etimologia da língua portuguesa Etimologia da Língua Portuguesa por Deonísio da Silva Declaração veio do latim declaratione,ação de declarar,informar,às vezes publicamente,como é o caso dos manifestos.Já túmulo,monumento fúnebre erguido em memór

Etimologia da Língua Portuguesa por Deonísio da Silva

Declaração veio do latim declaratione,ação de declarar,informar,às vezes publicamente,como é o caso dos manifestos.Já túmulo,monumento fúnebre erguido em memória de alguém,teve origem no latim tumulus,colina,pequeno monte.

Bandarra:de bando,do latim bandum,do gótico bandwa,sinal,pano que identifica um grupo.Passou a designar o vidente,mas também o vadio,o malandro.No primeiro caso,por influência dos versos proféticos de Gonçalo Anes Bandarra (por volta de 1500-1556),sapateiro e trovador português.Foi perseguido pela Inquisição e recebeu uma pena leve,ou seja,escapou da fogueira.Suas poesias foram publicadas incialmente em Paris e Nantes,na França,e mais tarde em Barcelona, na Espanha,depois de inéditas por quase um século.Fernando Pessoa((1888-1935),que morreria quase inédito também--apenas Mensagem tinha sido publicado --,fez dele tema para o seguinte poema:"Sonhava,anônimo e disperso,/O Império por Deus mesmo visto,/Confuso como o Universo/E plebeu como Jesus Cristo./Não foi nem santo e nem herói,/Mas Deus sagrou com Seu sinal/Este,cujo coração foi/Não português,mas Portugal."

Cuneiforme:do latim cumeus,cunha,e forma,que tem forma de cunha,como é o caso da escrita utilizada na redação do Código,de Hamurabi (1792-1750 a. C),rei da Babilônia e criador do famoso império. O Código,gravado num monólito,foi descoberto em 1901 e está no Museu do Louvre,em Paris. Carlos Drummond de Andrade (1902-1987),Cadeira de Balanço,refere com verve um outro tipo de escrita cuneiforme,encontrada e ainda preservada no Ministério da Fazenda:”Considerando o formulário para declaração do impostode renda algo assimilável aos caracteres cuneiformes,sempre me abstive religiosamente de preenchê-lo.” Além do Código,o soberano escreveu 153 cartas,nas quais ordena até providências triviais. Na primeira,ocupa-se de garantir emprego a um cozinheiro. Na última,ordena a um chefe de importante região que se junte a trabalhadores “para proceder à tosquia das ovelhas da província inferior.”

Declaração:do latim declaratione, ação de declarar,informar,por vezes publicamente,como é o caso dos manifestos. Nossa independência política,por exemplo,ainda que celebrada a 7 de setembro de 1822,foi declarada no dia 6 de agosto daquele ano,em manifesto de dom Pedro I (1798-1834) dirigido aos governos e às nações amigas. Afirmativa textualmente:”O Brasil proclama à face do universo a sua independência política,e quer como reino irmão,e como nação grande e poderosa,conservar ilesos e firmes seus imprescindíveis direitos.” Apesar de respeitar e acatar o pai,o rei dom João VI (1767-1826),que para cá viera em 1807,ainda como princípe regente,em companhia da mãe,dona Maria I (1734-1816),dom Pedro I manifestou muitas vezes seu repúdio ao que chamava de “tirania portuguesa”.Mas o Brasil gosta de cuspir em sua imagem,como um narciso às avessas,na expressão de Nelson Rodrigues (1912-1980),e frequentemente parece esquecer os feitos notáveis do primeiro imperador do Brasil,preferindo lembrar que era irritado e ciclotímico,além de andar em más companhias pelas noites do Rio.Também essas declarações podem ser documentadas,mas se apequenam diante da figura de estadista do príncipe. Sua geneologia tinha laivos complicados.Sua avó casara com o tio e enlouquecera ainda em 1792. Um dos sinais da loucura de dona Maria I pode ser sido a demissão de Sebastião José de Carvalho (1699-1782),o Marquês de Pombal, responsável por eficientes mudanças no governo português.Uma delas foi a transferência da capital do Brasil,de Salvador para o Rio de Janeiro.Mas perseguiu padres e isso dá azar. Morreu em desgraça,abandonado,pouco depois de ver seus antigos inimigos mandando no governo de dona Maria I.

Túmulo:do latim tumulus,colina,outeiro pequeno monte.Passou a designar a terra com que se cobre um cadáver. Conservou tal significado quando a porção de terra que se elevava sobre a cova foi substituida por pequenas construções,depois transformadas em jazigos suntuosos,de acordo com a riqueza ou a importância política do morto.Nem sempre é possível,porém,ter o último descanso em terra,como ocorreu com tantos personagens.O corpo do deputado Ulysses Guimarães (1916-1992) jamais foi encontrado,depois que o helicóptero em que viajava caiu no mar,nas proximidades de Parati(RJ).Bartolomeu Dias (?-1500) morreu afogado perto do Cabo das Tormentas,já rebatizado para Cabo da Boa Esperança,pois ele o dobrara,sem o saber ainda em 1487. E o romancista José de Alencar (1829-1877) registra,em A Alma do Lázaro,conhecida expressão sobre a morte de navegadores:”Lembrava-me os combates navais das forças espanholas e portuguesas contra os holandeses,especialmente o de 12 de setembro de 1631,em que Pater,depois de sete horas de peleja,batido por Oquendo,abandonado da tripulação em sua nau presa das chamas,preferiu à salvação,que tinha por desonra,uma morte gloriosa,e, envolvendo-se na bandeira nacional,sepultou-se no oceano, único túmulo digno de um almirante batavo,”

Deonísio da Silva doutor em Letras pela Universidade de São Paulo e escritor,é autor de Os Guerreiros do Campo e A Vida Íntima das Palavras (Siciliano),entre outros 27 livros. E-mail:deonisio@terra.co.br

Revista Caras

2002

Doutor Deonísio da Silva
Enviado por zelia prímola em 23/09/2016
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