Eça de Queiroz: um gênio das Letras

O presente ensaio tem por objetivo mostrar como Eça de Queiroz afastou-se da escola literária realista-naturalista e perceber a peculiaridade de sua obra, no que ela tem de mais singular e genial. Os textos que serviram de base foram a História do texto, fragmento extraído do livro Edição crítica das obras de Eça de Queiroz, de Carlos Reis e Maria do Rosário, e o ensaio de Jaime Cortesão, O escritor e a sua família literária, publicado no livro Eça de Queiroz e a questão social.

Em História do Texto, fragmento de número 4, pertencente ao livro Edição crítica das obras de Eça de Queiroz, o autor Carlos Reis, após fazer uma análise sobre as três versões de O crime do padre Amaro, tomando da 1ª. à 3ª. versão, expõe o quanto Eça mudou os aspectos estilístico-estruturais da obra em questão. Tais alterações vão para além da simples revisão estilística, o que culmina em diferenças consideráveis de uma edição à outra.

Parece-nos que essas modificações, segundo afirmação levantada por Carlos Reis, são o resultado do amadurecimento dos processos literários, relacionados com a reinterpretação que Eça de Queiroz faz da doutrina naturalista.

Porém, as transformações estruturais ocorreram também em outras obras como o Mandarim, o conto Civilização (modificado e ampliado no romance A cidade e as serras) e a A ilustre casa de Ramires, denotando o poder de criação queiroziano, capaz de exceder e superar as taxações críticas e, inclusive, as escolas literárias.

Prova disso é que, depois do lançamento da terceira edição de O crime do padre Amaro, algumas críticas a respeito da obra insinuam o afastamento do autor das escolas realistas e naturalista, procurando criar uma escola individual, sem nenhum vínculo com as já existentes. Em uma nota não assinada na Bibliografia portuguesa e estrangeira, por exemplo, o autor do texto escreve o seguinte: “Este novo livro parece todavia afastar-se dos processos do realismo, e o autor como que procura criar uma escola nova, individual, e sem ligações com as que existem.” O próprio Antero de Quental escreveu que Eça tinha adquirido uma certa “liberdade de movimentos”, somente compreensível quando um autor adquiri liberdade com relação as escolas literárias.

Basta notar até aqui o fato de que as alterações promovidas pelo escritor em suas obras manifestam não só uma atitude de aperfeiçoamento do estilo literário, mas, também, as inclinações de um gênio das letras, bastante atento às transformações, à sociedade e às influências recebidas, em que o discurso social esteve sempre presente.

Uma outra característica a ser aponta, digna apenas dos grandes artistas, é aguçada percepção sensível da realidade. Sem sombra de dúvida que todo o trabalho do autor de o O crime do padre Amaro foi permeado pela sensibilidade, cuja capacidade era traduzir por forma nova as impressões capitadas. Em seu ensaio O escritor e a sua família literária, Jaime Cortesão aponta quatro tipos de sensibilidades que o tornam um escritor singular e, por isso, genial. São elas: sensibilidade de super-sensual, sensibilidade espectroscópica, sensibilidade táctil e sensibilidade musical.

Esse conjunto de suscetibilidades, somando-se ao ambiente histórico e social de Portugal, deixaram impressões várias no espírito de Eça de Queiroz, as quais se tonaram forma literária e hoje podem ser lidas analisadas e avaliadas. Obras essas que demonstram o quanto Queiroz foi único, magistral e crítico ardoroso de seu tempo, pois a faculdade de observação e talento literário lhe propiciavam isso.

Por tal razão, hoje o nome de Eça de Queiroz é reconhecidamente um dos grandes vultos surgidos nas letras portuguesas e na literatura mundial, capaz de resistir às inúmeras leituras e releituras. Porque é clássico, é genial.

Fabiano Vale
Enviado por Fabiano Vale em 15/08/2005
Código do texto: T42778