Óperas, guia para iniciantes - O ANEL dos NIBELUNGOS - Ópera "O Crepúsculo dos Deuses" - Wagner - Ciclo completo, 4ª Parte.

Personagens

Siegfried – um dos protagonistas, filho de Siegmund e de Sieglinde. Interpretado por um Tenor.
Brunhilde – a mais importante das Valquírias e a preferida de Wotan. Interpretada por uma Soprano.
Alberich – o anão líder dos Nibelungos. Interpretado por um Baixo.
Gunther – rei dos Gibichungs. Interpretado por um Baixo.
Hagen – filho de Alberich e meio-irmão de Gunther. Interpretado por um Baixo.
Gutrune – irmã de Gunther. Interpretada por uma Soprano.
Waltraute – a segunda Valquíria mais importante. Interpretada por uma Mezzo Soprano.
Woglinde – uma das três donzelas do Reno. Interpretada por uma Soprano.
Wellgunde – idem. Idem.
Flosshilde – idem. Interpretada por uma Contralto.
Primeira Norn – filha da deusa Erda. Interpretada por uma Contralto.
Segunda Norn – idem. Interpretada por uma Mezzo Soprano.
Terceira Norn – idem. Interpretada por uma Soprano.

Enredo
 
O cenário inicial é o mesmo da última cena de “Siegfried”; ou seja, o sitio onde estava o leito rochoso de Brunhilde. Após tê-la acordado, a noite desceu sobre Siegfried e sua bela esposa e ambos se recolheram a uma das cavernas existentes no local.
Apesar da escuridão, vislumbram-se à porta da caverna do casal, três figuras fantasmagóricas. São as fadas, filhas da deusa Erda, chamadas de Norns, que se dedicam a desenrolar um cordão dourado que simboliza a marcha do destino.
Enquanto trabalham, as Norns entoam um triste Canto que profetiza a derrocada final dos deuses de Wahalla, em castigo pela soberba e pela cobiça, representada pelo roubo do ouro do rio Reno. É um labor rotineiro para a trinca, mas em certo momento uma força desconhecida distende o cordão e o puxa em direção às terras dos Nibelungos, ao norte, provocando um grito de pavor das fadas, que, incontinenti, afundam-se no solo, como se tivessem escondendo-se de uma grande desgraça.
Depois, lentamente, a cena vai sendo iluminada e quando os holofotes atingem a máxima carga, indicando o esplendor de um novo dia, Siegfried e Brunhilde deixam a caverna onde pernoitaram. O jovem sente-se pronto para os novos combates e desafios que confirmarão a sua condição heroica e, por isso, despede-se da amada para prosseguir a sua jornada.
Porém, antes de partir, deixa o “Anel mágico” com a noiva, em sinal de empenho de amor. Ela, em contrapartida, entrega-lhe o seu precioso cavalo, Grane, que a serve desde os tempos em que era a rainha das Valquírias.
É uma separação sofrida e enquanto ela contempla a descida do amado, a orquestra toca o célebre interlúdio “A viagem de Siegfried ao Reno”, sinalizando o início do primeiro ato.
O cenário desse ato inaugural é a representação do hall de entrada do Palácio de Governo de Gunther, o líder da feroz tribo dos Gibichungs.
No centro da cena, Gunther e sua irmã Gutrune conversam informalmente com Hagen, filho de Alberich e o principal Conselheiro de governo.
Servil e malvado como o pai, Hagen não perde oportunidade de bajular os poderosos e quando o soberano lhe pede a sua opinião sobre o governo, ele não hesita em declarar que é o melhor que ele já viu, chegando mesmo à perfeição. E continua desfiando uma série de elogios aos irmãos, dizendo que quase nada poderia ser melhor, exceto, talvez, o fato de a dupla ser solteira, já que em sua ótica, os monarcas deveriam buscar cônjuges que estivessem à altura de suas grandezas e se casarem para perpetuarem “tão nobre dinastia”.
Obviamente que a sua sugestão não é motivada por princípios nobres. Ao contrário, o seu plano visa apenas os seus próprios interesses, pois soube através de seu pai, que Siegfried já despertou Brunhilde e que ambos estão juntos; e ele espera usar os soberanos Gibichungs, para atrair os herois e, depois, surrupiar-lhes o “Anel Mágico”.
Dessa forma, o seu interesse imediato é fazer com que os quatros se encontrem e, para tanto, ele começa a executar o seu estratagema. Primeiro, diz a Gunther que a única mulher que está à altura de ser a sua esposa é Brunhilde e que está a caminho de seu Palácio o jovem Siegfried, o único homem que pode romper o círculo de chamas que a circunda e resgatá-la.
Assim, ele, Gunther, deverá convencê-lo a trazer-lhe a beldade perfeita, ainda que tenha que lhe pagar um alto preço pela façanha. Gunther, que desconhece os últimos fatos, concorda e elogia a sagacidade de seu Conselheiro sem desconfiar de sua falsidade.
Acariciado em seu ego e entusiasmado com a adesão do monarca, Hagen prossegue, dizendo que será preciso despertar um grande interesse no herói para que ele realize o resgate da beldade e que, para isso, ele usará seus poderes de bruxo para fazê-lo esquecer-se completamente de Brunhilde e apaixonar-se pela Princesa Gutrune, cabendo a Gunther, a partir daí, condicionar o seu consentimento ao namoro e casamento de sua irmã ao resgate que Siegfried fizer. Então, os dois casamentos acontecerão simultaneamente.
O rei dos Gibichungs exulta com a maestria do plano e se sente profundamente agradecido ao anão, persistindo na ingênua postura de nada perceber das reais intenções do outro.
Nesse momento, escuta-se a trompa do jovem Walsung anunciando a sua chegada. Aparentando sua habitual confiança, ele desce do cavalo Grane e pergunta pelo rei do lugar, a quem oferece paz ou combate.
Conforme o planejado, Gunther recebe-o amistosamente e lhe franqueia as portas de seu Palácio em sinal de boas-vindas.
Gutrune, que num primeiro momento desaprovara o plano de se casar mediante a fraude de um feitiço de Hagen, ao ver a bela estampa do jovem, muda totalmente de opinião e se encarrega pessoalmente de lhe servir a beberagem mágica, que, de fato, produz imediatamente o efeito pretendido, fazendo com que Siegfried apaixone-se perdidamente por ela e se esqueça da filha de Wotan.
Gunther não perde tempo e diz estar disposto a conceder permissão para que sua irmã se case com o homem que lhe trouxer a única mulher que lhe interessa desposar: a bela Brunhilde.
A citação do nome da ex-noiva não provoca nenhuma recordação na mente perturbada do jovem herói e prontamente ele se dispõe a fazer o resgate para obter à mão de sua nova amada. Casar-se com a princesa dos Gibichungs é tudo que o ele deseja.
Nesse momento, o malvado anão percebe que Siegfried porta o “Elmo Mágico – Tarnhelm”, sem saber dos incríveis poderes que o mesmo possui. Explica-lhe, então, que o capacete tem o dom de dar a quem o usa a forma e a aparência que se desejar. Dessa sorte, prossegue, ele, Siegfried deverá resgatar Brunhilde transfigurado em Gunther, fazendo com que ela passe a ter carinho, admiração, gratidão e, talvez, amor por ele.
Gunther e Siegfried aprovam, entusiasmados, essa parte do plano e selam um pacto de amizade, declarando-se “irmãos”, através do antigo ritual de colocar algumas gotas do sangue de ambos, nos respectivos cálices de vinho com que brindam a oportunidade.
Pouco depois, entram ambos na embarcação à margem do rio Reno e seguem em direção ao sitio onde ficou Brunhilde. Na aldeia, ficam uma apreensiva Gutrune e um felicíssimo Hagen, enquanto a orquestra executa um belo interlúdio musical que encerra essa primeira cena.
A segunda cena volta a ser encenada no sitio em que Brunhilde ficou aguardando a volta de Siegfried.
A baixa iluminação indica o fim do dia e a nostalgia do crepúsculo reflete a divagação a que a ex Valquíria se entregou, enquanto espera o retorno de seu bem amado.
Subitamente um trovão quebra o silêncio e anuncia a chegada de Waltraute, a segunda Valquíria mais importante e a nova líder do grupo, após a queda da primogênita.
Brunhilde alegra-se com a visita de sua irmã e com a perspectiva de que ela traga o perdão de Wotan, mas Waltraute se limita a narrar a angústia do “Rei dos Deuses”, assim como a das outras divindades, diante do fim iminente; e a lhe pedir que devolva às “Donzelas do Reno” o Anel dos Nibelungos que Siegfried lhe deixou como prova de amor, numa tentativa de atenuar a maldição de Alberich.
A decepção estampa-se no semblante de Brunhilde e sem poder conter a mágoa e a ira ela responde com muita rispidez à irmã que nunca se apartará daquela “prova de amor”, mesmo que isso custe à derrocada total de Walhalla. Desesperada Waltraute sai de cena.
Alguns instantes depois, a decepção e a ira que Brunhilde sentiu dão lugar a uma agradável sensação de bem-estar, de alívio e, até, de felicidade, pois se ela perdeu a imortalidade e as premissas de deusa, ganhou a maravilhosa completude do amor e a amplitude de se saber mulher por inteiro.
Todavia, essa doce sensação não perdura e logo é trocada por um mau pressentimento ao ver que as chamas que lhe circundavam aumentaram de intensidade.
E, com efeito, logo depois, ela percebe a aproximação de um homem estranho*.
Aterrorizada, ela grita perguntando-lhe a identidade. Em resposta ele diz ser membro da tribo dos Gibichungs e que veio resgatá-la para ser desposada por seu rei.
Aturdida e sentindo-se fragilizada pela perda de seus dons divinos, Brunhilde não reage e se prepara para segui-lo. Enquanto isso, Siegfried ajoelha-se e jura sobre a sua espada que guardará aquela mulher como se ela fosse a sua irmã.
E assim termina o primeiro ato.
§§§
O cenário do segundo ato reproduz a praça fronteiriça ao castelo de Gunther.
A débil iluminação indica que é noite. Hagen, visivelmente ansioso aguarda o retorno de Siegfried e de Gunther trazendo Brunhilde. E enquanto os seus pensamentos voam, ele saboreia o êxito que imagina obter em um futuro próximo.
Nesse momento, percebe-se na penumbra a silhueta de outro anão e logo fica claro que se trata de Alberich que veio, novamente, cobrar de Hagen o juramento de que tudo fará para recuperar o seu precioso “Anel Encantado”. O diálogo entre pai e filho é carregado de certa tensão e o sombrio fundo musical que a orquestra executa, acentua essa condição hostil entre ambos. Por fim, Alberich retira-se.
Instantes depois, lentamente o dia começa a clarear e nessa hora Siegfried surge em cena causando o súbito despertar de Hagen, que não esconde a surpresa ansiosa que o domina, bem como o temor que sente, ao ver que Brunhilde não está com o herói.
Contudo, logo ele se acalma quando o jovem Walsung lhe diz que chegou antes graças aos poderes do “Elmo Mágico” e que a ex-Valquíria e Gunther logo chegarão, pelo rio.
Animado e feliz, o anão Conselheiro toca a trompa e anuncia aos populares as boas novas. E o povo recebe com júbilo a noticia de que o Rei dos Gibichungs irá se casar em breve com a Princesa das Valquírias e filha dileta do “Rei dos Deuses”.
Pouco depois, o barco que traz o casal aporta e Gunther exibe, orgulhoso, a sua bela noiva, sem sequer imaginar, haja vista que Hagen tudo lhe ocultou, que a mesma tornou-se uma proscrita por ter desobedecido ao pai Wotan e que já é a mulher de Siegfried.
Ainda em estado de choque, Brunhilde nem escuta o que dizem e o que se passa à sua volta. Tudo lhe parece um sonho ruim, do qual irá despertar em algum momento.
Em seguida é apresentado aos cidadãos o outro casal de noivos que em breve irá se casar: Siegfried e Gutrune.
Nesse instante, ao ouvir o nome de seu amado, Brunhilde volta à consciência e o seu olhar encontra-se com o dele, sem que ele demonstre reconhecê-la. Então, uma terrível dor apodera-se de seu coração e ela presume ter sido preterida, em razão da fortuna e da posição social de sua rival.
E mais amargurada fica, quando percebe a falta do “Anel Encantado” que Siegfried havia lhe deixado como empenho de seu amor por ela. Alucinada, acusa a Gunther (pois essa era a aparência de Siegfried ao resgatá-la) pelo roubo e insulta rudemente ao seu ex-noivo, chamando-o de traidor, venal, oportunista etc., sem ao menos supor, que ele também é uma vitima do sórdido estratagema urdido por Alberich e por Hagen.
Por fim, incapaz de se conter, grita que Siegfried é o seu verdadeiro marido e não o rei Gunther.
Ante o desconcerto geral, Siegfried pede a lança que Hagen segura e jura sobre a arma que todas aquelas acusações de Brunhilde são falsas.
Em resposta, ela avança sobre a mesma lança e profere a seguinte maldição: “Arma sagrada! Que tragas a morte a Siegfried que jurou em falso sobre ti”.
Porém, inocentemente, o herdeiro de Siegmund não se incomoda, pois acredita piamente que a verdade está consigo e só recomenda que Gunther providencie ajuda médica à sua futura esposa, que está visivelmente perturbada. Em seguida, toma Gutrune pelo braço e deixa a cena.
Ficam Hagen, Brunhilde e Gunther. Atônitos, os dois últimos mostram-se ansiosos para esclarecer os fatos. Para Hagen, tudo está perfeito.
Em comum, os três tem interesse em testar e/ou em punir Siegfried. Gunther, para ter certeza de que ele não o enganou; Brunhilde, para vingar-se da traição e Hagen, claro, para reaver o “Anel Encantado”. Assim, combinam testar e eventualmente punir o herói com a maior brevidade possível.
Para tanto, Brunhilde revela que o ponto fraco do herói fica nas costas e, por isso, ele ficou invencível até então, já que sempre o protegeu cuidadosamente de todos os inimigos.
Hagen reconhece que será dificílimo vencê-lo, mas que será possível que “um acidente de caça” o elimine.
Gunther, porém, é contrário a essa traição covarde, pois ainda não tem certeza de que foi enganado e, ademais, selou com o futuro cunhado um pacto de amizade fraterna. Contudo, quando Hagen lhe conta sobre os poderes do “Anel Encantado”, a ambição se sobrepõe aos seus escrúpulos e ele deixa de ser contrário à ação.
Dessa sorte, eles programam uma grande caçada para a manhã seguinte, na qual acontecerá o assassinato de Siegfried.
É o fim do segundo ato.
§§§
O terceiro ato é encenado na representação de uma clareira na floresta, às margens do rio Reno.
A caçada programada aproxima-se do final e Siegfried passeia despreocupadamente pelas margens do rio até ser interpelado por Woglinde, Wellgunde e Flosshilde, as “Donzelas do Rio”, que vivem em constante lamentação desde que deixaram o seu tesouro ser roubado por Alberich.
Agora, sabedoras de todos os fatos que sucederam e de que o “Anel” está com Siegfried, imploram para que ele lhes devolva a joia e se livre da terrível maldição que o fará perder a vida naquele mesmo dia.
Porém, o herói que nada teme, limita-se a pilheriar de suas súplicas e advertências e elas desistem, voltando para o fundo do rio. Entrementes, o som da trompa anuncia a chegada de Gunther, de Hagen e de vários outros caçadores, vaidosos de suas pobres presas.
Ainda rindo das “Donzelas do Rio”, Siegfried conta aos recém-chegados o diálogo que travaram e torna a desdenhar das advertências que elas lhe fizeram. Gunther, porém, não compartilha de seu descaso e se mostra aterrorizado pelo vaticínio funesto, pois sabe dos grandes poderes que as ninfas possuem.
Hagen, por outro lado, executa mais um lance de seu plano macabro ao dar uma estranha bebida a Siegfried que lhe devolve a consciência e a memória. Emerso, então, do torpor e da perturbação, ele atende a sugestão do anão e se põe a falar sobre a sua infância com Mime e de como o matou após compreender que ele só o usava; de como abateu o dragão em que Fafner se transformara; da “Espada Mágica” que herdara do pai, da linguagem dos pássaros e, finalmente, do encontro com Brunhilde.
E ao citar do nome de sua bem amada, desperta em Gunther uma enorme fúria, pois sem saber dos feitiços de seu Conselheiro, o rei dos Gibichungs julga que Siegfried esteja mentindo descaradamente. Acredita, em sua ingenuidade, que quando Brunhilde esbravejou, ela estava coberta de razão e que não se tratava de um delírio mental. Sim, Siegfried era um trapaceiro que o enganara!
Nesse instante, dois corvos sobrevoam o local e Siegfried vira-se para observar-lhes, dando chance para que Hagen o atinja pelas costas com sua a lança. Ferido em seu ponto vulnerável, cai agonizante, mas antes de expirar o último suspiro, compreende a armadilha em que caiu e o grande mal que involuntariamente causou à sua bem amada e entoa o célebre “Cântico do Adeus” à Brunhilde.
Assistindo a todo aquele sofrimento, Gunther percebe que o herói foi apenas mais uma vitima das artimanhas de Hagen e parte, decidido, à procura do mesmo para lhe dar o merecido castigo. Porém, o anão já havia escapado. Ao soberano só resta dar um enterro principesco ao herói.
Lenta e ritualmente os seus vassalos transportam o corpo ao som da conhecidíssima “Marcha Fúnebre”. E além dela, outros temas melódicos que simbolizam a raça heroica dos Walsungs e o “tema do fogo” de Brunhilde são executados em apenas dois toques, numa soberana representação da inexorabilidade da morte.
É, seguramente, uma das partes melódicas mais tocantes de todo o grande ciclo e um dos momentos mais marcantes e apreciados pela plateia, que, em geral, é tomada por grande emoção.
Desse modo, encerra-se a primeira cena.
A segunda cena é ambientada no hall do Palácio Real dos Gibichungs.
Gutrune anda pelo aposento de modo mecânico, demonstrando a terrível aflição que lhe aflige. Pouco depois os seus piores temores são confirmados quando adentra a cena o cortejo fúnebre.
Ensandecida, ela ataca o seu irmão Gunther e o acusa pelo assassinato de Siegfried. E só a muito custo ele consegue acalmá-la e convencê-la de que o verdadeiro culpado é Hagen. Nisso, o pérfido anão ressurge e diz em sua defesa, que matou o herói apenas para cumprir a lei que determina que o indivíduo que jurar em falso sobre uma arma, deverá ser morto pela mesma.
Dura Lex, sede Lex. Sim, é a Lei! E ninguém, tampouco os irmãos, podem contestá-la e acusá-lo. Aproveitando-se, então, dessa resignada submissão de todos ao princípio legal, ele exige o “Anel Mágico” como recompensa por ter executado o artifício legal.
Gunther, todavia, nega-se a atender a sua exigência e Hagen o mata. O seu temor de que o seu plano falhe justamente quando estava tão perto de se concretizar, rompe-lhe qualquer temor ou racionalidade e ele não hesita em vilipendiar o cadáver de Siegfried para roubar o desejado “Anel”; porém, como se fosse um aviso do Além, o braço do herói levanta-se e ele se afasta aterrorizado.
Enquanto isso, Brunhilde retorna à cena e como já está ciente de toda a verdade exige que o corpo de seu amado seja ritualmente incinerado junto ao Reno, numa alta pira, à altura de seu heroísmo e de sua condição de semideus.
Depois, retira carinhosamente o “Anel Encantado” das mãos de Siegfried e agradece às “Donzelas do Rio” por lhe terem revelado toda a verdade, dizendo que em breve lhes devolverá a cobiçada joia, totalmente purificada pelo fogo redentor.
Nisso, os vassalos terminam a pira funerária e colocam o corpo de Siegfried em seu topo, donde logo a sua alma libertada voará.
Montada em seu fiel cavalo, Brunhilde apanha uma tocha e acende a pira; depois, atira-se à mesma** para morrer junto com seu amado, enquanto entoa a sofrida ária “Cena da Imolação”. Sacrificando-se, redimirá os deuses e os homens.
É uma cena dantesca e para aumentar o impacto, o rio Reno transborda e as águas derrubam todo o reino dos Gibichungs.
Nas águas, as “Donzelas do Rio”, veem aproximar-se o corpo inerte de Brunhilde, que dessa forma insólita vem devolver-lhes o Anel dos Nibelungos.
Recuperando-o, apressam-se em mergulhar e logo em seu encalço surge um alucinado Hagen, que escapou da inundação e que não se conforma em ver seu objeto de obsessão escapar-lhe novamente.
Entra intempestivamente no Reno, mas ele não é páreo para os poderes das ninfas, que logo o agarram e levam para o fundo do rio, de onde nunca mais voltará.
E como para confirmar o desaparecimento da maldição, Flosshilde emerge jubilosa, exibindo o ex Anel dos Nibelungos já purificado e livre das mesquinhas cobiças humanas.
Noutro ponto da cena, sobre as ruínas do ex Palácio dos Gibichungs, avista-se um céu cor púrpura e, no pico de uma poderosa montanha, as chamas que consomem o outrora poderoso Walhalla, a morada de Wotan e de sua corte. Findaram-se os antigos deuses.

Que os homens façam triunfar o amor e a justiça!

Assim, com esse brado de renovada esperança no destino humano, Wagner encerra a sua grande obra, cuja mensagem continua tão vibrante, quanto foi em sua origem.

Nota do Autor* - Em verdade, como se recorda o leitor (a), esse estranho é Siegfried transfigurado em Gunther, graças aos poderes do “Elmo Mágico”.

Nota do Autor** - nessa cena é possível ao leitor (a) observar uma provável referência à antiga cultura Hindu, onde se observava o ritual chamado “Satee” que ordenava que as viúvas fossem imoladas na mesma pira fúnebre de seus falecidos maridos.
 
 Lettré, l´art et la Culture. Rio de Janeiro, outono de 2015.