O Jogo
Enquanto conversava com outro Gibran, comecei a refletir sobre o jogo.
O jogo do flerte é um jogo complexo. Turvo e imundo.
O jogador precisa gostar da aleatoriedade.
Do cinismo.
Do abismo.
Do blefe e do risco.
Nesse jogo não há ganhadores. Pelo menos efetivamente.
O vencedor sempre perde. O perdedor também. E o empate sufoca.
Mas mesmo assim, os bons jogadores gostam da roleta.
O jogo não permite você dizer que gosta.
Para jogar é preciso frieza.
É como a charada do silêncio: “Se disser meu nome, não sou mais”.
Fale que quer. Fale que gosta.
Ganhe a derrota.
No jogo, os dois querem.
E os dois gostam.
Mas se falarem, perdem a aposta.
É o jogo do blefe.
O poker, o truco do flerte.
É o jogo das máscaras. Quem deixar ela cair, sai da sala.
E entra na fila na miséria. Sem o auxílio ou caridade do vencedor. Pretenso vencedor.
Fale o que quer e beba do amargor. Permaneça na solidão.
Espiritual e mental, de ser um mau jogador.
A regra do jogo não se aplica para os relacionamentos sólidos. Neles, o alimento do triunfo é a estabilidade. E o falar.
Isso, os jogadores não apreciam. Se entediam.
Jogador não gosta de estabilidade. Gosta do risco e dos seus venenos.
Gosta das vitórias, que são derrotas de longo prazo.
Mas essa é a regra do jogo. A banca sempre ganha.
E quem se importa com o longo prazo?
A jogada é agora.
E o baralho está sempre armado.
Jogue com atenção. Para vencer.
Ou caia na tentação. E fale o que quer.
Desmanche o silêncio. Caia no blefe.
E derreta no abismo que você mesmo cavou, mau jogador.
O bom jogador se fragiliza quando está com um oponente que também compreende a boa forma de rolar as peças.
Nessas situações os dados são viciados. E sempre um perde muito. Ou os dois.
Na liga de elite os sentimentos são pó. Petrificados e atrofiados pela sede de vitória.
Vitória que, como o silêncio, vira derrota quando se comemora.
Some e desaparece.
Nesse jogo que é um perpétuo motor de amargura e sofrimento.
Daqueles que escolhem fugir da estabilidade de um relacionamento.