno, mas sorriu.

Talvez percebendo que também a doutora

Tem seus dias ruins.

Di Camargo, 18/09/2012