Etimologia da Língua Portuguesa nº 40

v Etimologia da Língua Portuguesa por Deonísio da Silva nº40

Mascote vem do provençal mascoto,sortilégio,feitiçaria,derivado de masco,feiticeiro.Ou da adaptação da palavra pelo compositor francês Audran para a sua opereta La Mascote. Já uniforme,do latim uniformis,significa uma só forma e de início designou roupas militares.

Embrião:do grego embruon,pelo francês embryon,designando os primórdios do organismo (animal e vegetal),mas aplicado também em sentido metafórico. A raiz grega é o verbo bruein,crescer.Comumente indica o fim do estágio entre o fim da segunda semana e o fim da oitava semanas do ser humano.No decorrer da história,placentas de complexas reflexões envolveram o embrião,começando pelas afirmações teológicas que,na Idade Média,ousaram fixar o momento em que a alma era infundida no feto em formação,levando a Santa Sé a determinar que já na concepção existisse o homem,ainda que em estado embrionário.Não existindo ser humano sem alma-- o desalmado serve apenas como metáfora --,decorreu que não apenas o aborto,mas qualquer contracepção seria homicídio,a punir. As sociedades modernas,porém,a sacramentaram como controle da natalidade.De outra parte,asseguram à mulher o direito de dispor do seu próprio corpo,soberana para descidir se continua ou interrompe uma gestação.Paradoxalmente,foi nas sociedades mais desenvolvidas,onde a taxa de natalidade cai a níveis absurdos,que experimentos médicos levaram à ferilização artificial. O embriólogo italiano Severino Antinori,o Doutor Clone,chegou a tentar clonagem humana.Atenta ao que vai pelo mundo,a roteirista Glória Perez tratou o temana recente novela O Clone.

Mascote:de origem controversa.Procederia do provençal mascoto sortilégio,feitiço,derivado de masco,feiticeiro.Ou do francês Mascotte,opereta do bem- humorado compositor francês Edmond Audran (1842-1901),apresentada originalmente em 1880.Como prática social,radica-se em sociedades tribais,nas quais pajés e xamás invocam o sobrenatural para ajudar os humanos. O vocábulo passou ao esporte,sobretudo o futebol.Desse modo,um mosqueteiro é o mascote e apelido do Corinthias.O Palmeiras tem dois:o periquito e o porco.O leão dá sorte à Portuguesa de Desportos,enquanto a sua homônima santista é protegida por uma donzela portuguesa,a Luisinha. O São Caetano defende-se com o azulão.O do São Paulo é o próprio santo,envergando veste talar tricolor,tendo numa das mãos o par de chuteiras e na outra a bola.O Brasil é canarinho.A França,galo.Animais predominam,mas a Francana,da cidade de Franca,no interior de São Paulo,deixa claro o que é mascote,ao adotar a figura de uma bruxa voando a bordo de uma vassoura.

Pedofilia:do grego paidos,criança;e philos,amor,amizade.O adjetivo pedófilo entrou para a Língua Portuguesa nos finais do século XIX.O asssunto é muito grave e,no que se refere a padres que molestam crianças e adolescentes,foi discutido recentemente por um grupo de cardeais sob orientação do papa João Paulo II.O radical do vocábulo pedófilo é o mesmo de pederasta e pedagogo.No primeiro,pela formação paidos e verbo eran,gostar,amar;no segundo paidos e o verbo egein,conduzir.O reformador francês João Calvino(1509-1564),organizador de uma república teocrática na cidade de Genebra,na Suiça,e defensor de apenas dois sacramentos – de batismo e eucaristia --,foi o primeiro a utilizar o vocábulo pedagogia,em 1541,como ofício de ensinar.Os primeiros pedagogos do Ocidente foram padres,uma vez que as escolas começaram como prolongamento das sacristias.

Uniforme:do latim uniforme,declinação de uniformis,que significa de uma só forma.Pode ter havido influência francesa,porque no francês a palavra uniforme designa fardas,primeiramente militares ou eclesiásticas.A camisa dos uniformes das seleções nos lembra a definição de São Gerônimo(347-420):”Solent militantes habere lineas quas camisias vocante”(Os combatentes têm linhos que chamam de camisas).As primeiras camisas de futebol foram usadas em 17 de fevereiro de 1527,na Praça Santa Cruz,em Florença,quando cada time tinha 27 jogadores.A numeração que hoje conhecemos de 1 a 11 para os titulares e de 12 a 22 para os reservas ,é invenção inglesa acrescida do número 23 – quando foi autorizado o terceiro goleiro. Em 1953,o escritor gaúcho Aldyr Garcia Schlee,autor de Contos de Futebol,venceu concurso instituido pelo jornal Correio da Manhã para desenho de uniforme que incluisse as cores nacionais(até então ausentes),e a camisa amarela passou a integrar o uniforme da seleção brasileira. Daí a seleção canarinho. O amarelo espantou a urucubaca por quatro vezes,mas em 1998 o principal jogador,Ronaldo,então com 21 anos,amarelou.Na Copa do Mundo de 2002,outro Ronaldo,o Ronaldinho Gaúcho,pode consagrar-se em outra situação de crise,palavra inexistente nos ideogramas chineses e por isso representada por dois outros que, justapostos,significam perigo e oportunidade.

Deonísio da Silva,doutor em Letras pela Universidade de São Paulo,é professor da Universidade Federal de São Carlos e escritor.Publicou entre outros livros,Os Guereiros do Campo.A Primeira Coisa Que Eu Botei na Boca,Teresa e De Onde Vêm as Palavras (Siciliano).E-mail:deonisio@terra.com.br

Revista Caras

2002

Doutor Deonísio da Silva
Enviado por zelia prímola em 20/11/2016
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