Arte

Tratar de arte, pode envolver elementos que nos fariam se distanciar de sua conceituação. Talvez seja esse o objetivo. A arte aqui tratada se trata de algo próprio da natureza humana. Estaria nisso contida a capacidade de criar algo de forma inigualável. Levando em consideração a não repetição dos atos, mesmo outros seres do que chamamos natureza, poderiam também desenvolver, já que criam novidades. Um pássaro que cria seu ninho, por mais sistemático que seja, possui formas únicas de fazer tal coisa. Isso só não basta para dizermos que é arte. Inicialmente devemos nos ater ao fato de que a própria palavra arte já foi uma criação humana, mesmo que outro ser a fizesse, ainda não apreenderia esse conceito conforme nós o utilizamos. Outro fator interessante é tocar outras pessoas. Quando um anima produz algo, isso também afeta membros da mesma espécie e de outras, haja visto que nós mesmo estudamos seu comportamento e procuramos analisar os hábitos das espécies.

Até aqui, definimos arte como não sendo apenas uma coisa feita de forma singular e nem que consiga afetar outros a partir de sua construção. Mais um elemento a ser apresentado é o fator tempo. Arte é associada como algo que transcende o tempo. Mas um ninho que fica, bem como outras formas criadas por outras espécies, podem se manter cristalizados por milênios. O que faz com que descobertas arqueológicas importantes sejam feitas. Existe a associação da empatia, ou seja, quem produz arte, faz algo que apenas outro da mesma espécie, quer dizer, entre os homens, é capaz de indagar a respeito. Mas se um pássaro, voltando ao exemplo anterior, cria seu ninho singular que transcende o tempo e tudo mais, também pode fazer com que, membros da mesma espécie reconheçam ali uma identidade. Ainda que fabrique o seu próprio e que isso seja associado algo instintivo, ocorre essa relação de reconhecimento e isso é possível de ser percebido, por nós diante da análise comportamental de certos grupos estudados.

Chegamos finalmente ao fator incomum perante os que foram apresentados até agora. A arte é algo que consegue não apenas fornecer tudo o que já foi mencionado anteriormente e ainda transformar aquele que entra em contato com esse tipo de criação. Uma pessoa diante de uma obra de arte sente alguma alteração, ainda que não se dê conta de explicar o que seja, mas consegue perceber uma mudança causada pelo impacto daquela força estética diante de si. O nosso pássaro, exaustivamente explorado aqui, por mais que esteja diante de uma construção comum aos membros de sua espécie, jamais terá uma transformação sentimental que o tornará diferente em relação a suas impressões. Continuará em sua labuta cotidiana com intuito de obter as conquistas necessárias para a preservação de sua espécie. Eis aqui o ponto alto daquilo que se apresenta como uma apresentação acerca da arte.

O artista seria aquele sujeito, capaz, antes de tudo, de sentir. Entregar-se ao sentimento e conseguir com isso tocar outros sentimentais. É um jogo, uma troca que um precisa estar apto a receber o outro. A arte precisa desse feedback. Por mais que exista algo misantrópico na produção de alguém, isso se manifesta além de sua própria forma, se alastrando nas imaginações alheias. Ainda que mantivesse presa a sua criação, sofreria com o olhar sobre o criado, que o consumiria a cada contato. O público precisa estar aberto a essa experiência para o afeto, inesperado ocorra e surpreenda. É algo arrebatador, que tira as pessoas do estado que se encontram, como uma armadilha de fuga, onde projeta e lança subjetividades conforme as diversas sensibilidades suscetíveis a sua força de atração. Transformar algo em arte é dar à matéria esse estágio que, apesar de usufruir totalmente da materialidade, alcança estágios transcendentes. Já que fornece possibilidades, que são uma esfera pertencente ao que é futuro. Por isso é tão perigosa e em muitas lendas religiosas são associadas a um aprendizado que deuses trouxeram aos seres humanos para fazerem deles seres privilegiados e ao mesmo tempo letais, afrontando inclusive seus próprios criadores.

A arte traz a perspectiva de mudança. Regimes ditatoriais procuraram absorvê-la, com intuito não apenas de impedir a mudança, mas de fazer com que o movimento ocorre-se sempre de retorno a eles. Um artista criado com uma mentalidade de regime ditatorial, colocará suas emoções na criação e irá também fazer eclodir valores que elevem ainda mais o poder dos governantes. Dessa forma, podemos também considerar a arte como algo devastador. Uma arma que pode ser empregada conforme interesses diversos. Especificar tipos de arte, utilizando técnicas que promovam escolas, apenas faz com que o processo de criação puro, seja destruído e trocado por um tecnicismo. Costumo utilizar o exemplo, que um Bach, um Beethoven, enfim, um grande gênio da arte, continuaria sendo o que são, ainda que não tivessem contato com uma escola de Belas Artes ou algo do tipo, enquanto um aluno, com os melhores professores e conectado com técnicas avançadas, não conseguiria chegar no patamar dos aqui citados. Arte não é uma coisa que se aprende.

Muitos técnicos tentam moldar a mente das pessoas para que possam estar aptas a se sensibilizar diante de uma obra de arte. Uma tolice. A arte que precisa de uma doutrinação para que seja percebida, acaba se tornando algo bem distante do primordial artístico, se tornando mais um tradicionalismo que ainda tenta se preservar, apesar de sua já constatada decadência. Um povo precisa se reinventar, os artistas nascem e se desdobram para isso, fornecendo algo excepcional e que fará com que o movimento continue. Mas os artistas de hoje, estarão fadados a destruição amanhã. O novo sempre surge com a promessa de suprimir o velho. Não que o passado seja desprezível, mas existe um processo de transformação que irá inevitavelmente esmagar antigas estruturas ao fortalecer a base das novas. Podemos comparar com uma reciclagem, aproveitando elementos para sustentar novos valores. Alguns são tão importantes, que seu desgaste é menor e consegue uma permanência maior, como uma herança, o que faz com que o desligamento deles seja muito doloroso. Tolher a arte é uma forma de resistir à mudança.

As regras são utilizadas pelo artista, pela influência do meio, os aparatos que tem disponíveis, a forma como foi educado e se manifesta socialmente. Tudo isso é retratado em uma obra de arte. Alguns acreditam em algo místico na arte, que pode inclusive fazer do artista um sujeito que possui um dom. Mas esse criador também está passivo perante a força dos acontecimentos que irão oprimi-lo e muitas vezes fazer com que a arte seja a forma de extravasar, fazendo com que os outros sejam tocados por aquela fúria ou amor diante de uma revolução, por exemplo. Outras espécies também conseguem ter sentimentos, mas como fazer com que eles se manifestem através de algo criado, a ponto de emocionar outros que não estariam em hipótese, ligados ao sentimento do criador. Existe uma conexão que a arte promove e promove um encontro naquilo que foi produzido, como se não pertencesse a ninguém por justamente pertencer a todos. O verdadeiro espaço público está na manifestação artística, que possibilita esse ir e vir de impressões, favorecendo uma conjunção. Porque a arte barroca, por exemplo, ligou tanto os fiéis a sua fé, por produzirem esse sentimento comum, um encontro, uma comunhão.

Existe também uma mensagem que a arte transmite. Muitas vezes ela não condiz com a realidade social de alguns grupos, fazendo com que aconteça um distanciamento. Mas existem também produções artísticas que são de teor universal, fazendo com que, mesmo barreiras como o idioma, não possam obscurecer a comunicação entre grupos distintos. A abstração e o ócio estão ligados a essa produção, o que não significa que seja algo de pouca monta. Existe o ócio produtivo em que trabalhasse em criações de extrema valia, ao contrário de sujeitos parasitas. O artista não apenas tem uma função na sociedade como tenho a ousadia de afirmar que todo sujeito possui uma função artística. Em um dia pode conseguir uma expressão facial, sem nunca ter praticado teatro, ou qualquer outra forma de expressão corporal, que pode muito bem tocar o sentimento de milhares de pessoas. Poderá produzir uma bela canção através do aparato mecânico de uma oficina. Quem sabe um filme ao gravar momentos importantes de sua vida. Se a arte é comum ao ser humano como receptor da influência artística, isso correr por termos essa condição de artista. Se apaixonem e promovam uma bela exposição, pois o mundo é nossa atmosfera de criação.

Bruno Azevedo
Enviado por Bruno Azevedo em 14/01/2014
Código do texto: T4649562
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