Começo

Todo começo está condicionado a um fim. Eis a máxima que estamos cientes diante de fatos, mas que ainda tentamos resistir através de atos. Basta observar um formigueiro. A forma como as formigas constroem aquela complexidade, juntando um esquadrão para realizar a empreitada. Tudo tão bem organizado. Logo novas formigas estarão dali surgindo, sua capacidade de produção também é impressionante. Basta uma pisada nossa, uma chuva, dependendo da forma como é feito e tudo está diluído. O ato nosso de destruir mostra uma força que está além do gesto que provocamos. Assim como arrasamos aquele formigueiro, um dia nossas construções também serão arrasadas, junto conosco. Parece óbvio imaginar isso, mas pela simplicidade, muitas vezes ignoramos ou desejamos ignorar.

Achamos normal quando uma máquina agrícola passa por cima de diversas construções de formigas ou cupins. Mas e quando uma tempestade, um furacão, um tsunami, varrem uma cidade. Quem sabe um terremoto que move algum pedaço de terra que antes imaginávamos tão seguro. A vida é de uma fragilidade impressionante. Viver é a arte de evitar a catástrofe que é inerente ao que está vivo. Surgimos e extinguimos, como tantas outras coisas ao nosso redor. Mas é curioso pensar que não somos extintos na composição básica, já que retornamos em uma espécie de reciclagem do mundo, quiçá do universo. Amanhã eu deixarei de ser uma pessoa, com as características que esta identidade construída me proporcionaram. Farei parte, talvez, da composição de um formigueiro. A magia está em todas as possibilidades que surgem quando refletimos a respeito do que existe, ou seja, daquilo que conseguimos perceber.

Só se nasce com intuito de morrer. Provavelmente, sem a morte, esse planeta e tantas outras criações, teriam deixado de existir. Esse reciclar que permite a alternância e uma constante transformação, que é a força do movimento. Durante a vida, aprendemos sobre a mudança. Os anos vão passando e mudamos radicalmente. Imagine o que milênios fariam conosco. Ao contrário dos vampiros e outros seres místicos, a eternidade seria algo devastador, pois se tornaria insuportável, pelo simples fato de não ser algo necessário. A mudança que alimenta a existência e precisa que algo venha a sucumbir e com isso alimente esse motor que devora novidades. A saudade é grande quando uma pessoa que amamos deixa de existir, mas devemos pensar que sua composição estará presente, de uma forma ou de outra. Aquela ancestralidade que vemos em culturas como a africana, demonstram essa importância da conexão com o que chamamos natureza.

Cada coisa possui seu prazo. Alguns são mais longos e outros mais estreitos. Dizemos que a vida é curta, mas se compararmos com a de outras espécies, vivemos como deuses para eles, já que evaporam em cerca de vinte e quatro horas ou menos. A relatividade temporal também influencia. Creio que muitas vezes, estar em outra temporalidade pode fazer com que algo dure mais tempo, já que seu tempo de existência será mais lento. Entretanto, um segundo já vale por cada uma das existências, pelo ciclo de conexões incontáveis, gerando fenômenos que jamais poderíamos sequer deduzir. Não somos responsáveis pelos nossos atos, já que eles são gerados a partir de elementos que desconhecemos. Bem como aquilo que geramos, que provocará reações jamais concebidas. A novidade precisa utilizar a antiguidade para sobreviver. O filho é o declínio dos pais, já que o ciclo reprodutivo necessita dessa mudança. Claro que hoje em dia a ciência ode até tentar interferir nisso, como o caso de uma inseminação artificial ou uma maior longevidade. Mas isso não impede as substituições. A matéria que aí está, que compõe tanto eu quanto você é a mesma do início dos tempos, não se importa a teoria que tenha adotado como explicação para esse chamado começo. Um fim é a busca por um novo começo, uma dialética da sobrevivência.

Bruno Azevedo
Enviado por Bruno Azevedo em 28/12/2013
Código do texto: T4628040
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