Cristiano Araújo, você e Z.Camargo

No afã louco de comercializar suas falas, vejo repórteres dando a luz a entendimentos peculiares, sobre um mundo que não conhecem e do qual não participam, sem se dar conta de que se trata de ninhos nos quais nunca deveriam ter colocado o bico.

Um amigo, experimentado nos jornais, comentou algo assim: “Esses caras são parecidos com aqueles correspondentes internacionais, que estão num país comentando acontecimentos em outro continente!”

De fato! Esse repórter Z.Camargo falou de coisas que não viu (a não ser pelos meios de comunicação) e não viveu (porque demonstra não apreciar o estilo sertanejo). Tampouco ninguém possui o direito de emitir juízo de valor sobre a pessoa ou artista C. Araújo, a não ser sua própria família. Roboticamente o repórter em comento reproduziu clichês vendáveis, eivado de criticas ao comportamento social. Não se apercebeu que todos estavam comovidos era com o fato da prematura partida desse promissor e jovem cantor juntamente com sua namorada em tenra idade?

Dar sua opinião, ok. O problema é que quando tais comentários são postados em veículos de comunicação de massa. Há quase certeza de existirem pensamentos diferentes dos seus, mais do que isso, existirem sentimentos envolvidos não indiferentes como os seus.

Soando como um tipo de vilipêndio intelectual, a tentativa de crônica sobre a morte de um (chamado pelo autor) “quase desconhecido cantor sertanejo” trouxe muito desconforto. Lançou no ar uma espécie de afronta coletiva, um tipo flagrante de desrespeito e desconsideração contra os que estão sentimentalmente envolvidos com o conteúdo dos acontecimentos, tais como família, amigos, parentes, conhecidos, fãs, colegas do meio artístico...

Esta é a típica “liberdade de expressão”, notadamente relativista e paradoxal. Publica uma tentativa de aprisionamento do pensamento alheio, a partir de preconcepções próprias de mundos ideais tão intangíveis. São palavras de experimentações que nunca aconteceram, comentários sobre um mundo nunca vivenciado. É preciso estar envolvido para falar sobre algo que tem a ver com o sentimento dos outros, ainda mais se for este sentimento de foro coletivo. Dizer essas coisas "vendáveis" é mesquinharia, sob os auspícios de uma falsa supremacia cultural da vida na cidade grande sobre a vida simples do campo, é renegar a cultura cantada na música popular sertaneja, é desvalorar as raízes de boa parte dos brasileiros.

A regra de jornalismo imparcial, nesses casos, não se aplica. Falar desta maneira sobre as cinzas, ainda mornas, de um trágico acontecimento é, no mínimo, deselegante e desrespeitoso. Não se pode culpar alguém por se sentir tocado com uma situação de perda, seja ela de um parente, colega, conhecido, amigo ou mesmo de um cantor de quem era fã.

Ninguém deveria dizer para um jovem que se espelha num determinado cantor, que obteve sucesso com a música, saindo de uma condição financeira precária, que existem coisas mais importantes no mundo para se preocupar e render dádivas. É o tipo de coisa que não se precisa dizer, cada um sabe das suas convicções, crenças e é responsável por suas escolhas.

Não se pode querer questionar a dimensão de importância que as pessoas dão para coisas diferentes. Uma coisa é ser “ícone” e outra “mártir”. O C.Araújo pode não ter sido um mártir nacional, mas, sem dúvidas, era ícone para muitas pessoas e merece todo nosso respeito. Sua vida teve propósito e sua partida também. Ainda estamos tentando assimilar o golpe e compreender as razões para sua ausência. Parece simples, mas, tenho visto muita gente falando sobre não trocar as rodas originais do veículo e sobre não deixar de usar cinto de segurança no banco traseiro. Mudanças culturais começam assim.

É preciso que a “liberdade de expressão” tenha limites quanto à “liberdade de emoção”. Podemos gostar de música sertaneja, clássica, samba, pagode, axé, funk, rap, metal, rock, de roda, cantigas para ninar... Podemos gostar do que quisermos. A música embala nossa vida e nos remonta memórias. Gosto de sertanejo universitário e dancei muito as músicas de C.Araújo com a minha noiva. Certamente continuaremos dançando, pois, foram compostas para isso mesmo, para causar emoção nas pessoas. As músicas de C.Araújo causam euforia com o “besteirol” (como ele mesmo dizia de algumas de suas obras) ou de romantismo aflorado presente em cada palavra da maioria das suas músicas.

Enfim, pensamentos não podem ferir sentimentos! Ninguém pode prender ou ferir os sentimentos de outro alguém. Todas as pessoas são livres para gostar de algo e/ou de alguém. Ninguém tem o direito de atentar contra tal liberdade de se emocionar ou de se comover.

Por um mundo com MAIS respeito com o sentimento alheio, seja do sertanejo, eletrônico, funk ou roqueiro, e com MENOS dessa chata filosofia cult de desconstrução!

Marlon Cardoso
Enviado por Marlon Cardoso em 29/06/2015
Reeditado em 17/07/2015
Código do texto: T5293652
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