O tamanho do ócio

Esvaziar-se das responsabilidades é um mister que o são não enxergará como pertinente discutir. Há que se atentar, entretanto, à importância de, mesmo em se tratando de espairecimento, ocupar o sábio a sua mentalidade dignamente. O dito popular "cabeça vazia oficina do diabo" é elevado. E deve, pois, ser alcançado.

O ser humano, como já trabalhei em texto anterior, não pode permitir que o gozo sobrepuje o trabalho à sua vida, sob pena de tornar vulgar o que a existência ostenta de mais transcendente. Permitindo-o, cairá o indivíduo em estado de permanência, contrário ao espírito humano, e, por tão desesperadamente buscar felicidade, acabará um suicida em potencial. Morto desde então, contudo, de infelicidade.

Ao adentrar em profundo estágio de ócio (já aquele de desprendimento do descanso do trabalho), inclina-se o ser humano a uma instância de estagnação que a nada o levará, nem à felicidade e nem à produção. Produção útil. A produção útil não existirá. A produção inútil, por sua vez, será a regra ao ocioso. Esta fede, infestando o produtor e os que vivem à sua volta. O ocioso, embora massacrado pela inação, busca formas de nela permanecer e, como esta é irmã do ganho fácil, o qual é amigo íntimo da torpeza, nesta encontrará morada - senão a priori, a posteriori.

Poucas coisas podem existir de pior do que a ociosidade, que representa um animal, alimentado voluntariamente, o qual, ao invés de proporcionar-nos qualquer dosagem de lucratividade e/ou afetividade, presenteia-nos com excrementos da pior sorte concebível, os quais nos conduzem à doença. Doença muita vez incurável e que, se assim for, rápida e diretamente, encaminha-nos à morte.

Por encontrar-se tão adoecido, oferta o ocioso um papo superficial, cheio de apego à superficialidade e que, conseguintemente, inclina os demais à superficialidade. Como sem percuciência, e sem perspectivas à consecução desta, morto estará o ser humano (morto!), deve-se buscar distância do improdutivo. Outrossim pelo fato de este transbordar uma incitação à impudicícia, casa-mãe por ele freqüentada e, quando não lograr o seu objetivo, chegar próximo, uma vez que, em regra, é mais fácil conquistar apego à mediocridade do que à sabedoria. À luta diuturnamente travada pela favorabilidade à sabedoria, em detrimento da mediocridade, deve-se ter como passo inicial extirpar o estéril das redondezas. A contrario sensu, deve-se tornar-se íntimo dos dignificados pela ação.

Há de ser feliz o homem que entende que o trabalho é a mais perfeita forma de felicidade. É por meio dele que se pode esperar todas as outras coisas. Quando se acomoda em torno daquilo que se possue, não conseguindo mais se empenhar em prol de anseios mais elevados, e por mera mandriice, chega o ser ao patamar mais sufocante da existência, que é o estado de permanência.

Trabalhar o dia inteiro é a mais saudável das feituras. Não se deve criticar quem trabalha muito. Deve-se voltar olhares de fuzilamento aos que não trabalham ou o fazem pouco. O trabalho que não se dá em grande quantidade é muito amigo do ócio, se este já não configurar. Os finais de semana só podem ser verdadeiramente felizes aos que trabalharam árduo no transcurso da semana. Os que tiveram uma semana leniente terão risos pobres, engenhosamente enganadores, aos finais de semana. E este engano é o da pior estirpe: é o auto-engano.

Com o trabalho em grau exacerbado, ofuscará o ser humano praticamente todos os seus defeitos – senão todos. Com a ociosidade, todavia, não precisará de mais nenhum outro defeito para poder ser equiparado a excremento. E, permitindo que venha à tona mais alguns defeitos, há de vir a ser coisa pior: excremento em grande quantidade; uma fossa mais do que imunda ou coisa que o valha. Avistando um princípio de ociosidade, mate-o.

Marconi Lustosa
Enviado por Marconi Lustosa em 10/11/2007
Reeditado em 17/02/2008
Código do texto: T731006
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