O mundo dentro de um quarto:

Lá se passava mais uma noite, no contorno da luz do luar, na distância da luz das estrelas. O homem já mais perguntara a si mesmo a importância de tanto questionamento, o mundo a sua volta era de incontável beleza, lindos acidentes que podiam revelar essências brilhantes, ampliando mais e mais a curiosidade humana que se direcionava para o além. E que noite era aquela? Que medo poderia sentir o garoto que era herdeiro do conhecimento de toda a humanidade? Coisas que se construíram no correr das eras e que davam a ele a vantagem de absorver toda a natureza como nunca antes havia sido absolvida, por nenhum homem. Poderia vê-se ali toda a história da humanidade, do homem que a poucos séculos descobriu não ser o centro do universo, do ser que pouco tempo atrás tinha ido a Lua e já sonhava com Marte. Cronos se aventurava em construir um tempo linear, que levava o homem a imensidão do progresso, e dava-lhe a esperança de transcender a passagem daquele pequeno planeta. O homem sofria o algoz deste tempo, sua mente, que antes pensava nele como um ciclo, sentia a luz da humanidade ir e voltar, no canto dos solstícios e equinócios, agora via que a quarta dimensão caminhava, indiscriminadamente, lançava-o sem volta para uma viagem, e ele, no fundo, sonhava em voltar. O garoto pensava em como toda a humanidade estava presente ali, aquelas estrelas que olhavam para ele, com ar de indiferença, e que sonhava alcançá-las, já foram espíritos ancestrais, já foram realizadoras de desejos, determinaram os destinos humanos , e agora são bolas de gás, feias, mas que garantem o poder desse universo.

Pensava o garoto, há tempos que tais ideias poderiam ser consideradas heréticas, afrontas às ideias religiosas de um grupo de intelectuais de um tempo que já passara. Ficava ali o universo a espreita , na indiferença dos desígnios humanos, enquanto Galileu exclamava a público que embora aqueles cardeais preferissem que o ela se movesse, a terra continuaria se movendo. Era a missão da verdade, permanecer a mesma independentemente dos desígnios humanos. Com tanta jactância, nós que já nos afirmamos o centro do universo, sentimos como se tudo pudesse se curvar a nossa volta. Resta um passe de mágica, e as estrelas já se voltam para perto de nós, pequenas como pontos, aquilo que designava seu nome em grego ( asteriskhos). Se quiséssemos, mudaríamos a terra para o centro do universo em poucos minutos. Se quiséssemos, Marte seria um planeta habitado como o nosso. Se quiséssemos, dois mais dois seriam cinco. Essa é a mentalidade inconsciente do homem primordial, acredita ele que, no puro solipsismo, tudo é voltado a obedecer nossas verdades, não glorificam os homens o fato de que seus livros religiosos os apontam como o centro do universo? E pobre de quem questionar isso. Matéria é espírito e espírito é matéria, o homem de todos os tempos gostaria de verter a causa em efeito, o ato em potência, o início com o fim, somos mais que isso, mas também somos fracos. Somos tão fracos que Achamos que podemos mudar tudo, mas se estamos aqui, podemos morrer por um único suspiro divino, e assim será, para os que creem, no dia designado.

Pensava o garoto em tudo que se seguiria depois dali, revolução científica, revolução francesa, secularização. A humanidade não mais pareceria como antes. Eu que agora não sou mais o centro, não me julgo ser Deus. Eu que já não me julgo ser Deus, não me torno menos pretensioso. Logo seriam descobertos tudo o que se imagina como tecnologia nesse mundo moderno: máquina a vapor, imprensa, aviões, um salto quantitativo muito alto. Nas peripécias da humanidade, julga-se que quando se troca o deus já não há mais. Hoje se fala em razão, antes de fé; sentia-se filho de Deus, hoje se procura seguir o relógio. Tempo, essa doce máquina, já não mais cíclico, cumpria seu papel nas equações da física com diatribes dos homens que precisavam logo nas fábricas entrar . No vapor, no calor , no medo do futuro , insegurança. O homem pretendia-se o centro do universo, mesmo que de lá tivesse tirado a terra, sentia-se muito inseguro para tirar sua importância . Lá o humanismo mostraria seu lado hipócrita, lá o homem veria que é o ser mais cruel entre todos os viventes. Era a fábrica, grande devoradora de homens, consumindo sua vontade de imaginar. O homem se alienou do seu trabalho, servia a senhores desconhecidos , o hábito; o salário, baixíssimo.

Quando homem chegou a lua, na esperança de encontrar as estrelas, e agora que as encontrara , sonhava com mais . E o quarto aos poucos se enchia de histórias reais, mas que davam àquela única noite dentro de um quarto o sentimento de conter em um único momento, de olhar para o futuro, a síntese do que estaria por vir, e do que já passou por lá. O menino era a própria humanidade, e as estrelas seu lar….

Fim!

Eric Deller
Enviado por Eric Deller em 15/08/2016
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