Busquem a verdade

Que é a verdade, quis saber Pilatos. Recentemente, li duas pessoas de tradições religiosas bem distintas, para não dizer opostas, defendendo uma busca implacável pela verdade. Essa defesa, naturalmente, só acontece porque ambas as tradições, embora tão diversas, acreditam que sairão fortalecidas do processo de investigação da verdade. Nem por um momento elas cogitam que a verdade contradiga ou até mesmo anule o sistema de crenças que escolheram para si.

A verdade que é buscada por sistemas de crenças já prontos e definidos tem sempre um limite que não pode ser ultrapassado, sob pena de inutilizá-los. Ou já tivemos notícia de uma igreja que, ao inquirir sobre a verdade, chegou à conclusão de que o melhor seria abandonar as suas velhas crenças e fechar as portas? Se a verdade não pode chegar a esse ponto, não é de se estranhar que, aqui e ali, sejam feitas adequações, tentativas de tornar a verdade mais aceitável dentro do sistema de crença que já possuímos.

Mas isso não pode ser o resultado de uma busca que se pretende “implacável” pela verdade. Uma busca como essa exige independência de pensamento. Não se pode estar preocupado em agradar ou em não ferir um grupo ou uma instituição de que fazemos parte. A verdade precisa ser tal que, se for o caso, faça o castelo do que tínhamos como sagrado virar pó. Ela só pode ser encontrada quando livre e sem restrições ou constrangimentos de qualquer tipo.

Quem procura a verdade deve ter em mente o risco de ficar sem as verdades antigas ou até sem nenhuma verdade. Só assim adjetivos como “implacável” farão sentido. Mas quem está disposto a semelhante entrega? O que preferimos são pedaços da verdade que possam confirmar aquilo em que já acreditamos. Aí tomaremos o que claramente é parcial pelo todo e estufaremos o peito e diremos aos outros: “Busquem a verdade!”.

Frederico Milkau
Enviado por Frederico Milkau em 15/02/2018
Código do texto: T6254829
Classificação de conteúdo: seguro