Ensaios com Montaigne - E se você renascesse?

“O remédio do homem vulgar consiste em não pensar na morte”. (MONTAIGNE, ENSAIOS, De como filosofar é aprender é morrer)

Ouçam os sábios: somente o fim da nossa existência pode nos dizer o quanto ela valeu. Eu bem o sei. Não, eu não estou morto, se você pensou isso, mas já tomei café da manhã com a morte, e graças a Deus, ela não me obrigou a tomar cicuta, pois, diferentemente de Sócrates, eu não estava preparado para morrer. O que senti, ao ver diante de mim se abrir a porta do nada, do desconhecido, um abismo que para mim, se caísse não teria volta? “O infinito temor dum único perigo torna inexistentes todos os outros”. E eis que eu me vi nu, sem máscaras, desculpas, fantasias e perucas. Nesse instante, descobri que uma das verdades mais nuas e cruas é a de que “a esperança é a última que morre”. E, tendo somente ela em mãos, entreguei-a a Deus através de uma fé que eu não conhecia e jamais achei que um dia iria ter: “a fé começa precisamente onde a razão acaba”. Mas, como poderia alguém, com sua casa e seus sonhos desmoronados, enxergar algum futuro? "A vida só pode ser compreendida olhando-se para trás; mas só pode ser vivida olhando-se para a frente”. E, ao ver-me, sob os olhos de Deus, soterrado por tudo o que havia destruído com minhas próprias mãos, lembrei-me que minha mãe havia me dito que “a fé remove montanhas”. E Deus, como um relâmpago, disse, com um abraço misericordioso, que eu poderia voltar à vida, e reconstruí-la: “Lázaro levanta-te e anda”.