Estudo da Etimologia da Língua Portuguesa Nº 158

Etimologia da Língua Portuguesa por Deonísio da Silva Nº158.

A civilização ocidental foi marcada pelo monoteísmo, substantivo formado dos compostos do Grego monos, um só, e theós, deus. Os povos antigos, ao contrário, eram politeístas, termo originário dos compostos Gregos polýs, muitos, e theós, deus, muitos deuses.

Caluniar: do Latim calumniare, levantar calumnia, falso testemunho, fraude, engano: Atribui-se a Joseph Goebbels (1897-1945), ministro da Cultura Popular e da Propaganda do ditador alemão Adolfo Hitler (1889-1945), a recomendação “Caluniai, caluniai, alguma coisa restará”, aceita e praticada por muitas ideologias e partidos políticos. Mas ela data de antes de Cristo, pois Médio, conselheiro do rei da Macedônia Alexandre Magno (356-323 a. C.), ensinava ao comandante caluniar seus inimigos porque, “mesmo que a vítima cure a ferida fica a cicatriz”. Há trechos clássicos sobre calúnia em obras literárias como O Barbeiro de Sevilha, do teatrólogo francês Pierre Augustin Caron Beaurmarchais (1732-1799), na cena em que dom Basílio, professor de música de Rosina, proclama seu método, segundo ele, infalível, para descredenciar o conde: “Espalhar mentiras a seu respeito”. Nenhum texto, porém, é mais radical com a calúnia do que o dito do Talmude: “O caluniador arruína três pessoas: a si mesmo, o ouvinte e o caluniado”.

Monoteísmo: do Grego monos, um só, e Theós, deus, sistema de crença baseados em deus único, exclusivo. O orientalista alemão Max Muller (1823-1900) encontrou também henoteísmo, praticado por sociedades antigas que adoravam um deus apenas, mas sem excluir o convívio com outros deuses. O monoteísmo judaico baseia-se em um erro proposital de tradução, segundo a professora inglesa Francesca Stavrakopoulou, que se define como “ateia com enorme respeito pela religião”, acrescentando que seu trabalho é “um ramo da história como qualquer outro”.

Nome: do Latim nomen, aplicado para designar pessoa (também animal, coisa, divindade etc), tendo ainda o significado de conceito que dela se faz. Assim, a honra do nome é usada na vida comercial e financeira moderna para pressionar o devedor, como na expressão “nome sujo na praça”, “pague as dívidas e limpe seu nome”, jamais dirigida a um político que nada deve a ninguém, justamente por muito roubar de todos. Um dos primeiros registros do nome como fama positiva remonta ao escritor latino Lucano (39-65), quando Pompeu (106-48 a.C.) diz que vai enfrentar a audácia de César (101-44 a. C.)na guerra civil porque se parece com um velho carvalho, que já não se apoia em raízes sólidas, como seu oponente mas vive nas asas da fama conquistada. Nascia aí a expressão “à sombra de um grande nome”. Conhecer alguém de nome, dar nome aos bois, nome de guerra e nome de família são outras locuções nas quais aparece nome em conceitos diferenciados.

Oftalmologia: do Grego ophtalmós, olho ou objeto de formato parecido. Esse étimo está presente também em várias designações, principalmente da Medicina, de que são exemplos oftalgia ou oftalmalgia, dor no globo ocular, oftamia, inflamação do olho, e oftalmoplastia, cirurgia estética ou plástica do olho.

Politeísmo: dos compostos do Grego polýs, muitos, e theós, deus, muitos deuses. Nenhum povo antigo foi monoteísta, daí a presença de panteões em Roma e na Grécia antigas, que fizeram tantas conquistas. Pesquisas recentes dão conta da presença de deuses cultuados pelos hebreus, tido como o único povo monoteísta da História.

Razão: do Latim ratione, declinação de ratio ( diz-se “rácio”) , faculdade de avaliar, ponderar, julgar, de étimo vinculado ao particípio passado ratus, calculado, contado, que resultou em ratear, dividir, alastrando-se também por palavras como ração, porção, proporção, racionar, mas que nos sentidos mais usuais designa motivo, causa, argumento e a faculdade que distingue os animais do homem porque este pensa, tem a luz da razão, em outros contextos oposta à fé. A palavra está presente em expressões como “coberto de razão” e “carradas de razão”, pois, antes de ser comparada a muitos pedaços de lenha postos num carro, como metáfora de argumentos em quantidade, designou antiga medida de líquidos, a canada semelhante a pequeno barril. Canada era channa no antigo Germânico, que virou kanna no Alemão, canna no Latim culto, cannata no Latim vulgar, cañada em Espanhol e canada em Português.

Deonísio da Silva, da Academia Brasileira de Filologia, é escritor, doutor em Letras pela USP, professor (aposentado) da UFSCar (SP), autor contratado pela Estácio (RJ), vice-diretor da Editora da Unisul (SC) e colunista da Bandnews, com Ricardo Boechat e Pollyanna Bretas. Alguns de seus romances e contos foram publicados também em Portugal, Cuba, Itália, México, Alemanha, Suécia etc., e é autor de De Onde Vêm as Palavras (17ª edição). www.lexikon.com.br

Revista Caras

2014

Doutor Deonísio da Silva
Enviado por zelia prímola em 02/12/2018
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