O CONTO DA CRIAÇÃO

O UNIVERSO É UM EDIFÍCIO QUE ESTÁ SENDO CONSTRUÍDO DIA A DIA PELAS NOSSAS AÇÕES.

 

O arquiteto e os pedreiros

 

                                                                    

 

O universo não saiu da Mente Divina como um produto pronto e acabado. Ele está sendo construído diariamente pelas nossas mãos. Deus é o Grande Arquiteto do Universo e Ele o projetou na forma de uma obra que pudesse ser erguida de maneira perene e ordenada, com a matéria prima que sai da sua Essência, que é a Luz emanada da sua inesgotável Energia.

Nós somos os pedreiros dessa obra. Aqui estamos para erguê-la, segundo as disposições que Ele dispôs. Mas ele não nos colocou nessa obra somente para cumprir ordens. Ao contrário. Ele nos deu liberdade de trabalho e de escolha para fazer o edifício segundo nossas necessidades e desejos. Por isso Ele colocou em nós uma centelha de Luz, para que ela fosse uma espécie de receptora da sua Energia, da sua Luz, e com ela pudéssemos executar o nosso trabalho de construtores. Essa centelha é a nossa Alma.

Por isso, o codificador da Cabala, o mestre Shimon Bar Yochai diz: “Já não é tempo de temer o Senhor, mas de amá-lo”. Quer dizer: Ele não nos quer como lacaios ou bonecos manipulados como marionetes, ou como escravos de uma obra que Ele projetou para ser construída e nos colocou nela como operários sem consciência do que estão fazendo. Ao contrário, somos parceiros da Criação. Por isso a Cabala significa receber. Receber a Luz do Criador através do receptor que é a nossa Alma. E a plenitude do ser humano acontece quando recebemos em abundância essa Luz e, principalmente, a irradiamos pelo mundo. Por isso todas as doutrinas esotéricas falam em “iluminação”. E as religiões oficiais também. Iluminação nada mais é do que recepcionar, através das nossas Almas, a Luz do Criador.

Esse é o significado oculto atrás da metáfora que diz que Deus é o Grande Arquiteto do Universo e nós somos os seus pedreiros. Porque o mundo é construído pela matéria prima luminosa emitida pelo Criador em forma de Luz. E nós, através das nossas almas temos que recepciona-la e retransmiti-la ao mundo através das nossas obras. Nisso consiste o processo de construção universal.

 

Como tudo começou

 

Todos nós sabemos que a massa universal, ou seja, todas as coisas que existem no espaço cósmico são feitas de Luz. A Luz é o veículo que carrega a Energia do Criador. Por isso, a Bíblia diz: “No princípio, ao criar Deus os céus e a terra, a terra era sem forma e vazia, e havia escuridão sobre a face do abismo, e o Espírito de Deus pairava sobre a face das águas. E Deus disse: haja

Luz”, e houve Luz. E Deus viu que a Luz era boa, e Deus separou entre a Luz e a escuridão.[1]

 

                                                                            

 

A moderna ciência física e astrológica diz que o universo teve início com a explosão de uma estrela, ocorrida cerca de quinze bilhões de anos atrás. Essa explosão ainda pode ser vista nos modernos telescópios dos laboratórios de pesquisas astronáuticas. As pesquisas mostram ainda que o universo começou como se fosse uma pequena bolha de gás que foi se inflando, inflando, e ainda está em expansão. É como uma bexiga cheia de pontinhos luminosos - as estrelas e os planetas- que estão se afastando uns dos outros à uma velocidade infinita, igual à da Luz. Quem diz isso é um dos mais famosos cientistas dos tempos modernos. “Há cerca de 15 bilhões de anos todas (as galáxias) teriam estado umas sobre as outras, e a densidade teria sido enorme. Esse estado foi denominado átomo primordial pelo sacerdote católico Georges Lemaiter, o primeiro a investigar a origem do universo que agora chamamos de Big-Bang.[2]

Os cientistas chamam esse início do universo, a partir da explosão da estrela, de Big Bang. Eles dizem que essa explosão lançou no vazio cósmico bilhões e bilhões de centelhas de energia luminosa, que no início eram como gases, que depois foram se condensando, se combinando, até dar como resultado a massa física do universo, e dentro dele, a vida. E no complexo da vida, o fenômeno humano.

Por isso é que ele diz também que: “se a relatividade geral estivesse certa, o universo teria começado com temperatura e densidades infinitas na singularidade do Big-Bang. Á medida que o universo se expandiu, a temperatura da radiação diminuiu. Em cerca de um centésimo de segundo após o Big-Bang, a temperatura teria sido de 100 bilhões de graus, e o universo teria contido, na maior parte, fótons, elétrons e neutrinos (partículas extremamente leves\) e suas antipartículas, além de alguns prótons e nêutrons. Nos três minutos seguintes, enquanto o universo resfriava para cerca de um bilhão de graus, prótons e nêutrons, não tendo mais energia suficiente para escapar da atração da força nuclear forte, teriam começado a se combinar para produzir os núcleos do hélio e outros elementos leves. Milhares de anos depois, quando a temperatura caiu para alguns milhares de graus, os elétrons diminuíram de velocidade até os núcleos leves poderem capturá-los para formar os átomos. No entanto, os elementos mais pesados dos quais somos constituídos, como carbono e oxigênio, só se formaram bilhões de anos mais tarde, pela queima de hélio no centro das estrelas”. [1] Esse teria sido, portanto, o processo pelo qual o universo nasceu e cresceu, até onde podemos vê-lo.

 

Ain, Ain Soph, Ain Soph Aur

 

Em hebraico a palavra Luz se escreve Aur. A doutrina da Cabala nos ensina que antes do Big Bang não havia tempo nem espaço. O que havia então? Energia, dizem os mestres cabalistas. Quer dizer: Deus era Energia latente. Por isso se diz que Ele estava em todo lugar e em lugar algum. Ele era tudo que existia, por isso estava em todo lugar; mas como não havia espaço físico ainda, então se diz que Ele não estava em lugar nenhum. Ele era Ain, o Onipotente, o Inominado, o Imanifesto.

Mas Energia que não circula não tem sentido. Então Deus quis fazer sua Energia circular. Esse desejo de Deus é o que a Cabalá chama de Desejo de Compartilhar. Então Ele se tornou Ain Soph, a Infinidade, que se traduz pelo vazio cósmico.

Mas como fazer isso se não se tem com o que, nem ninguém para compartilhar. Então Ele criou um espaço vazio no qual pudesse fazer circular a sua Energia em forma de Luz. Nesse estágio Ele é chamado pela Cabala de Ain Soph Aur, a Luz sem limite.

Mas logo Deus percebeu que o espaço vazio, por sí só, não era suficiente para recepcionar a sua Energia e retransmiti-la, por que não havia nesse espaço quem a recebesse. E portanto, ela não circularia, não realizando, dessa forma, o seu Desejo de Compartilhar.

Foi assim que ele colocou sobre o espaço vazio uma camada de cortinas, chamada na Cabalá de Sefirot, para que a Luz que Ele lançara fosse obstruída e recuasse para dentro de um espaço diminuto de não mais que três centímetros de diâmetro. Esse recuo da Luz para dentro desse espaço diminuto é chamado pelos cabalistas de Tzim Tzum. Dentro desse espaço, por força da energia nele concentrada brilhou a estrela que os cabalistas chamam de Kether, a primeira coroa.

 

O tempo e o espaço            

 

 

É a essa estrela carregada de energia, onde a Luz Ilimitada do Criador se concentrou que o cientista Stephen Hawking se refere como o átomo primordial, ou singularidade do Big Bang. A Cabalá chama essa estrela de Sefirá Kether. Era tanta energia concentrada em um invólucro tão pequeno, que acabou explodindo. E ao explodir, como se fosse uma bomba atômica de infinitos megatons, a Luz se expandiu e criou o espaço e o tempo em que nós hoje vivemos.

 E mais que isso, com a criação do espaço e o tempo, nasceu também, dentro dele, um incomensurável Desejo de Receber. É esse Desejo do universo, de ser preenchido pela Luz do Criador que dá origem a todas as coisas que existem no mundo. Inclusive nós.

Esse é o conto cabalístico da Criação. Um conto onde Deus aparece como um personagem repleto de Amor e Desejo de compartilhar esse Amor. O seu Desejo de Compartilhar esse Amor é o único ato verdadeiramente criador que Ele fez. Depois disso, tudo é manifestação desse Desejo, que se realiza por conta da atuação da sua Energia no mundo real. Nesse sentido, todas as coisas que existem no universo são atributos de Deus na sua Vontade, no seu Desejo de Compartilhar.

Para entender melhor esse conceito podemos pensar na eletricidade, por exemplo. Eletricidade é um fenômeno da natureza resultante de energias em movimento na natureza. Ninguém sabe o que ela é exatamente. Apenas sabemos que ela precisa de dois polos para manifestar a sua existência e a sua força de atuação. Ela precisa de um polo positivo e um negativo. Nessa dualidade podemos entender o conceito cabalístico expresso do Desejo de Compartilhar e o Desejo de Receber. Em Deus, o Desejo de Compartilhar; na Criação o Desejo de Receber.

O cosmo, portanto, são os atributos de Deus em forma de massa física. Einstein também falou isso de uma outra forma. Ele disse que a massa do universo tem uma equivalência em forma de energia: E=mc², ou seja, energia é igual à massa, acelerada na velocidade da luz ao quadrado.

Nessa visão, podemos ver o universo como o útero onde Deus lança a sua Semente em forma de Luz. É nesse sentido que os antigos filósofos gnósticos falavam que Deus construiu o universo através da Panspermia, ou seja, do lançamento da sua Semente no útero cósmico. Falaremos disso no próximo capítulo.


[1] Biblia Hebraica, por David Gorodovits e Jairo Findlin- Editora Séfer 2015

[2] Stephen Hawking- O Universo em Uma Casca de Noz pg. 78.