O "Rivotril Man"

Desde adolescente sempre teve problemas em enfrentar grandes grupos de pessoas. Sua preferência sempre foi o engajamento a dois, ele e mais uma pessoa, homem, mulher ou criança. Sempre detestou ser o centro das atenções. Uma fobia de platéia! De onde podia vir essa fobia nunca entendeu, muito provavelmente de experiências na infância que deixaram marca duradoura. Mas como poderia saber ? Uma psicanálise ? Não ! Muito caro, só para ricos. Nunca estudou psicologia, nunca leu Freud. De qualquer forma era preciso viver. O encontro com grande número de pessoas é inevitável. Começou na sala de aula onde o professor pode fazer uma pergunta e tinha que responder em frente de todos. Medo do ridículo ? Mais tarde, tinha de frequentar festas de aniversário, reuniões na empresa, participar em seminários. E a fobia abraçada a ele. A vida foi ficando impossível, uma angústia quando alguém lhe pedia para falar alguma coisa e todos os olhos em silêncio se voltavam para ele na expectativa do que iria dizer. Um pesadelo. Durante qualquer evento social sua angústia ia aumentando e atingia um climax a medida que a reunião se aproximava do fim. Pensava consigo mesmo. Falta pouco. Mais dez minutos. E por que esse aí não para de falar ? A angústia era tamanha que a vontade de fugir do recinto era cada quase irresistível. Quando caminhava para o pódio para fazer uma saudação ou um discurso era como se caminhasse em direção da guilhotina montada durante o fase do Terror da Revolução Francesa, onde iria perder a cabeça. Foi quando descobriu o Rivotril. Ou um médico descobriu para ele. Uma pílula que acabava com sua angústia, e o deixava absolutamente á vontade, quase indiferente à realidade em torno de si, ao que as pessoas pudessem achar dele. Passou a falar com todas as platéias, até demais, muitas vezes dizendo coisas que não devia. Mas um dia o evento em que iria participar atrasou. Ia começar pela manhã, mas foi adiado para a tarde e depois para a noite. O efeito do Rivotril foi terminando. De repente, viu-se dominado pelo velho Pânico, suando frio, com as mãos úmidas. Não estava mais acostumado a enfrentar as pessoas e saiu correndo do recinto. Como Cinderela que teve de sair do baile à meia noite porque a mágica do seu vestido iria se desfazer aos olhos de todos.

Ugly
Enviado por Ugly em 15/05/2018
Reeditado em 04/09/2022
Código do texto: T6337144
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