Diálogo

Agarro tudo que você me deu e não deixo que você leve. Pode sair. Você já está do lado de fora da porta e fica nessa história de que vira e olha e volta e vira e vai e volta e eu preciso trancar o cadeado. Você sabe que eu preciso. Sabe que a rua dos transviados é perigosa e que minha casa já foi assaltada três vezes no mínimo e que eu tô enrolando tudo numa metáfora horrorosa porque não quero fechar esse portão na sua cara porque não sei quando que você olha. Na verdade também não quero lhe entregar as coisas que você me deu, quero colocar tudo na minha sala da minha cabeça. Quero vestir a roupa que eu quis vestir quando você veio e eu achei que você me acharia bonito, porque eu me achei bonito. E pensar nas coisas que eu achei que você acharia bonito quando eu te falasse, porque eu achei bonito. Não quero deixar a porta destrancada. Não posso. Eu tava só pensando o que que era de você, aí do lado de fora. Aí pela rua, tá por aí, tá indo pra outra casa, olha as hora, não sei, se cuida... Tá feliz? (Eu não tô), Mas você tá bem? Eu espero. Olha pros dois lados. Cuidado na poha dos bares, cuidado na poha dos ubers, cuidado por aí, na rua dos transviados, se cuida. Não deixe de ir não, não deixa. Vou trancar a porta. Vou virar pra dentro da minha casa. Mais tarde eu saio na rua também.

-Qualquer coisa a gente se esbarra.

Juro, só preciso trancar esse cadeado, preciso sair da porta, preciso parar de ficar pensando que horas que krl que será que tu volta eu tô ridiculamente cansado.

- Boa noite...

Boa noite.

Nia Ferreira
Enviado por Nia Ferreira em 05/12/2023
Reeditado em 05/12/2023
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