Crise dos vinte e sete

Aos vinte e sete enxergamos, que passamos tempo demais da vida

fazendo pouco

Sentimos que o pouco que fizemos, era o melhor que dava pra fazer e nem sempre o suficiente

Batemos na nova porta, dessa vez, sem esperar que alguém abra e vamos logo entrando

Nos sentimos gente grande, adultos o bastante, pra brincar de ser criança ou deixar viver uma nostalgia da infância

Na crise dos vinte e sete, tudo parece transitoriamente eterno e certamente, eternamente duvidoso

A dúvida não é sobre o certo ou errado, nem por que ou pra quê

A existência, ou luta, sobrevivência, ou latência

A ausência de problemas e de soluções

É o fazer e o desfazer

E mudar de planos de repente

Aceitar que algumas coisas são, simplesmente são

É não precisar

É não esperar

nem caminhão, nem mudança, nem ônibus

É des-importar a importância

É consagrar a lembrança

e viver com pouca glória

Saltar escondido, pisando apenas nas linhas pretas da calçada

e mesmo se a meia estiver furada, não se constranger

É sorrir por chegar até aqui e agradecer se amanhã for o dia de ir

De levantar a bandeira de missão cumprida, sem ter feito nada na vida

ou ter feito demais e não lembrar o que exatamente se conquista

É saber que certo e errado não fazem diferença

que conduta ou partido não importam

Se sentir frio ou calor é melhor

Se sentir é melhor

É o começar de novo, pois o ano novo chegou

É ter a certeza que merece

Acordar

Fazer ou não uma prece

Reclamar, menos ou mais

Não pedir nada

É levantar de madrugada pro vento gelado bater na cara

e ver que não precisa dele pra se sentir vivo

Que o coração, vinte e sete anos, consecutivamente, bate, salta e aperta

entre outras coisas que ele aprendeu a fazer nesse tempo.

É o cansaço permanente e o descanso eterno conflitando

não é vontade de morrer

é um questionamento realista

não é descontente

é um novo ponto de vista

que se for pra vencer, seja lá o que isso significa

que seja pra andar de cabeça erguida

por mérito ou derrota

não importa, quando fecha a porta

os verdadeiros ficam

se as verdades forem sólidas e resistirem ao calor das emoções

se as velas não se apagarem

ao passar das estações

deparar com os dias, até os 28

quando uma nova crise vier me encontrar

crises nem sempre são ruins

o que é o ruim, aos 27?

e de todas as coisas que você já passou, o que restou é aquilo que te fortalece

e seu medo de hoje, não será o do ano que vem

e o medo passa a ser normal

e um novo temor virá, e esse, também passará

quando amanhecer, será 30, 40, 50

e assim, seus dias viverá

em crises de diretrizes

e formas de navegar.