MAS AFINAL, EXISTIMOS?

Que atire a primeira pedra quem nunca se sentiu assim.

Penso que poucas são as vezes na vida, nas quais assumimos nossa verdadeira identidade.

Vivemos papéis e mais papéis que nos desobrigam de sermos nós, ou pior ainda, que nos obrigam a não ser.

“Penso logo existo?”-Mentira!

Eu que penso tanto, luto para existir...

Somos na verdade, personagens dum grande palco de ficções, cuja maior obrigação é aumentar a platéia e os aplausos que dela emanam.

Somos a máscara da nossa consciência, moldada a mercê dos interesses de muitos, aonde o nosso próprio interesse é o que menos conta.

Somos o sorriso na tristeza, somos a lágrima na alegria, somos a ansiedade na calmaria, somos a calma aparente da nossa rebelião interna, que explode muda e resignada a queimar sem fazer barulho, sequer somos as fagulhas póstumas do que fulgurou sem existir...

Desde que nascemos somos um barro humano moldado a nãos!

Somos um pequeno barco sem bandeira, largado à sorte dum bravo oceano.

Somos marionetes dum mistério temido, seres obedientes, doutrinados, educados...somos o cúmulo impossível do quê nos obrigam a ser!

Somos o desejo pungente sufocado pelas forças alheias à nossa vontade e à nossa existência...

Somos cidadãos politicamente corretos, somos o "chefe de família", “a mãe canonizada”, somos a eterna responsabilidade, somos as contas a pagar, somos o “contribuinte compulsório” que na verdade sequer sabe para o quê contribui, e é prudente que não saibamos mesmo...talvez não suportássemos encarar a realidade de sequer contribuir conosco...ou pior ainda, de contribuirmos com nossa própria inexistência...

Somos a necessidade premente, somos o amor sempre urgente...somos a expectativa impotente...

Somos a voz sempre muda, somos a poesia que transmuta, somos a emoção que labuta...

Afinal, somos tanta mentira...tão obrigados a não ser...que perdi o jeito...

Toco meu corpo, e me procuro. Penso que me perdi de mim.

E bem longinquamente...minha voz me pede socorro, e grita pela liberdade de poder ser...

Então, heroicamente abro o meu coração, saio para o mundo e enfim,me apresento a mim...

Eis meu primeiro ato de existir!