Livre Arbítrio

O filósofo Michel Onfray comenta que há duas linhas de pensamento em filosofia: uma em que as idéias são tudo, o conceito é formidável, e o corpo detestável. Seguiriam essa linha Pitágoras, Platão, o Cristianismo, Kant, Freud. Outra linha que afirma só haver seres materiais, que inclui, entre outros pensadores monistas Demócrito, Espinoza, Nietzsche e Marx. A partir daí o filósofo trata da noção de libre arbítrio, resumindo que, na concepção cristã, se o homem é consciente e livre então ele é responsável de seus atos, e, se os atos são previstos como crime na lei, ele é culpado, e punível. Para Santo Agostinho, foi deixado ao homem inteira liberdade de escolha. Evodius, o correspondente de Santo Agostinho, indaga se Deus deveria ter dado o livre arbítrio ao homem, uma vez que assim ele nos deu a habilidade de pecar. Daí até se poderia concluir que o livre arbítrio é uma forma de imputar ao homem a responsabilidade pelo mal no mundo, e, ao mesmo tempo, retirar de seu Criador, Deus, essa mesma responsabilidade. Segundo Onfray, essa é a concepção que prevalece hoje na nossa sociedade, nos tribunais; concepção seja cristã ou kantiana (vontade e dever), em que a culpabilidade pressupõe a escolha consciente em toda independência de fazer o mal, em lugar de fazer o bem. Sartre diz que o homem é livre para fazer as escolhas que irão compor sua “essência” e que é sempre responsável pelo que faz, até diante da humanidade. Por exemplo, se alguém decide se casar está fortalecendo a instituição do casamento. A pessoa é que decide, e Sartre não tolera desculpas – como o determinismo, paixão extrema ou outras - para justificar as escolhas que o homem faz, se elas forem equivocadas. Nem o meio onde a pessoa vive, ou a paixão à qual não pode resistir servem, segundo ele, para liberar o homem da responsabilidade pelas suas escolhas. Recorrer a essas desculpas seria não assumir sua ações, o que Sartre chamaria de má fé, enganar a si mesmo, fazer o papel do que não é, ser inautêntico. No lado oposto, a corrente determinista, para Onfray, anuncia que o adolescente que rouba, ou faz tráfico de drogas, e que vem de um meio onde convive com a miséria, com pais muitas vezes desajustados, que não se concentram na educação dos filhos, é determinado e não deve ser inteiramente considerado responsável pelos seus atos. A questão que aqui se coloca é saber se realmente somos inteirament livres e responsáveis de nossas ações. Nessa linha, alguns defendem que o livre arbítrio é uma ilusão, e que segundos antes de uma pessoa tomar qualquer decisão o seu subconsciente já decidiu por ela. Seria este argumento em apoio à corrente determinista ? O que acontece com o crminoso que já fêz 18 anos ? Seu passado teria influenciado suas ações e criado motivo para alegar circunstâncias atenuantes ? Na nossa sociedade não. Suponho que essa é tese que Sartre considera inaceitável. Sartre discordaria da absolvição do Cangaceiro Severino, no Auto da Compadecida, o único absolvido no julgamento divino e que foi direto para o céu, com base na justificativa de que quando criança assistiu seus pais serem mortos pela Polícia e, portanto, não podia, depois de adulto, deixar de nutrir um sentimento hostil contra os valores da sociedade.

Ugly
Enviado por Ugly em 23/03/2018
Reeditado em 20/09/2023
Código do texto: T6288453
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