O ponto de acumulação

Em algumas décadas presenciaremos um fenômeno sem precedentes, a maior explosão criativa já ocorrida: o ponto de acumulação.

A maior parte das ideias científicas permanece circunscrita a um diminuto círculo, raramente transcendendo os limites de pequenos grupos de cientistas. Algumas delas, no entanto, são do interesse coletivo imediato, e devem transbordar para a população.

Tempos atrás descrevi um fenômeno que chamei “metaevolução” e que consiste na evolução da própria evolução. Ao analisarmos a longa história dos seres vivos percebemos, nitidamente, certos eventos, ou momentos marcantes, que os diferenciam dos demais.

Nos primórdios da vida, por exemplo, as alterações transcorriam muito lentamente até a ocorrência de algo chamado “explosão cambriana”, momento registrado com nitidez nas camadas fósseis da época, e que consistiu no repentino surgimento de uma enorme diversidade de seres complexos. Camadas geológicas anteriores a tal período registram apenas fósseis muito simples, contrastando claramente com as desse período (as camadas são datadas com precisão através da determinação de marcadores radioativos). Minha explicação para o fenômeno consiste na postulação do surgimento prévio da reprodução sexuada, fenômeno capaz de induzir a diversificação, compelindo, também, as espécies a um aumento contínuo de complexidade.

O fenômeno consiste na ilustração de um salto evolutivo. Durante centenas de milhões de anos a vida no planeta se restringia a relativamente poucas formas de vida, todas elas bastante simples; repentinamente (em uma escala paleontológica) surgem inúmeras formas de vida muito mais complexas que as anteriores, indicando ter a vida subido um degrau evolutivo, acelerando-se.

Explico o fenômeno em:

e:

http://media.wix.com/ugd/807ec9_79c8fa0180ee41649f8dd3a321aaf65a.pdf

Outros saltos evolutivos marcaram o desenvolvimento da vida no planeta, tornando-a significativamente mais diversificada e complexa, consistindo em aperfeiçoamentos do próprio mecanismo evolutivo. Assim, enquanto a vida prossegue continuamente rumo a uma complexidade crescente, eventos transcorridos em momentos especiais da história da vida aceleraram essa tendência. De fato, algumas inovações implementadas pelos seres vivos propiciaram o surgimento de mais diversidade.

Uma importante contribuição metaevolutiva foi proporcionada por nossa espécie: o desenvolvimento da linguagem. Como todos os saltos evolutivos, essa forma bastante precisa de comunicação propicia o aumento da acumulação de complexidade obtida. Quero dizer: através da linguagem podemos conservar nossas inovações, nossas invenções. Sem ela teríamos que reinventar tudo o que tivesse sido inventado anteriormente, não havendo razões para acreditar que conseguíssemos superar amplamente as conquistas de Adão, cada um de nós partiria sempre do zero. A linguagem permite que nossas invenções se sobreponham às de outros, somando-se. Trata-se de um modo de acumulação de complexidade sem precedentes, de modo que nossos artefatos e instituições vêm adquirindo complexidade crescente em velocidade cada vez maior.

Creio, assim, que o desenvolvimento da linguagem tenha tido um papel comparável ao surgimento da reprodução sexuada, propiciando, analogamente, a aceleração da aquisição de complexidade em um grau superior ao anterior. A analogia consiste no modo de funcionamento de tais processos, como válvulas, propiciando um fluxo unidirecional de complexidade crescente, impedindo a destruição de complexidades eventualmente surgidas.

Recentemente, físicos do MIT estabeleceram certas considerações termodinâmicas surpreendentes que asseveram uma tendência geral em direção ao aumento de complexidade. Acreditava-se que tal tendência era inerente aos seres vivos, e só a eles. Considerações exclusivamente termodinâmicas, sem nenhum apelo a formas de vida, demonstram que a tendência a se organizar está presente mesmo em sistemas muito simples. Se submetidos a uma fonte de luz, sistemas simples, tendem a adquirir uma ordem crescente; tendem também a se tornar cada vez mais aptos a sugar energia; característica que se imaginava típica apenas dos seres vivos. Também demonstraram que a tendência é crescente: quanto mais complexo um sistema, mais avidamente ele tende a se organizar. Trata-se de um crescimento de segunda ordem, de uma espécie de aceleração na tendência ao aumento de entropia dos sistemas. Isso pode ser visto em:

http://observatoriodaimprensa.com.br/armazem-literario/_ed783_uma_nova_teoria_fisica_da_vida/

Um fenômeno muito mais recente e não menos explosivo vem dando continuidade ao processo de aumento crescente de complexidade no universo: o desenvolvimento dos computadores. Essas máquinas universais vêm se tornando cada vez mais complexas, em uma velocidade sem precedentes. Hoje os computadores participam, como auxiliares, em todas as etapas da confecção de novos computadores, desde o projeto de seus circuitos, componentes e programas, até sua confecção física, efetuada em larga medida por meios automáticos.

Logo os computadores conseguirão perfazer todo o ciclo, sendo capazes de projetar, aperfeiçoar e produzir, autonomamente, máquinas mais rápidas, mais complexas, mais econômicas... e tudo o mais que se deseje. Quero dizer, em poucas décadas, algo em torno de 30 anos, suponho, os computadores deverão ser capazes de produzir, sem auxílio humano, computadores ainda mais potentes que eles mesmos, geração que poderá, obviamente, aperfeiçoar o processo, gerando máquinas superiores a si próprias e implementando uma sucessão ilimitada de aperfeiçoamentos cada vez mais rápidos. O resultado, explosivo, é inimaginável.

Baseado apenas no ritmo do processo de aumento de complexidade no planeta, e nessa forma planejada de evolução, arrisco prever que em, aproximadamente, mais outra década, os computadores desenvolverão algo novo e inusitado, incompreensível para nós. Tais seres, muito mais complexos que os computadores de então, deverão continuar o processo, engendrando algo ainda mais surpreendente em um tempo menor, talvez um ano.

Não há limites para o processo, embora ele se estenda muito além de nossa capacidade de compreensão. Tudo indica, no entanto, que tais seres desenvolverão algo qualitativamente novo, novo salto evolutivo, em apenas um mês. O seguinte levará apenas um dia, depois uma hora...

Delinear-se-á, assim, um ponto de acumulação; o instante mágico e absurdo de uma explosão criativa sem precedentes, comparável apenas à grande explosão geradora do universo.

A conclusão acima decorre das duas linhas de raciocínio independentes esboçadas acima: a biológica, através de considerações metaevolutivas, e a física, baseada nos princípios termodinâmicos.

O fenômeno explosivo sugere problemas gravíssimos decorrentes do consumo excessivo de energia; trata-se de mais uma previsão apocalíptica. Outras considerações sugerem forte esperança decorrente das amplas possibilidades abertas pelo momento mágico de criação de mundos.