Outra Volta do Parafuso

1. Introdução

As histórias sobre fantasmas nos assustam há muito tempo. É normal relatarmos fatos que ouvimos – ou até que presenciamos – sobre seres extraordinários, sejam eles fantasmas, seres extraterrestes e até mesmo as figuras de mitologias e folclores. Seja lá qual for à personagem da história ou estória, é fato que nos deixe amedrontado e o pior, com medo.

Outra volta do parafuso é uma obra fantasmagórica em que ocorrem aparições sobrenaturais, há certos momentos que o suspense e terror tomam conta do enredo.

2. Sobre o autor

Nascido em Nova York no dia 15 de abril de 1843, Henry James passou parte de sua vida junto de sua família no gracioso bairro Washington Square. Seu pai, também de nome Henry, foi um intelectual – teólogo e filósofo – bastante abastado que acreditava que somente através do contato com o mundo é que se chegava a uma boa educação.

Ainda muito jovem Henry foi à Europa, lugar onde viveu por muitos anos estudando em escolas na França, Inglaterra, Roma e Genebra. Durante esse período Henry se dedicou à leitura e desenvolveu um gosto especial pelos autores Honoré de Balzac, George Elliot e Nathaniel Hawthorne, autores que influenciaram em sua literatura inicial.

Retornou à terra natal aos 19 anos e em seguida ingressou na Harvard Law School. No princípio estudou direito, mas aos poucos foi se desvinculando e passou a direcionar os estudos à literatura.

Henry nunca se casou, aparentemente não há registros no decorrer de sua vida sobre nenhuma relação amorosa, seja com alguma mulher ou com algum homem. Se houve uma paixão amorosa que lhe tocou o coração, alguns biógrafos dizem que talvez tenha sido por sua prima Minny Temple – que precocemente morreu em 1870 – e que lhe inspirou na criação de suas principais heroínas: Milly Theale, de “As asas da pomba” e Daisy Miller, do livro Daisy Miller.

Teve a grande honra de conviver com vários escritores reconhecidos, como Gustave Flaubert, Ivan Turgueniév, Émile Zola, Alphonse Daudet e Guy de Maupassant.

No ano de 1876, James fixa moradia na Inglaterra e anos depois – no final de sua vida – ele adota a cidadania britânica. Ele foi um dos grandes inventores do flash-back e da narração indireta. Este último foi se tornou uma espécie de marca-d’água em suas obras. Segundo Otto Maria Carpeaux em seu livro “História da literatura ocidental” James opera como um dramaturgo, pois em vez dele intervir no palco, “deixa pensar, agir e representar os próprios personagens, ficando ele mesmo em imparcialidade soberana.”.

Henry James foi um escritor que teve o privilégio de poder se dedicar integralmente à literatura. Por isso, sua herança literária é gigantesca. Trouxe o fluxo de consciência, fato que o liga definitivamente com a literatura moderna.

James morreu no dia 2 de dezembro de 1915 em decorrência da pneumonia. Passou seus últimos dias em Rye e suas cinzas foram levadas para Cambridge, Massachusetts, nos Estados Unidos, local do jazigo de sua família.

3. Sobre a obra

Henry James escreveu a novela Outra volta do parafuso no ano de 1898. Esta obra de teor fantasmagórico prende o leitor do início ao fim, ou seja, é uma obra encantadora composta por poucas personagens: a preceptora/narradora, os antigos funcionários Srta. Jessel e Sr. Quint, os órfãos Miles e Flora, o tio das crianças – figura ausente – e a governanta Mrs. Grose.

O nome da obra aparece no início do livro: “Se uma única criança aumenta a emoção da história e dá outra volta ao parafuso, que diriam os senhores de duas crianças?” (p.10). Esse é o único momento em que o nome do livro é citado, não dá pra saber ao certo o que realmente isso quer dizer. Isso pode se referir a questão da pressão propriamente dita que acontece quando se dá uma outra volta no parafuso ou a pressão psicológica, por exemplo, ao questionar alguém para que o mesmo conte algo, no caso, um segredo. No caso da obra, essa pressão se volta às crianças, pois em momentos da história a preceptora de certa forma pressiona Miles e Flora para saber se eles realmente veem fantasmas e os mesmos a ignoram.

O enredo relata a história de duas crianças, Miles e Flora, que vivem em uma mansão mantida pelo tio, homem descrito como íntegro e milionário, sob a supervisão da governanta Mrs. Grose e uma preceptora, única personagem na trama que o nome não é revelado.

Durante um encontro de amigos, na época de natal, eles começam a conversar em volta de uma fogueira, sobre algumas histórias misteriosas que envolvem fantasmas. Douglas fica instigado ao ouvir tais narrações, por isso decide ler um manuscrito na qual há relatos que surpreenderão todos ali presentes.

A pessoa que escreveu à história que Douglas lerá aos seus amigos nada mais é do que a preceptora de Miles e Flora. Jovem pobre que iniciou a carreira aos 20 anos de idade junto aos órfãos. Após todo o incidente, ela também foi preceptora da irmã do jovem Douglas, eles selaram a amizade, com isso entregou-lhe o manuscrito da sua experiência nada normal, fato que até então nunca havia compartilhado com nenhuma outra pessoa.

Douglas fala com carinho da sua relação com a preceptora aos amigos:

– Era uma criatura sumamente encantadora, mas dez anos mais velha do que eu. Era a preceptora de minha irmã – disse suavemente. – Em sua posição, foi a mulher mais agradável que conheci; era digna de qualquer ocupação infinitamente superior. Isso aconteceu há muito tempo, e o episódio havia ocorrido muito tempo antes. Eu estava em Trinity e a encontrei. Aquele ano, passei em casa muito tempo. Foi um ano magnífico. Durante as horas em que ela estava de folga, passeávamos pelo jardim e conversávamos, e, ao ouvi-la falar, causou-me surpresa notar que ela era extraordinariamente inteligente e agradável. Sim, não riam: eu gostava muitíssimo dela e, ainda hoje, me alegra pensar que ela também gostava de mim. Se não gostasse, não me teria contado a história. Não a havia contado nunca a ninguém. Não que ela me houvesse dito isso; é que eu sabia que ela não a havia contado. Tinha certeza. Sentia-o.” (p.12)

Neste fragmento nota-se certa afinidade e um sentimento de intimidade da parte de Douglas pela preceptora.

A educadora, após a sua segunda entrevista, apesar de todas as recomendações – de não incomodar o tio das crianças em nenhuma circunstância – deixou-se encantar pelo moço e resolveu aceitar o emprego para cuidar das crianças.

A princípio a jovem fica entusiasmada, gosta do ambiente de trabalho e das pessoas que lá residem. No decorrer dos dias, alguns fatos misteriosos incidem, um dos mais intrigantes é a expulsão de Miles da escola. O motivo é questionado ao longo da história juntamente com a morte dos antigos empregados.

A primeira aparição advém quando a preceptora está em um dos seus momentos de descanso. Ao realizar seu passeio habitual, passa a imaginar determinada situação em que encontraria um príncipe encantado exatamente como ocorre nos contos. No transcorrer do trajeto, teve a sensação de que sua fantasia se realizará. Ao olhar para o topo da torre vê um homem alto.

O homem que surgira ante os meus olhos não era a pessoa que eu precipitadamente, supusera. Isso me deixou tão perplexa e confusa que ainda hoje, depois de todos estes anos, não posso encontrar uma surpresa que se lhe compare. Um homem desconhecido, num lugar solitário, é coisa que, facilmente se admitirá, pode assustar uma jovem tímida que até então não se afastara jamais do seio de sua família, e a figura que se erguia diante de mim (bastaram poucos segundos para convencer-me disso) era tão diferente de qualquer pessoa minha conhecida como da imagem que eu tinha em mente. Não a vira em Harley Street; não a vira em parte alguma. (p. 38)

A narradora detalha esta primeira aparição com certo entusiasmo. Pois até então não se dera conta de que o homem que estava na torre era um fantasma até que:

[...] eu o vi, como vejo as palavras que traço nesta página; depois, exatamente após um minuto, como para aumentar o efeito da cena, mudou lentamente de lugar, passando, sem deixar de olhar-me fixamente durante todo o tempo, para o lado oposto da plataforma. [...] E desapareceu. Isso foi tudo que percebi.

Após esse acontecido a narradora fica intricada e depois de alguns dias ela recorre a Mrs. Grose e relato tudo que aconteceu.

No decorrer da narrativa outras questões se realizam, isso faz com que a narradora chegue à conclusão de que não é a única que tem visões. Determinado momento, ela crê que Miles e Flora correm perigo, a partir disso disponibiliza todo seu tempo para cuidar e se dedicar às crianças.

Há relatos de que o autor da obra se inspirou em histórias que ouviu do Arcebispo Edward White Benson sobre duas crianças possuídas por fantasmas e ainda em textos médicos sobre epilepsia de lóbulo temporal.

4. Bibliografia

James publicou seu primeiro conto “A Tragedy of Error” quando tinha apenas 22 anos. A partir disso, passou a viver para a literatura. Felizmente, teve experiência dos dois mundos – o Velho e o Novo – fatores que são nitidamente perceptíveis em sua prosa.

Um livro muito importante em sua carreira literária foi “Um peregrino apaixonado e outras histórias”, obra composta por vários contos que abordam a cultura do Velho mundo em contra partida dos novos padrões comportamentais ianques.

O mesmo tema se repete nos primeiros romances que James escreveu quando estava na Europa, mas precisamente na Itália: “Roderick Hudson”, “The American” e ainda, o clássico “Retrato de uma senhora”.

“The Europeans” e “A herdeira” também são obras que se destacam na primeira fase de James.

Já na segunda fase, marcada pelas decepções da meia-idade, James se destaca com os romances “The Princess Casamassima” e “The Tragic Muse”.

A terceira fase, que ocorreu mais para o final de sua vida, o autor revive a própria obra e com isto escreveu seus prefácios. Nesse momento sua preocupação se volta para a moral entre o bem e o mal.

As obras mais importantes desse período são: “The Ambassadors”, “The Wings of the Dove” e “The Golden Bowl”, além de muitos contos.

Em relação à popularidade, as obras em destaque foram as da primeira fase e algumas da segunda, como “Outra volta do parafuso”.

5. Conclusão

A outra volta do parafuso é uma obra bastante atraente que segura o leitor do seu início ao fim. Embora assustadora, é também uma história de tensão que nos traz curiosidades a respeito das personagens.

Na obra inteira não encontramos maiores informações e detalhes sobre os órfãos, os antigos funcionários – possíveis fantasmas – e a preceptora, nada se sabe de suas origens, de seus antepassados e muito menos da narradora.

A narrativa em primeira pessoa nos surpreende de forma que há momentos que não conseguimos ter certeza de fato do que realmente está acontecendo, se há fantasmas ou se isso faz parte apenas da imaginação da narradora.

De certa forma, a obra em questão nos remete a alguns filmes de suspense, por exemplo, Sexto Sentido e Os Outros. No entanto, os mencionados longas-metragens dão solução ao mistério, revelando os fenômenos sobrenaturais: de que os personagens estavam mortos e se comunicando com o mundo dos vivos. Já a obra em estudo deixa uma dúvida pairada no ar, dando ao leitor a livre interpretação dos fatos narrados. A conclusão acerca dos mencionados fenômenos é elaborada individualmente, sendo subjetiva a explicação de todos os acontecimentos, sobrenaturais ou não.

6. Referências

JAMES, Henry. Outra Volta do Parafuso. Tradução Brenno Silveira. São Paulo: Abril, 2010. (Clássicos Abril Coleções; v.21)