Fotografando o Momento

Fotografando o Momento

Muitas vezes me pego divagando sobre pequenas coisas.

Na verdade, sobre pequenas grandes coisas que inundam

de magia nosso cotidiano.

Aqueles momentos de contemplação do ser amado.

Aquele olhar topográfico que só os apaixonados

(e os artistas) possuem.

Que mapeia cada centímetro do objeto da nossa fascinação.

Cada textura, cada contorno. Que registra a menor variação de temperatura, o menor tremor, o mais sutil respirar...

O espantoso nisso tudo é a precisão. O cuidado desse armazenamento.

Deve haver uma região especial no córtex responsável por memórias importantes Por lembranças vitais.

Mais espantosa ainda essa capacidade de registrar sensações.

Essa forma misteriosa coma qual nossos cérebros recebem, processam, arquivam tantas informações em seus milhões de detalhes. E os cheiros, e os tatos, e todos os sons. Todas as cores. E sabores...

Fica tudo lá. Cristalizado e latente.

Hibernando. Na espera.

Meu Deus, como somos capazes disso ?

De memorizar impressões mais que abstratas, mas que de todas as formas atuam nas nossas emoções? Que agem de forma avassaladora no nosso corpo ?

Mais incrível ainda essa possibilidade de resgatar essa

memória, que vem inteira, imaculada, latejante. Que nos faz sentir e reviver cada momento com a mesma intensidade.

Mas que "download" perfeito será esse, onde nenhum dado se perde, onde as cores não desbotam, e as imagens se projetam diante de nossos olhos, qual avançadas holografias ?

E de que substancial matéria se constitui essa magia que costumamos chamar de saudade ?

É como se lançássemos os braços da memória para um tempo longínquo, assim como a impulsionar uma vara de pescar para trás, de forma a lançar a seguir a linha para a frente com toda a nossa força, de modo que a isca-memória viaje o mais rápido possível para o presente. Bem ali, diante de olhos e corações. Sentadinhos e trêmulos aguardando o show...

Resgatamos um sonho para vivenciarmos outro.

Acho que saudade é isso. O sonho do sonho.

Mas que mesmo assim é real.

Sim, é real porque o corpo sente. O coração acelera, as mãos transpiram . Os olhos se inundam. A pele esquenta. E se arrepia...

E por alguns instantes o tempo perde qualquer referencial.

Passado e presente se enlaçam e se fundem em nosso sentimento de uma forma tão intensa que... bem...

Einstein já disse tudo sobre a Relatividade e as relações tempo-espaço. E outros gênios já desenvolveram conceitos avançados sobre física quântica.

Mas ninguém explicou que isso dói !

E a gente sabe como é ...

Querer resgatar os momentos, materializar pessoas, reviver sensações...

Mas o tempo não oferece replay ( isso é raro ).

Nem deja vu .

O que nos resta é viver.

Intensamente.

Cada minuto.

Como se fosse o primeiro.

Sabendo que é único.

E talvez o último.

Claudia Gadini

03.07.05