Ensaios com Montaigne - Existem limites imaginários?

“Sou desses sobre os quais a imaginação tem grande domínio. Todos são atingidos por ela, mas alguns há que ela derruba.” (MONTAIGNE, ENSAIOS, A força da imaginação)

Se quero transpor meus limites, devo, em primeiro lugar, conhecê-los. Posso conhecer limites falsos, pois não sei até onde posso chegar. Se, a cada dia, tenho uma experiência diferente, logo, o limite se apresentará para mim com uma face irreconhecível; mas, se minha rotina não muda é provável que eu repare até onde estou indo.

Não posso esquecer que quando estou falando de limites escuto a voz do corpo e da alma. Quem é mais forte? Quem pode dizer como subir mais alto? O espírito está no leme, no momento, isso eu já sei. Pois, há pouco, pude verificar em um curto espaço de tempo o quanto posso mudar o peso do meu cansaço de acordo com uma força oposta que lhe dirijo:

1) Deitado no sofá, lendo: nocaute – como já aconteceu várias vezes. 2) Resolvi caminhar, lendo: fiquei pronto para o segundo round e lá se foi o cansaço; rodei, rodei, rodei, li, li, li, e depois de mais ou menos uma hora, o cansaço começou a me dar porradas e comecei a cair.

3) Após esse acontecimento, pensando e decidindo que seria o último round, decidi exercitar a mente e a mão, escrevendo com a caneta: no começo meu corpo tentou me enganar me dizendo que eu não iria aguentar, e em questão de segundos reagi, e ressuscitei com mais força, pronto para novo round.

Fico, agora, aqui, em dúvida: viria esta força de mim ou do mundo? Não sei. Só sei que para chegar no nível de um Nietzsche e um Montaigne, terei que ter em mente, diariamente, que somente através de uma vontade forte de potência iriei combater as razões que me levam a enxergar e sentir limites ilusórios.

Após o terceiro round, se não me engano - não estou com forças suficientes para voltar atrás e contar agora –, percebo que, como dizia Jung, existe uma verdade dentro de nós. Se pego como referência um olhar espiritual chegarei a provisória conclusão de que a minha essência carrega a sua origem e o seu saber – que talvez seja milenar, secular, e por aí vai descendo. Mas como meus olhos estão obscurecidos para os tempos mais remotos, assim como quando tento me lembrar da minha infância, ou quando viajo e vejo a minha casa diminuindo no espaço até sumir, preciso, através do pensamento levar o meu corpo a se aproximar do que não posso ver se continuo me distanciando do que sei, criando diálogos.

Um exemplo simples para explicar esta situação seria o seguinte: se minha vontade está condicionada apenas para ler, logo, tanto meu pensamento adormecerá como também se manterão sonhando minhas memórias e saberes que estão aparentemente submersos e apagados. Estes, só poderão acordar se minha vontade mostrar a eles que precisa deles, e, assim, estabelecer relações.

Como disse um professor, certo dia, o conhecimento, em humanidades, só pode surgir através de relações. Eis o que extraí da minha prazerosa e cansativa digressão: há tempos não sentia um sono verdadeiro, daqueles que sufocam os olhos, pois há tempo não gasto energias usando todos os meus músculos, assim como o pensador de Rodin. “Da escola de guerra da vida: aquilo que não me mata me fortalece”.