A arquitetura de Louis Khan (Até um tijolo deseja ser alguém)

~A arquitetura de Louis Khan (Até um tijolo deseja ser alguém)

"Proposta Indecente" é um filme de 1993 que conta a história de um casal que se ama mas vive uma grande crise financeira, quando recebem uma proposta de um milionário excêntrico, que quer provar que o dinheiro compra tudo.

Assim, se a bela esposa aceitar ir para a cama com ele, por uma noite, o casal ganhará 1 milhão de dólares.

Acordo que depois trará angústias terríveis para o marido: arquiteto que que viverá forte drama de consciência, enquanto perde de vez a esposa para o milionário (Robert Redford) .

Eis que quando tudo já parecia perdido o marido de Demi Moore tem um insight ao meditar numa máxima do grande arquiteto Louis Khan: "Até o Tijolo quer ser alguém!".

Frase que antecede uma pergunta "Pergunte ao tijolo o que ele quer ser (uma piramide, uma catedral)? ", que está em um texto chamado "o concreto e o tijolo" e que pode ser conferida no You Tube: "Louis I. Kahn talks to a brick":

" Expressar é dirigir. Quando você quer dar PRESENÇA à alguma coisa, você precisa consultar a sua natureza. E é aí que entra o "design". Se você pensa na presença de um tijolo, você diz: - O que você quer, tijolo? E o tijolo responde:- Eu gosto de arcos. E se você diz ao tijolo

- Olha, arcos são caros e eu poderia usar uma verga de concreto sobre você. O que acha disso, tijolo? O tijolo diz: - Eu gosto de arcos. Por isso é importante que você honre e dignifique o material que você usa! Você não ignora o material como que dizendo, "Bem, nós temos um monte de materiais, podemos fazer isso de uma maneira ou outra." Não é verdade. Você deve honrar e glorificar o tijolo ao invés de trapaceá-lo e dar a ele uma função inferior, na qual ele perde seu caráter, por exemplo, quando você o usa como um tapa-buracos. Você pode ter a mesma conversa com concreto, papel-machê, plástico ou mármore, ou qualquer outro material. A beleza do que você cria vem de como você honra o material pelo que ele realmente é. Nunca use-o de forma subsidiária, fazendo o material esperar para a próxima pessoa que passe e honre seu caráter."

A fábula do tijolo que acaba sendo o ponto crucial do filme "Proposta Indecente", pois o marido de Demi Moore assim reencontra o norte do seu sentimento amoroso pela esposa, depois de cometer um tremendo erro que lhe custará o fim do casamento.

Kahn - acreditava que cada material tinha seu destino e não tolerava o desvio dele - quando aí se tem um fundamento filosófico para pensar no caráter sagrado do casamento, e das coisas imateriais que cuidam de estruturá-lo.

Portanto o filme não usa de puro moralismo mas de uma questão filosófica e artística.

David que depois de perder a esposa, e moralmente ir ao fundo do poço, sai como uma espécie de iluminação ao refletir sobre o ensinamento de Khan. Quando começa a dar aula de arquitetura.

Neste momento ele mostra um tijolo e pergunta para a classe: vocês podem me dizer o que estão vendo? Um deles responde: um tijolo. E o que mais? Uma arma, responde outro estudante que consegue risadas do restante da turma.

Nesse momento o professor diz que Louis Khan ensina que até os tijolos querem ser alguma coisa. Ao mesmo tempo projeta imagens das pirâmides do Egito, colunas gregas do Panteão, catedrais góticas, e continua com o pensamento de Khan: " Aspirações; até os tijolos tem aspirações, eles querem crescer (entra o slide do Empire States)".

A classe que até a pouco ria do tijolo poder ser uma arma agora esta emocionada. O professor continua: "mesmo um tijolo comum quer ser algo mais do que o que é! Ele quer ser algo melhor! E é isto o que nós precisamos, é isso que devemos sentir: -devemos aprender a ouvir o tijolo". A aula acaba e no final dela entra um yuppie, que perdeu toda a explicação.

( a proposta decente de Khan )

Ao longo deste filme, parece que o dinheiro é o único regulador da existência humana; quando se tem a impressão de que a dignidade humana pode ter um preço.

Mas no final o arquiteto encontra nos sentimentos, e na sua paixão pela esposa, a verdade e a sua dignidade. Não à toa Louis Khan está por trás daquela citação do tijolo, pois ele defendia a autonomia do seu trabalho, e a integridade de seu ser, sem estar atrelado a qualquer compromisso que pudesse mudar sua intenção.

Khan, que nas negociações com seus clientes instaurava um relatório de "afinidade eletiva", e por isso não contemporizava quando se tratava de um projeto que era inútil continuar.

A perda econômica de um projeto, que não foi bem sucedido, lhe doía mas ele não se culpava. Em um de seus escritos, ele disse: "Eu tenho pavor das pessoas que vêem as coisas do ponto de vista do dinheiro."

Em razão disso não se rendia à funcionalidade da forma arquitetônica.

Por isso ele invertia os termos do projeto declarando explicitamente: "A forma precede a funcionalidade". Um exemplo que ele gostava de citar durante suas palestras eram as Termas de Caracalla, em Roma:

"Neste edifício havia o desejo de construir uma grande estrutura abobadada de cem pés. Oito pés seria suficiente." Enfatizando assim a diferença entre necessidade e desejo que faz com que um edifício se torne arquitetura.

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Louis Kahn, geralmente, começava suas palestras dizendo: "Eu amo o começo. Os primórdios enchem-me de espanto. Eu acredito que este é o início para garantir a continuação ". Seu método de trabalho foi dedicado à busca das origens de tudo.

Se você tivesse que criar uma escola não começaria a partir do orçamento disponível para ajustar as superfícies a construir. Antes você teria que pensar no espírito da escola, na essência do que ela representa.

Dizia ele que mesmo com o custo de recordar a primeira vez que um espaço teve essa função: quando um homem, sem saber que é um professor, fala sob uma árvore a muitas pessoas dispostas a ouvi-lo, sem saber que eram alunos.

"A escola, antes de tudo, deve ser um lugar onde é bom para aprender e ensinar; é uma instituição humana. Assim como o arquiteto se distingue de um simples designer".

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Louis Khan

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Louis Kahn foi um arquiteto que incorporou na sua concepção arquitetônica diferentes influências, como as do romantismo: na importância que dá ao sentimento e à expressão individual, ou a escuta para o aspecto irracional.

Um dos seus conceitos o “Volume Zero” faz referência a um capítulo de um livro, que viria antes do primeiro capítulo, e que nunca foi escrito, e nunca foi lido; ou seja: o que ainda não foi dito e nem feito, e onde estaria a essência da existência.

Ou como disse Khan:

“A arquitetura se cria em um ponto que se situa entre o silêncio do ideal e a iluminação do real, ou seja, onde se encontrariam o silêncio e a luz, representando respectivamente o desejo de ser e presença: 'o Silêncio contém nossos desejos: o desejo de aprender, de nos reunirmos e alcançar um estado de bem-estar; ou seja, todos aqueles atributos que definem nossa humanidade. A Luz se relaciona com a representação tangível do mundo das ideias. A transformação do Silêncio em Luz se realiza através do Design, que existe entre ambos, no âmbito das sombras"

Nascido na Estônia, Khan foi um dos mais importantes arquitetos do século XX, da estatura de Le Corbusier; considerado filósofo quando tenta verbalizar os significados e essências da arquitetura:

(...)

" A sala é o começo da arquitetura. É o lugar da mente... O plano é uma

sociedade de salas. As salas se relacionam entre si para fortalecer sua

natureza própria e única... A sociedade de salas é um lugar bom para

aprender, bom para trabalhar, bom para viver. "

"A cidade é medida pelo caráter de suas instituições. A rua é uma das

suas primeiras instituições. Hoje, essas instituições estão em

julgamento. Eu acredito que é assim porque elas perderam a inspiração de seu início. "

Conforme a classificação de Kahn sobre os desejos do homem, o desejo de reunir-se estava relacionado à cidade, pois a considerava como símbolo de encontro. Nesse sentido, suas analogias continham

atenção especial à rua como elemento estruturante desse símbolo "uma sala de reuniões sem teto".

Sobre suas ideias - baseadas na importância dada aos começos - Kahn fez um texto chamado I Love the beggnings (Amo os inícios). Nele referia-se à busca da essência das coisas, o que foi uma constante em seu trabalho:

" É bom para a mente voltar ao começo, porque o começo de qualquer atividade estabelecida do homem é o seu melhor momento. Porque é ali que habitam todo o espírito e toda a sua engenhosidade, dos quais devemos constantemente extrair nossas inspirações para as necessidades presentes"

Outras referências filosóficas foram apontadas em suas ideias, como as

teorias neoplatônicas, cujo conhecimento Kahn adquiriu através de sua educação familiar, assim como o acesso que teve a escritos de Goethe e Schiller. Havendo ainda um paralelismo entre suas ideias e as de Martin Heidegger: construir, habitar e pensar, são como fatos da existência do homem, resultando daí a teoria das instituições, principalmente sobre o desejo de ser dos edifícios.

Cine Astor
Enviado por Cine Astor em 05/06/2014
Reeditado em 12/08/2020
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