etimologia da língua portuguesa nº85

Etimologia da Língua Portuguesa por Deonísio da Silva Nº85

Religião veio do latim religione, culto prestado aos deuses. O radical pode ser do verbo religere, escolher de novo. Ou religare, religar. Já, sobrenome, que identifica as pessoas nos documentos, formou-se de sobre, do latim super, acima, sobre, e de nomen, nome.

Labrego: do espanhol labriego, lavrador rude, radicado no latim por meio do verbo laborare, trabalhador, e dos substantivos labor, trabalho, e labrusca, videira brava. Por preconceito contra o homem do campo, é usado como ofensa, à semelhança de vilão, que na origem designava o habitante da vila. Designa ainda certo tipo de arado, munido de um varredouro entre as peças que sustentam a relha, com o fim de retirar as raízes que se levantam entre leivas.

Neolatino: do grego néos, novo, que depois do Renascimento (século XV e XVI) passa a designar origem ou retorno de doutrinas, movimento, partidos, e latinus, latino, habitantes do Láscio. Nessa região da Itália central nasceu o latim, língua-mãe do português, do italiano, do francês do espanhol. O prefixo “neo” está presente em palavras como neonazismo e neófito; às vezes há necessidade de hífen, como neo-africanos. A mais antiga das línguas neolatinas parece ser o italiano. O ano de 1960 foi marcado por celebrações, na Itália do milênio da língua, com base num documento de 960 em que aparecem o latim e o italiano.italiano Relaciona-se a um terreno pertencente ao Mosteiro de Monte Cassino, escrito em latim. Mas os depoimentos das testemunhas aparecem num nascente: “ São ke kelle terre, per kelle fini que ki contene, trenta anni ke possette parte Sancto Benedicti.” No italiano atual, a testemunha falaria assim: “ So che quelle terre per quei confini descritti in questo trent’anni furono possedute dai Santi Benedettini .” Nas duas formas, o significado é o mesmo: “ Só sei que essas terras nesses limites descritos neste mapa pertenceram por trinta anos aos santos beneditinos.” Os padres eram chamados santos, como aqui no período colonial. Já o português se estruturou como língua autônoma entre os fins do século XI e começo do XIII. O mais antigo documento também é ligado a um mosteiro, o de Vairão, e trata da partilha de uma propriedade. O português é falado por cerca de 250 milhões de pessoas, que vivem em oito países de quatro continentes. É a sétima língua mais falada no mundo. As primeiras são chinês, árabe, inglês, russo hindi e espanhol.

Religião: do latim religione, culto prestado aos deuses. Existem duas etimologias controversas. O radical pode ser tanto o verbo religere, escolher de novo, quanto religare, religar, passando a idéia de ser recuperados. As religiões cristãs são dominantes no Brasil, a começar pelo catolicismo, mas vêm aumentando muito as igrejas evangélicas. Das afro-brasileiras, o candomblé tem larga penetração no país. Seus cultos apresentam deuses cheios de mistérios. Contato culturais com índios e brancos modificaram essa religião, de forte presença mágica. Praticam-se no candomblé várias formas de feitiçaria, que têm a finalidade de esconjurar os males ou atraí-los para os inimigos. Tais espinafrações são inofensivas. Os ataques são simbólicos, vez que os desafetos estão representados por bonecos de vários materiais.

Sobrenome: de sobre , do latim superior, acima, sobre, e nomen, nome. O nome facilita o convívio na vida cotidiana, mas é sobrenome que identifica a pessoa nos documentos. Sem contar que apelidos ausentes nos documentos, como Nhonhô, Nho, Sio, Siozinho, sínteses de uso vasto e complexo nas ancestralidades nacionais, revelam intimidade impossível de ser registrada. Até presidentes foram conhecidos por prenomes, não por sobrenomes, e às vezes por apelidos, como JK e Jango. Repleta de sutis complexidades é também a questão do “Silva”, sobrenome do atual presidente, Luiz Inácio Lula da Silva. Ayrton Senna da Silva (1960-1994) extirpou o último sobrenome, mesmo depois de, sempre vitorioso em Silverstone, ter levado os jornalistas a mudarem, por brincadeira, a denominação do circuito inglês, para “Silvastone”. É ainda mais controverso atribuir fumos imanentes de pobreza ao sobrenome “Silva”. Alberto Dines, em sua obra Os Vínculos do Fogo, sobre Antônio José da Silva (1705-1739), o Judeu, referência indispensável ao autor estudado, deixa claro que o Silva designa outro estado, conceito de resto presente em expressões já cristalizadas na própria língua portuguesa, de são exemplos “vivinho da silva” e “doidinho da silva”. Nesses casos, o adjetivo vem do diminutivo, antecedendo e reforçando a ênfase. Silva é marca de legitimidade não de pobreza. O presidente Lula nunca trouxe a marca indelével da pobreza no sobrenome. Era pobre quando migrou do rural para o urbano, hoje não é mais. Seu trabalho também mudou. Ascendeu socialmente e passou à política, atividade em que sempre foi mais bem renumerado do que nos tempos em que era metalúrgico. O apelido (Lula) e o sobrenome (Silva) não são indicadores de desfavorecimento socioeconômico, como alguns ensaístas escreveram na imprensa.

O escritor Deonísio da Silva é doutor em Letras pela Universidade de São Paulo, diretor do Instituto da Palavra, da Universidade Estácio de Sá (RJ). Autor de A Vida Íntima das Frases (Ed. A Girafa) e Os Guerreiros do Campo (Mandarim), entre outros 28 livros. E-mail: deonisio@terra.com.br

Revista Caras

2004

Doutor Deonísio da Silva
Enviado por zelia prímola em 04/07/2017
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