Bastaria a indignação

Os que criaram a escravidão têm mantido a maior parte dos brasileiros na condição de subpessoas. Os governos de Lula e Dilma começaram, finalmente, a incorporar as subpessoas, tendo sido esse o seu grande crime: transformar subpessoas em gente, dar a uma multidão excluída a condição de pessoa. Policiais têm autorização para exterminar subpessoas, o judiciário brasileiro os autoriza. O judiciário brasileiro vela, e sempre velou, pela manutenção desse estado de coisas, a existência clara e definida de dois grupos distintos, pessoas e subpessoas.

Os governos de Lula e Dilma começaram a transformar subpessoas em pessoas, muitas delas. Isso significou um enorme aumento no contingente populacional brasileiro efetivo, na população que, efetivamente, participa da economia. A incorporação desse enorme contingente correspondeu ao enorme crescimento econômico do país, nesse milênio. Mais do que os índices econômicos gerais, melhoraram os indicadores de redução da miséria. Vínhamos reduzindo nossa miséria. Vínhamos transformando subpessoas em pessoas. Isso foi uma enorme conquista, gigantesca; o mundo inteiro percebeu o que acontecia aqui e aplaudiu, Começamos, então, a participar do mundo, trouxemos para cá a copa e as olimpíadas, deixando de ser expectadores do mundo, tornando-nos anfitriões e protagonistas.

Por um curto período, Lula se tornou uma das maiores lideranças mundiais. Isso aconteceu porque ele foi o principal responsável pela transformação de milhões de subpessoas em pessoas, um feito extraordinário! É por isso que ele é o cara, não por ser bom de papo. Poucas pessoas no mundo inteiro, se já houve alguma, podem se orgulhar de tamanho feito!

Vínhamos, então, executando essa mágica maravilhosa: transformando subpessoas em pessoas, aos milhões. A economia estava crescendo, o país começava a dar certo. Milhões entrando em universidades, pessoas muito pobres começando a compartilhar sonhos de gente.

Nossa situação nunca esteve tão boa, nunca tínhamos estado tão bem.

Então começamos a reclamar.

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Paremos a leitura por um momento e pensemos. Isso parece absurdo demais, mas, não foi assim? Não vivíamos o melhor momento de nossa história às vésperas da copa, quando começamos a reclamar? Isso tem apenas 2 anos.

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Embora estivéssemos vivendo nosso melhor momento, embora tudo estivesse melhorando, começamos a ouvir críticas que se repetiam nos meios de comunicação. Ouvíamos críticas insistentes na TV, no rádio, nos jornais, na internet, e elas se repetiam e repetiam, e começamos a repetir, também, as mesmas críticas. E então, tudo o que ia bem, começou a dar errado. Obtusamente, começamos a jogar contra nós mesmos, fizemos muitos gols contra, e começamos a perder.

Sabemos da existência de planos de guerra não-convencional

{ https://pt.wikipedia.org/wiki/Guerra_n%C3%A3o_convencional }

que se encaixam com precisão em todos esses fatos. O alinhamento aos BRICS seria motivo para a implementação do ataque, mas, desconsideremos esse fato, de um modo ou outro, fomos nós que nos detonamos a nós mesmos.

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Então, as conquistas sociais foram se esboroando, e o país mergulhando na crise em que estamos, uma crise artificial, construída por nós mesmos.

A campanha articulada para derrubar o governo popular já tem quase 2 anos. Durante todo esse tempo, temos ouvido a televisão repetindo as mesmas denúncias parciais, sempre do mesmo ângulo. Temos acompanhado, também, a atuação de nosso judiciário caolho, esse conjunto de instituições sórdidas, lamentáveis, sustentadas para manter nossa divisão fundamental entre pessoas e subpessoas, essa divisão indigna.

Nossas leis se baseiam na igualdade, estipulam que todos são iguais perante a lei, norma fundamental, aliás, para a concepção dos direitos humanos. Criamos, então, as subpessoas, que não são iguais às pessoas perante os juízes. Tribunais e juízes estão aí para velar, contrariamente às leis do país, pela diferenciação clara entre as pessoas e as subpessoas. Esse fato, muitíssimo claro e notório, deve ser denunciado ao mundo.

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Em 1945, depois da grande guerra, os países se reuniram para definir os direitos humanos, direitos que todas as pessoas possuem pelo simples fato de serem humanas, de serem pessoas. Naquela época, os fascistas haviam indignado toda a humanidade estipulando a existência de subpessoas que não mereciam os mesmos direitos que as pessoas. Assim como as nossas subpessoas, as de então eram tratadas em uma categoria próxima à dos animais. A indignação geral causada por tamanha indignidade, o asco que tal procedimento causava a todos, conduziu à elaboração da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Essa declaração considera consensual “o reconhecimento da dignidade inerente a todas as pessoas, pressupondo que direitos iguais e inalienáveis constituem o fundamento da justiça”. Foi estabelecida “para que o Homem não seja compelido, em supremo recurso, à revolta contra a tirania e a opressão”. Seu primeiro artigo sintetiza o espírito que perpassa toda a carta:

Artigo 1° Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos.

Somos, todos, pessoas.

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Décadas atrás, o mundo se conscientizou da vigência, na África do Sul, de um sistema que estipulava a existência de subpessoas, permitindo a elas apenas uns direitos marginais. Não eram iguais às pessoas, não tinham os direitos delas.

Tal constatação gerou a indignação mundial, conduzindo à exclusão da África do Sul da comunidade internacional; o mundo considerava indigna a diferenciação entre pessoas, a determinação de subpessoas tratadas quase como animais. Entre uma série de sanções comerciais e diplomáticas, o país foi impedido de participar de competições internacionais, como a copa do mundo e as olimpíadas. Tais restrições deixavam claro o repúdio da humanidade em relação ao estabelecimento de subpessoas. O mundo não quer se misturar com esse tipo de gente.

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No Brasil, policiais disparam metralhadoras em favelas cotidianamente, com absoluta naturalidade e impunemente, sem se preocupar que suas balas, eventualmente, abatam favelados ou cães, criaturas com direitos equivalentes frente a nosso poder público.

Em dezembro último, 5 jovens negros foram assassinados por policiais quando voltavam de um lanche em comemoração à aquisição de emprego por um deles. 111 tiros disparados pelos policiais atingiram o carro dos “suspeitos”. Outros tiros disparados pela polícia não acertaram o veículo. Os “suspeitos” eram suspeitos por serem jovens negros trafegando em zona pobre. A ação policial foi considerada exagerada.

Os assassinatos cometidos pela polícia têm o referendo de juízes e governadores. Subpessoas podem ser exterminadas com naturalidade, sob proteção legal, desde que o caso não chame atenção, o que raramente ocorre devido à frequência de tais ocorrências. Assassinatos decorrentes de disparos a esmo realizados por policiais em zonas pobres são classificados como consequências de “balas perdidas”, fenômeno local equivalente às catástrofes naturais, como raios ou enchentes.

Subpessoas devem aprender, desde a infância, a se curvar diante das pessoas dos policiais que, assim, os subjugam, impondo a ordem e o direito estipulado por eles; os que não reconhecem essa imposição são sumariamente eliminados. O menino Eduardo, de 10 anos, foi assassinado na porta de sua casa por não ter se curvado à ordem do policial, que mostrou à criança quem manda. Eduardo tinha vindo do Piauí, e, aos 10 anos, conhecia muitos de seus direitos como pessoa. Estava na porta de sua casa esperando a irmã, e sabia ter esse direito. Foi assassinado por isso. Como muitos meninos de sua terra, aos 10 anos, Eduardo já era um cabra macho, e indignou-se com a prepotência absurda do policial que o tratou como subpessoa. Levou um tiro de fuzil na cabeça, à queima roupa, pela insubordinação. Subpessoas devem demonstrar submissão. Interpelado pela mãe do menino em desespero ao ver o filho assassinado, o agente da lei respondeu que tinha matado o filho e matava a mãe. A indignação e as câmeras dos circunstantes talvez tenham-na salvado.

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Lula foi o primeiro presidente brasileiro a perceber a existência de subpessoas como um problema. Para todos os anteriores, como para inúmeros brasileiros, a classificação fascista dividindo pessoas e subpessoas é natural e inevitável.

Lula é originário desse contingente, a ascensão social é difícil, mas permitida. A rebeldia de Lula, seu crime, foi nunca ter referendado essa distinção. Lula se reconhece pessoa; ele sabe que ele mesmo é uma pessoa, nunca duvidou disso. Sabe também que seus vizinhos, seus amigos de infância, e todas as pessoas que já conheceu são pessoas, não havendo outras. A grande afronta de Lula consiste em, tendo sido presidente da república, continuar sendo o tipo de gente classificada como subpessoa, enorme ofensa aos que se consideram superiores a ela. Lula não reconhece outra existência humana que não seja a de pessoa.

Por essa razão o governo Lula consistiu em uma enorme ruptura com toda a história brasileira anterior. Ao contrário de todos os outros, empenhados em manter a categoria das subpessoas, Lula tentou abolir essa classificação espúria, propiciando condições humanas a todos os brasileiros.

Pessoas necessitam certas condições mínimas abaixo da qual nossa humanidade, de certo modo, se dissolve. Condições extremamente precárias nos deixam, sob certos aspectos, equiparados a animais. A manutenção de pessoas sob tal condição, desumana, é fundamental para a vigência do conceito de subpessoa. Permitindo-se condições humanas às pessoas, elas revelam o que são; pessoas, humanas. É o tratamento vil, desumano, que induz a ilusão da existência de subpessoas. A vileza, aliás, não é uma condição das que são tratadas como subpessoas, a vileza é própria daqueles que vilipendiam outras pessoas, que as tentam fazer, ou parecer, subpessoas. São os opressores os que se fazem desprezíveis, não aqueles que eles oprimem.

Os fascistas, os que tentam impingir a outros a condição de subpessoas são, por isso mesmo, desprezíveis. Tentam soerguer-se sobre ou outros quando os humilham, conseguindo apenas exprimir e exercitar sua vileza. Revelam-se assim, eles mesmos, dignos de pena. Não se tornam menores as pessoas por eles aviltadas, estas são apenas vítimas. Cobras vitimam pessoas, assim como escorpiões, mosquitos, ou hipopótamos também o fazem. Vitimados por qualquer um desses, as pessoas nunca deixam de ser pessoas. Também podemos ser, eventualmente vitimados por sequestradores ou outros marginais, criaturas indignas assemelhadas aos fascistas. Não perdemos nossa dignidade se vitimados por qualquer um deles, e nunca perdemos nossa condição humana. Gatos não podem ser mais, nem menos, que gatos, assim como camelos nunca são mais, nem menos, que camelos. Do mesmo modo, somos sempre pessoas, nunca mais, nunca menos que isso. Temos tentado, estupidamente, nós, os brasileiros, provar o contrário. Temos tentado mostrar a existência de subpessoas, criaturas supostamente reles e indignas, não merecedoras dos direitos devidos a todas as pessoas. Ao fazer isso, ao tentar mostrar a indignidade de outros, revelamo-nos, nós próprios, indignos. A indignidade se circunscreve apenas ao criminoso que vilipendia sua vítima, não se transfere a ela.

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A categoria de subpessoa, essa forma de aviltamento de uma outra pessoa, foi abolida da civilização há séculos, embora retomada brevemente na execrável experiência nazi-fascista, condenada por toda a humanidade.

Conseguimos agora, nós mesmos, os brasileiros, esse povo que se imagina cordial, pasmar o mundo, revelando nossa natureza fascista. Cultivamos aqui uma estranha forma de fascismo envergonhado, que não se alardeia, não se expõe. Promovemos uma surpreendente forma de fascismo que dá permissão ao policial para julgar e executar sua vítima, fingindo, ao mesmo tempo, horrorizarmo-nos com a pena de morte. Só na cidade do Rio de Janeiro, os policiais têm executado, com naturalidade, ano após ano, um contingente maior que o de todas as pessoas mortas no mundo por condenação judicial. Somos contra a pena de morte; executamos sem pena.

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A tentativa de golpe em curso consiste no esforço de manter nosso antigo modo fascista, oriundo da escravidão, nossa tentativa vil e constante de animalizar outras pessoas, de as maltratar, vilipendiar, concedendo a elas umas migalhas, impedindo o florescimento e a expressão de sua humanidade. Durante os últimos anos, um número imenso de pessoas vinha saindo da condição de subpessoa graças a umas benesses muito mínimas recebidas por elas. Pessoas somos pessoas, e nossa humanidade se revela desde as mais ínfimas condições. É necessário grande esforço para impedir a manifestação de humanidade em uns de nós, para manter a ilusão da existência do contingente de subpessoas que, durante séculos, conseguimos manter em nosso país, malgrado nosso. Uns poucos anos de governo não excludente aboliriam para sempre a distinção, pecado imperdoável aos olhos do fascista.

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Às vésperas das olimpíadas, o mundo descobre, perplexo, a existência de 2 tipos de brasileiros, as pessoas e as subpessoas. A distinção é asquerosa. De modo a discriminar entre os dois grupos, é necessário se afastar e marcar as subpessoas, vilipendiando-as, enxovalhando-as constantemente. Distanciados os dois grupos, os de cima tratam de emporcalhar os de baixo, esforçando-se por mantê-los em condições miseráveis, sub-humanas. Lembremos da quantidade de críticas raivosas aos trocados distribuídos aos muito pobres.

Pensam os fascistas que ao aviltar outras pessoas, ao marcá-las como subpessoas, se colocam acima delas, e se sobressaem. E assim o fazem, distanciado-se delas e emporcalhando-as de todas as maneiras, tratando-as como animais. Não percebem, os fascistas, a impossibilidade de transformar pessoas em animais, de transmutar pessoas em quaisquer outras coisas que não sejam pessoas, embora se revelem, eles mesmos, monstros. Temos esse poder abominável, podemos nos revelar monstros, bestas cruéis.

Quando um facínora subjuga sua vítima ele não a torna menos humana que antes. Subjugado por um delinquente, um homem não é menos homem por isso. Já o celerado que maltrata outra pessoa se mostra vil, perverso, reles. A besta é o agressor, não a vítima.

Quando impomos a sub-humanidade a outras pessoas, espezinhando-as de um modo qualquer, tornando-as miseráveis, ou roubando-lhes seus direitos, somos nós mesmos que nos tornamos vis, não elas. Pensa o fascista que a vergonha está em ser subjugado, quando a vergonha está em subjugar.

O fascista que impõe a sub-humanidade ao outro, que insiste em subjugar e pisotear as subpessoas para que nunca se ergam são, eles mesmos, vis, e apenas eles. São reles os que aviltam, não suas vítimas.

Há já décadas que a humanidade reconhece tal fato, tendo estabelecido a Declaração Universal dos Direitos Humanos “para que o Homem não seja compelido, em supremo recurso, à revolta contra a tirania e a opressão”. Mas agora o mundo nos percebe imerso no lamaçal indigno mantido por nós brasileiros, nosso esforço em restringir a humanidade de grande contingente dos nossos. E assim, o mundo nos descobre reles e vis.

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Por aqui ouvimos com frequência o dito: bandido bom é bandido morto. A máxima vale para o pobre executado na favela, não para o policial assassino que o executa.

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Se alguns idiotas resolvessem ir para as ruas jogar porcarias em outras pessoas, seriam eles os porcalhões, embora pudesse parecer, de longe, que o fossem os que tivessem sido emporcalhados por eles.

Os fascistas agem como porcalhões que, estando emporcalhados, empenham-se em emporcalhar, os que se lhes avizinham. Mas são apenas eles os porcos.

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Assim como Lula, Dilma tem governado tendo como alvo a abolição desse estado de coisas sórdido e inaceitável em que temos vivido durante séculos. Estava prestes a abolir a categoria das subpessoas, essa discriminação hedionda que macula todos nós, ameaça que revoltou os fascistas, levando-os a insuflar a insurgência, a nos manipular, através dos meios de comunicação, incitando-nos a jogar contra nós mesmos. Enganados, temos feito isso; ludibriados, fomos levados a participar de uma ridícula tragicomédia que, em nome do decoro, pretendia substituir a presidente honesta, exceção surpreendente em meio ao lodaçal em que chafurdam quase indiscriminadamente os nossos políticos.

O bando de saltimbancos que acompanhamos pela TV aceitando a abertura do processo de impedimento da presidente em nome da família e da probidade causará muitos risos futuramente, se a presidente eleita continuar no poder. Do contrário, caso a presidente seja afastada, gerará profunda indignação.

Bastaria a indignação para nos rebelarmos contra a manobra revoltante dos que articulam o golpe. Ainda que não existisse mais nenhuma possibilidade de evitar o afastamento da presidente, a indignação nos obrigaria a denunciar e bradar contra o golpe, essa artimanha asquerosa articulada pelos poderosos em conluio. Contra o povo, para perpetuar e enfatizar a existência de subpessoas, e arrebatar o poder central, aliaram-se os meios de comunicação, a politicalha mais corrupta e o poder judiciário, esse poder sumamente hipócrita e fingido.

O descaramento da farsa se adequa prontamente ao roteiro de uma comédia escrachada. A bufoneria consiste na substituição da presidente por seu vice, o traíra, cidadão que repetiu e superou a ré em todas as supostas irregularidades atribuídas a ela, a quem, além dessas, são imputadas acusações de crimes, várias deles conhecidos e ocultados pelos juízes, e abafadas, também, pelos meios de comunicação.

A palhaçada grotesca é regida por um bufão corrupto conhecido internacionalmente, secundado pelo bando de saltimbancos acusados, em ampla maioria, pelos crimes que não conseguiram imputar à ré, a presidente, e inúmeros outros.

Uma praticante da advocacia pentecostal irrompe no palco para roubar a cena, momentaneamente, alardeando cobras e lagartos em defesa do golpe, enquanto outros farsantes, mais sisudos, e fantasiados de juízes, esforçam-se por conferir à farsa bisonha um ar de seriedade.

Contrastando com o esforço de dar seriedade à comédia, sob os holofotes e aplausos de jornais e TVs, um juiz traquinas divulga conversas pessoais daqueles a quem espiona, transformando-se finalmente no colegial arteiro que devia ter sido quando tinha idade para isso. A criatura asquerosa, aliás, merece uns comentários especiais; buscava enxovalhar as vítimas da tentativa do golpe e seus parentes, como os fascistas costumam fazer com as subpessoas. Que outro intento poderia ter havido na traquinagem desprezível? Que outro propósito teria havido ao divulgar conversas pessoais até de parentes das pessoas que investigava? Causa perplexidade a constatação de que a personagem repugnante continua exercendo o cargo de juiz.

Para realçar a patacoada revoltante e nauseabunda, ela permanece exposta em uma lamentável novela que se arrasta há mais de ano pelos meios de comunicação, superando em ridículo os mais tacanhos programas de auditório, e os mais reles reality shows. As paneladas de uma plateia obtusa manipulada pelos meios de comunicação coroam o pavoroso espetáculo.

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Mas, contenhamos o riso, essa balbúrdia ridícula definirá nossos destinos, foi nisso que nos metemos. Percebemos exposta, graças a toda a fanfarronice, a palhaçada que engloba toda a alta esfera de poder no Brasil! Contenhamos o riso e indignemo-nos com tudo isso!

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Resta lembrar ressalva importantíssima: em meio enxovalho geral, em meio à ignomínia que se alastra por, virtualmente, todos os que se encontram em altos cargos de poder no Brasil, encontra-se uma pessoa, talvez a única, incólume, em meio à turba.

Trata-se, exatamente, do alvo principal de toda a farsa: a presidente Dilma.

Oh, comédia pérfida e ridícula.

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Quanta confusão, quanta mentira sem sentido tem sido bradada e repetida pela TV, quanta desorientação entre batidas de panelas.

Agora percebemos a presidente sob a ameaça de ser afastada do mandato que a população lhe concedeu para colocar em seu lugar sabe-se lá quem, tendo sido expostos os crimes de longa lista de aspirantes a substituto; ela, a quem nenhuma das denúncias se aplica.

Em meio à crise econômica e política, teme-se a imposição de um usurpador na presidência, ilegítimo e impopular, o traíra.

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Penso que o único modo de dissolver esse imbróglio absurdo consista em reconhecer todo o disparate da farsa, em assumir o contrassenso que constituiria o golpe, e retornar à normalidade democrática, com a presidente em seu lugar de direito. Completamente exposto, o golpe se revela uma arlequinada ridícula, uma farsa bisonha. Dilma fica, e os farsantes que se expliquem.

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Retorno a nós mesmos, aos brasileiros. Fomos todos expostos na bufoneria execrável, temos nossa participação na enorme farsa. Tem sido o nosso empenho em confirmar e manter a existência de subpessoas que permitiu e fomentou a comédia protagonizada pelo alto escalão do governo. Também fomos expostos. O mundo já nos reconhece vis. Todos conhecem, agora, nosso empenho em demarcar e enfatizar subpessoas. Às vésperas das olimpíadas, o espetáculo protagonizado por nossos governantes, além do riso e do escárnio que promoveu por todo o planeta, expôs também essa nossa face nojenta. Sim, é hora de encarar o fato: somos nojentos.