A ÉTICA E A TECNOLOGIA

TEMA ACADÊMICO PROPOSTO:

Elabore um texto apontando como a ética pode evitar que a produção científica e a tecnologia dêem origem à invenção de artefatos, que, de algum modo, possam comprometer a existência da humanidade.

Primeiramente, cumpre-me o registro do quão é espinhosa a tarefa de sugerir caminhos que coíbam o espírito humano à produção científica e tecnológica para fins malévolos, servindo-se da ética como ferramenta.

Este será um modesto solilóquio em que um limitado aluno da FGV, que por um acidente de percurso, enveredou, outrora, pelo universo da Filosofia, buscará dar cabo de uma empreitada ousada, servindo-se de sua visão de mundo, contaminada pelos valores e idiossincrasias nada inéditos, mas que reivindica juízo suficiente para propalar opiniões enfáticas sobre a questão proposta.

Mister se faz compreender-se o significado da palavra ética, que vem do grego ethos. Dentre as vastas variações semânticas, coerente me parece aquela que a entende como “um campo de reflexões filosóficas que busca conhecer as relações entre os seres humanos e seu modo de ser e pensar, permitindo uma investigação geral sobre aquilo que é bom.”

Complexa e truncada essa conceituação se mostra numa leitura desatenta, mas uma rica compreensão confere ao que se atém à beleza lógica de uma verdade que encerra.

Esse mesmo modesto aluno investiga consigo, como a ética poderia, assim, inibir o livre-arbítrio de espíritos diferenciados, que dominam o pensamento, enveredando por caminhos superiores, guiados por uma imaginação revolucionária, sustentada pelo domínio de um conhecimento científico que inaugura técnicas capazes de amplificar o poder da interferência humana no seu habitat.

O grande problema é que durante a gênese desse processo de criação, o bem e o mal são sementes ainda não fecundadas. A mera submissão a um filtro ético, nesse momento, funcionaria como um natural inibidor da genialidade capaz dos prodígios da descoberta. Portanto, defendo o primeiro ponto:

É inconcebível e contraproducente limitar A CRIAÇÃO por conjecturas éticas e morais.

Caso assim o fizéssemos, estaríamos retrocedendo à incoerência e a estupidez por que se viu mergulhada a humanidade durante o “período das trevas.”

Criar é um processo que não se permite limitações de qualquer ordem. O novo é a manifestação de uma singularidade trajada de um ineditismo contundente que, para tanto, desvencilha-se de padrões conhecidos e se faz enxergar na sua totalidade como uma preciosa e eterna surpresa.

O segundo ponto que me permito a defesa consciente reside:

Criada a tecnologia, este sim é o momento em que o destino humano, ora impactado por ela, seja discutido, incorporado ou renegado, à luz de um senso de valia para a nossa raça e o seu meio.

Há que ser muito nobre e supra-humano nesse julgamento. Supra-humano (e para sê-lo é preciso uma sensível evolução) no sentido de raciocinarmos segundo princípios universais de benquerença irrestrita, negando a um egocentrismo que parece caracterizar a natureza humana, para assim transcender a um julgamento fidedigno ao bem da coletividade, libertos do fascínio representado pelos louros cativantes da vaidade.

Fácil?

Não disse que seria!

Difícil?

Certamente!

Impossível?

Também muitos assim afirmavam quando um dia o homem sonhou em voar em algo mais pesado que o ar...

Ocorre que estamos diante de um dos mais audaciosos desafios: de conferir à criação de uma obra que, para se materializar e se fazer vista, é necessário que, ao invés de um caráter individual, característico de uma genialidade intimista, única, singular, revele uma constituição distintiva que por si só, também se configura numa criação dentro de um processo maior. Falo da criação de uma filosofia absurdamente incontestável, de um estado único de sentir a realidade, onde a idéia de defesa à vida passasse a ser defendida como valor supremo, independente do que apregoa qualquer corrente de qualquer ordem. Também essa criação deve ser suficientemente convincente para fazer-se maior que seu status de conjectura.

E como fazer isso?

Inventar no espaço das ideologias, uma perspectiva em que as células axiológicas originárias da construção de verdades sejam reinventadas, em um nível de competência tal que se tornem maiores que as forças primitivas que sustentam convicções múltiplas, multifacetadas, que moldam caracteres diversificados os quais, por sua vez, conduzem a reações distintas, capazes de conduzir o homem a destinos errantes e ao encontro de sua destruição.

Fácil?

Não disse que é!

Difícil?

Certamente!

Impossível?

Também muitos assim afirmavam quando um dia o homem sonhou em ir à lua...

Esse modesto aluno da FGV que ora divaga, e que não faz a menor idéia dos sentimentos que se processam na mente do examinador que o avalia, assim se posiciona diante do caso proposto.

Creio que a Ética somente será ferramenta eficaz contra a destruição representada pela inadequação do emprego da ciência e da tecnologia, quando se revestir de uma força outorgada por uma idéia de certezas pacificadas pela irrefutável necessidade de defesa da vida enquanto ideal digno de luta constante em oposição à natureza egoísta do homem.

E mesmo sem saber se me é concedida a liberdade de exposição de um sentir particular, transcrevo abaixo um poema que traduz claramente a índole humana, a qual se constitui no maior desafio dentre todos: o de resgatar no homem o sentido de coletividade, que se contrapõem à toda sorte de individualismo que começou a ser moldado na solidão de um útero materno.

AUTOFAGIA

O homem faz o pão

O pão mata a fome

A fome mata o homem

O homem mata o homem

O homem faz o homem

O homem desfaz o homem

O homem cria o sonho

O homem destrói o sonho

O homem destrói o homem

O homem cria a arte

A arte recria o homem

O homem transcende a arte

O homem transcende o homem

O homem abandona a arte

O homem abandona o homem

MARCO ANTONIO BREGONCI

Publicado no Recanto das Letras em 10/09/2007

Código do texto: T647036

ALUNO: MARCO ANTONIO BREGONCI

TURMA: FGV XXX GE

MARCO ANTONIO BREGONCI
Enviado por MARCO ANTONIO BREGONCI em 20/12/2007
Reeditado em 20/12/2007
Código do texto: T785216