Pai Biá II

Ancestralidade e Tradição

...Por algumas vezes fui às festas do pai Biá. Eram momentos fortes de muita diversão, bem característico daquela gente alegre, solta, espontânea, solidaria disposta a acolher a todos sem distinção. De longe avistávamos, lá em cima, o grande mastro erguido por muitas mãos com as bandeiras dos santos preferidos, cachos de banana verde, coco amarelado por alguns dias de sol daquele verão junino e, como se não bastassem, outros objetos de valores para aqueles que durante a festa conseguissem escalar o mastro ensebado. Aquele folguedo era ancestral, conhecido por todos e divulgado com antecedência na redondeza. O local atraia gente de todas as comunidades tanto para dançar como provar das comidas ainda carregadas dos sabores afro-brasileiros. Colodino, Tobias e Genoura, sempre simpáticos e solícitos faziam de tudo para deixar meu pai à vontade quando ali chegava. No geral todos ali gostavam do meu velho Simião. Quando passavam lá em casa rumos ao centro do Aguiar, faziam questão de saudar a todos, dirigindo-se com mais afeição e afeto ao papai com quem mantinha longa conversa. A nega Genoura era uma pessoa de espirito contagiante, disponível, proativa e tinha uma energia de gigante, sem contar sua característica mais importante, a alegria. Estava sempre sorrindo. Lembro seus grandes dentes brancos naquele rosto negro numa sincronia que a deixava bela e elegante. Fazia questão que estivéssemos nas festas prestigiando o velho Biá, seu progenitor. Quem ali chegava era bem acolhido e não saia sem antes tomar um café e ter ouvido uma boa prosa. Aos senhores brancos como meu pai, pai Biá cumprimentava sempre de compadre e deste guardava tratamento respeitoso. Após a morte da minha mãe, fomos embora pra Lagoa do Encontro, bem distante e nunca mais visitei as terras do pai Biá. Soube duas décadas depois que os filhos venderam a propriedade e foram pra cidade mais próxima, Bacabal. Os novos proprietários transformaram aquela antiga aldeia de negros em pastagens para gado.

Milton Branco

Milton Nascimento
Enviado por Milton Nascimento em 10/09/2020
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