Ensaios com Montaigne - Como educamos? Em: A contribuição das religiões

“Minhas concepções e meus pensamentos só avançam às apalpadelas; cambaleantes, a escorregar entre tropeços; e por mais longe que vá, não fico satisfeito; vejo terras ainda além mas turvas e enevoadas e não as posso distinguir." (Montaigne, Ensaios, Da educação das crianças)

Alain Boton, no fronteiras do pensamento, disse que nossa sociedade secular, avessa à religião -, ou indiferente, assim como o sacerdote que não quis se aproximar aquele pobre homem que desfalecia no chão, deveria abrir os olhos e ouvidos às lições das religiões, não somente para ver o que ensinam mas para ouvir o que não estão habituados a ouvir. Saber ouvir é a porta de entrada para todo o conhecimento; a sabedoria, só podemos alcançar, se ousamos transpor os nossos limites para experimentar estadias no cultivo do saber vivido. Tendo a consciência de que o ser humano, independentemente de sua idade é um eterna criança de memória fraca e indisciplinada, segundo Alain de boton, nos pegam pelas mãos para nos ensinar, tem a paciência materna de repetir diariamente o que devemos aprender, e de nos incentivar o tempo todo a fazer as lições de casa. Não atoa, Santo Agostinho falou que a paciência é um recurso indispensável para quem deseja se tornar um filósofo.

Se, como Nietzsche asseverou, a pressa é uma das características mais presentes no homem moderno ou no último homem, não é difícil de verificarmos por que nossos contemporâneos são tão ávidos por novidades, prazeres efêmeros, felicidades e conhecimentos de um dia, de um clique, e por qual razão, dentre tantas que podemos imaginar, a educação anda tão em baixa, desvalorizada, abandonada, e sem sentido. Para observarmos isso, basta passarmos um dia em uma faculdade, e percebermos o quanto os alunos estão entediados, sonolentos, tristes e sem vigor, como essa história muda quado estão nos barzinhos e nas baladinhas, e o quanto não esperam a hora para pegar o diploma, para arrumar um trabalho, para poderem sustentar a jornada alcoólica.

Vi, hoje, em uma entrevista do Fernando Gabeira com um monge budista, um exemplo de sabedoria, de serenidade em suas palavras a respeito do por que, segundo o monge, o nível de conversões ao budismo feitas pelos budistas era tão baixo: “não cabe a nós forçar ninguém a adotar a nossa crença, mas contribuirmos para o crescimento humano, da vida, independentemente de qual caminho desejem seguir”, esclareceu o monge, mais ou menos com essa palavras, de acordo com o que assimilei, acrescentando que o crescimento da intolerância religiosa que vemos atualmente pode ser um sinal de ignorância acerca da essência e fundamentos das religiões, e penso também, por conta de um egoísmo impaciente com as crianças arteiras, tal como o de um professor, que se preocupa mais em ser ouvido e entendido para que não fale sozinho e seja reconhecido pelo seu poder e seu saber, do que com o aprendizado e escolhas de seus alunos.

"A nós, filósofos, não nos é dado distinguir entre corpo e alma, como faz o povo… Não somos batráquios pensantes, não somos aparelhos de objetivar e registrar, de entranhas congeladas - temos de continuamente parir nossos pensamentos em meio a nossa dor, dando-lhes maternalmente todo o sangue, coração, fogo, prazer, paixão, tormento, consciência, destino e fatalidade que há em nós. Viver - isto significa, para nós, transformar continuamente em luz e flama tudo o que somos, e também tudo o que nos atinge; não podemos agir de outro modo… O fascínio de tudo o que é problemático, a alegria com o X, é muito grande para que essa alegria não torne sempre a assomar, num claro ardor, acima de toda a aflição do que é problemático, de todo perigo da incerteza…": Assim falava Nietzsche, este, que apesar de ter desistido da faculdade de teologia e de ser pastor, para se tornar um crítico das religiões, principalmente do cristianismo, por considerar que ela matava a vida e o pensamento, foi um grande estudioso das religiões, e talvez por isso, encontremos em sua filosofia um filósofo pastor, que aprendeu bem com as religiões como educar, pregando sermões aqui e acolá, animado por um espírito religioso, sem um Deus ligado a alguma crença, mas a um Deus sem nome presente na natureza e na sua elevação.

"Creio porque é absurdo", talvez, seja também um absurdo não crer o que escapa à uma razão; talvez, seja também um absurdo a crença do ateu, em acreditar em Deus somente se ele der uma entrevista para algum repórter do Jornal Nacional; talvez, seja também um absurdo também acreditar que as plantas, um nutricionista, uma academia, um budismo e um sexo light, a luz do sol, a ciência, um partido político ou uma seita política, tragam uma felicidade plena, salvem o corpo e a alma, e acabem com a condição do "homem suficiente". Por isso, Luiz Felipe Pondé, grande estudioso das religiões, ironiza dizendo que não é preciso ser inteligente para ser ateu e nem de muito esforço, e que deixou de ser ateu quando tinho 8 anos: "Não há problema em não acreditar em Deus; o problema é que quem deixa de acreditar em Deus começa a acreditar em qualquer outra bobagem, seja na história, na ciência ou em si mesmo, que é a coisa mais brega de todas. Só alguém muito alienado pode acreditar em si mesmo".

"Você deve amar", escutamos no belíssimo filme "Amor pleno". Ame o seu próximo com a si mesmo, escutamos Jesus repetir tantas vezes ao longo de sua existência. Não estaria aqui a prova mais difícil de o homem passar? Não seria pela falta de paciência e preguiça que o homem prefere não fazer essa prova, e muito menos as sua lições, para continuar não conforto do seu berço, o egoísmo? Mas isso já me leva para outro ensaio, que publicarei em breve.

Para encerrar o meu devaneio de pedante, e não fazer mais nenhuma citação - apenas hoje -, convido-vos a ler o divertido ensaio do colunista ta Folha João Pereira Coutinho, publicado hoje, intitulado "Apenas Natal": http://www1.folha.uol.com.br/colunas/joaopereiracoutinho/2013/12/1389434-apenas-natal.shtml.

Feliz Natal!

Fontes:

Ensaios, Montaigne

A Gaia Ciência, Nietzsche

Assim falava Zaratustra, Nietzsche

Fronteiras do pensamento, As importantes lições da religião, principalmente para ateus, Alain de Botton: parte 1: http://www.youtube.com/watch?v=DqrYLu8IsE0

parte 2: http://www.youtube.com/watch?v=qgNCpp_HhCo