Considerações sobre a fala e a escrita tomadas como exercícios mentais

Assim como os exercícios físicos fortalecem o corpo, é provável existirem exercícios mentais capazes de fortalecer a mente. Creio que o simples ato da fala tenha um bom efeito estimulante sobre o cérebro, talvez equivalente ao de uma caminhada para o corpo. Nesse mesmo espírito, podemos comparar a escrita a uma corrida.

De fato, não deveria haver uma diferença tão marcada entre a fala e a escrita, embora uma exija a agregação de uma ação vocal para embalagem das ideias e a outra a incorporação de uma composição textual gráfica da qual, normalmente, exigimos muito mais precisão. Talvez esteja meramente na exigência do interlocutor a principal diferença de intensidade no exercício da fala e da escrita, dado esperarmos muito mais coerência e correção em textos escritos que em falas.

De qualquer forma, ao escrevermos, nossas preocupações gramaticais, assim como a necessidade da clara organização das ideias acaba por tornar o exercício literário mais intenso que a comunicação oral.

Acredito também que nossa consciência se manifeste de uma maneira mais complexa do que o aceito normalmente; penso que o que chamamos "consciência" corresponda, grosso modo, a um conjunto de fluxos de pensamento paralelos e relativamente coordenados. Sendo assim, uma maneira de exercitarmos a consciência corresponderia à construção de longos períodos gramaticais; tal exercício tenderia a alongar os fluxos de consciência.

Sob esse aspecto, frases curtas corresponderiam a piques curtos, períodos longos seriam análogos a corridas mais extensas. Não temerei o absurdo de comparar uma frase curta a um pique de 10 m, a analogia serviria apenas como ilustração. Nesse caso construções mais longas seriam comparáveis a tiros de 30, talvez 50m ou, eventualmente uns 100, podendo chegar talvez a uns 200 m, quem sabe! Pareceria não haver limite para o tamanho da construção de períodos linguísticos, no entanto, tanto o formulador do texto, quanto o leitor, deverão ter "gás" suficiente para percorrer toda a extensão do período em uma única jornada, sem pausa para "tomar fôlego".

Períodos excessivamente longos tendem a incomodar, são tão árduos, penso, quanto as longas travessias a nado. O treinamento contínuo possibilita ao nadador percorrer longas distâncias sem a necessidade de paradas para tomar fôlego, o equivalente às interrupções nos fluxos de consciência.

Tais analogias sugerem que a leitura, e mais efetivamente a escrita, de longos períodos estruturados tenda a exercitar a mente, a torná-la mais forte e ágil, enquanto a exigência de coerência nos textos escritos compele ainda, o redator, a manter o pique até a chegada a uma meta, resultando, penso, em algo equivale a um exercício aeróbio.

Outros exercícios mentais, como os cálculos matemáticos ou de qualquer espécie, os empenhos em novos aprendizados, e inúmeras outras possíveis atividades da mente corresponderiam, de acordo com a analogia aqui sugerida, às diversas classes de exercícios físicos, como a musculação, o alongamento, e outras, sendo provável que a diversidade de exercícios mentais supere amplamente a dos físicos.

Tais exercícios propiciariam o alongamento dos fluxos de consciência possibilitando uma visão de mundo mais clara e coerente, uma compreensão mais nítida e estruturada de todas as coisas, além de impedir a senilidade por manter a mente ativa.

A redação de longos períodos claros e coerentes pode ser encarada como um jogo do qual decorrerão habilidades linguísticas, o fortalecimento da mente, além das ideias formuladas nos textos resultantes.