Thoreau, democracia e preferências individuais

A prisão de Thoreau por desobedecer a máquina (leia-se Estado), devido ao não pagamento de impostos, narrado em seu ensaio "A Desobediência civil" de 1849, foi motivada pelo que ele acreditava ser o certo. Se o dinheiro pago ao Estado era usado para financiar a tomada das terras do México, bem como a morte de seus conterrâneos, ele não concordava em fazê-lo e não o fez; por isso passou um dia na prisão.

Depois de desvincular-se de toda organização, decidiu fazer uma experiência, a de viver sem depender do Estado pra nada (alô quem assistiu Capitão Fantástico!), desde a construção da casa, os móveis, alimentação e todo o resto, por cerca de dois anos; junto ao lago Walden. Assunto pra outro post.

Por ora quero propor reflexão a uma analogia entre as motivações de Thoreau e o SUS. Ou qualquer coisa que seja feita com dinheiro público e que não é decidido pelo que é "certo", mas pelo que a maioria quer (eu incluiria aqui os gastos com copa do mundo de futebol, por exemplo). Aqui o conceito de certo visa aspectos que priorizem o bem de todos.

Lembrei de uma influenciadora digital mostrando um gordofóbico falando que ela pode até ser livre e se amar, mas não é livre do colesterol e triglicérides. Creio que a obesidade é multifatorial, e se a pessoa for obesa com o colesterol ruim e não se importar com isso, ela tá no direito dela, certo? Como no caso de um fumante, que não tá nem aí pras consequências e prefere morrer fumando.

Acho que não aos olhos de Thoreau, ele diria "eu não vou pagar plano de saúde pra quem não se cuida".

A atitude dele não fez nem cócegas no impedimento da distribuição dos recursos, tampouco para impedir a tomada das terras mexicanas. Nem sequer influenciou o meio onde vivia, afinal, ele não era um Gandhi da vida. Ou seja, o que Thoreau buscava, o certo, vinha da essência dele, e por mais que ele quisesse irradiar isso não bastaria para mudar quem as pessoas eram e no que elas acreditavam, assim como ele não se deixou influenciar pelo lado "negativo" da história. Ele fez o que lhe cabia, fez o seu protesto, o que estava ao seu alcance, isso sim é um grande exemplo, e exemplos nunca morrem, assim como as ideias.

Na democracia sempre vai prevalecer a maioria, seja como ela for. E nem sempre os representantes eleitos farão valer aquilo que foi inicialmente proposto. Aí entra o espírito Thoreau de ação, onde devemos decidir o que é melhor para o maior número de seres (para além daquilo que diz respeito ao nosso bel-prazer), fazer nosso protesto da forma como nos couber, e defender nossa essência até o fim.

"As coisas não mudam; nós é que mudamos. · Para cada mil homens dedicados a cortar as folhas do mal, há apenas um atacando as raízes." - Henry David Thoreau

Carla Flores
Enviado por Carla Flores em 17/09/2022
Código do texto: T7607775
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