A HORA DA ESTRELA

A HORA DA ESTRELA

A obra “ A Hora da Estrela” da escritora Clarice Lispector, caracteriza-se por alguns elementos importantes que são recorrentes nas obras da autora. A semântica complexa, a habilidade no uso da linguagem, geralmente, provocando uma reflexão profunda, e expressando a angústia existencial na relação com o mundo. A linguagem, nem sempre de fácil compreensão, denuncia o drama da existência humana, tratando de problemas cotidianos e instigando à reflexão sobre as misérias do ser humano, através das coisas mais simples, dos pequenos acontecimentos, e das transformações de que o instante é capaz. A epifania presente na obra de Clarice, onde geralmente no mínimo se dá o mal, acontece através das descobertas inesperadas nas pequenas coisas da vida através dos fatos cotidianos, representando sempre um elemento transformador.

Especialmente na obra “A Hora da Estrela”, percebe-se uma instância móvel e oscilante, que se dá como um espelho de três faces na relação: autor-narrador-personagem. Todos eles convergem para a angústia existencial, para a tentativa do desvendamento do enigma e do mistério projetado por Clarice, em relação à condição humana. À medida que o narrador cria e se escreve todo através da personagem Macabéia. Personagem e narrador, Rodrigo S.M., apresenta uma reflexão sobre a inutilidade de contar a história, dada a simplicidade e a pobreza da vida sem sentido da nordestina Macabéia. A vida vazia da nordestina parece representar o invisível aos olhos cultos do narrador de classe um pouco mais privilegiada. Há uma dificuldade explícita na criação da personagem, inclusive, no uso de uma linguagem adequada, por Rodrigo S.M., dado o distanciamento entre os dois mundos, o dele e o de Macabéia. Marginalizada socialmente, sugerindo uma reflexão sobre a leitura, o desenvolvimento intelectual do indivíduo no distanciamento entre pobres e ricos.

Pobre, sem qualidades e desprovida de intelectualidade, Macabéia é uma alienada pela sua condição marginal na sociedade, é mera peça de um sistema mantido às custas da exploração da miséria humana. Em torno da nordestina gravitam vários outros personagens que participam direta ou indiretamente do seu destino.

O namorado Olímpico de Jesus, que se diferencia dela, por ser mais inteligente e esperto. Paraibano, que veio tentar a vida no Rio de Janeiro e virou metalúrgico, orgulhando-se da profissão, mas sonhando em ser deputado. Olímpico é desonesto, ambicioso e sonha muito alto, enquanto a namorada Macabéia é uma destituída de vontade, imbecilizada e alienada, mantendo ainda os princípios que lhe foram ensinados na infância, como honestidade e boa educação.Contrapondo-se a Macabéia também a amiga Glória, mais inteligente e esperta que acaba por se apossar do namorado da amiga. Glória representa a sensualidade da mulata, a mistura de raças, carioca da gema, ela representa um status a mais a ser conquistado por Olímpico, pois é filha de um açougueiro e nunca passou fome na vida.O humor e a ironia também estão presentes ao longo da narrativa, através do satírico médico que atende Macabéia, mostrando-se totalmente despreparado e sem ânimo diante da profissão, já que é um médico de periferia.

A personagem de Madama Carlota, a cartomante, caracterizada comicamente pela maquiagem ridícula e pelo passado promíscuo.Carlota, na banalidade da atividade de cartomante consegue o despertar de Macabéia para a vida. Após ir a cartomante e ouvir suas previsões, a nordestina alienada recupera suas vontades e toma consciência de si e do mundo, mas ao atravessar a rua é atropelada por um automóvel Mercedes, que ironicamente tem como símbolo uma estrela. Antes de morrer, Macabéia desperta para a vida tomando consciência de si mesma e repetindo três vezes: Eu sou, eu sou, eu sou. E em posição fetal morre, ficando implícita a possibilidade de um renascimento legado aos marginalizados através da morte.

A obra “A hora da Estrela” é uma profunda e angustiante reflexão sobre a condição humana, pois em cada personagem, em cada palavra está projetada a possibilidade da visão universal do ser humano, das suas dores, das suas misérias mais íntimas, a partir de sua relação com o mundo, onde a vida e a reflexão sobre ela estão refletidas no enigma do espelho da alma do homem, na sua relação com o outro, e no grande mistério que é a vida.

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

GOTLIB, Nádia B. Clarice, uma vida que se conta.Ed. Ática.SP,1995.

LISPECTOR, Clarice. A hora da estrela. Ed. Ática. SP.21ªed.1982.

Lislopes
Enviado por Lislopes em 12/08/2007
Código do texto: T604046