Índia urbana

Tiro uma à uma as peças que cobrem meu corpo,

Atiro-as em um canto qualquer,

Preciso me desvencilhar destes obstáculos.

Abro o chuveiro, deixo a água correr por toda minha superfície.

Sinto um misto de relaxamento, limpeza e prazer.

Me identifico com a água, em meu sangue índigena há liberdade, destas que sómente as águas das corredeiras conhecem.

Se pudesse sairia nua do banho, percorreria as ruas correndo, quem sabe me brotassem asas?

Gostaria de poder voar, enfeitada para o amor, face pintada com urucum, pés descalços, roupas? Nenhuma.

Faria tudo se pudesse, se não fosse tornar escvândalo e escárnio, se não desse ibope.

Assim, despida de subterfúgios iria atrás do objeto que me fascina, do homem que me completa, do amor de minha vida.

Talvez o encontrasse solitário sentado em nossa pedra fictícia à beira do cais. Ou escrevendo sob uma árvore em jardins ermos, ou se banhando no mar de nossas poesias.

Hoje cometi meu maior crime, deixei que lesse não meus escritos, mas meu coração e nele viu teu nome em letras neon.

Temo a temeridade, o fim do sonho, o obstáculo do medo, minha perda de sanidade.

Amor, o que é o amor, além de prazer indecifrável e absoluto? Tão completo que não há de se ver defeitos.

Sou ser forte e infinitamente frágil, sou uma apoteose um tanto pragmática em meio a paradoxos que falam de sentimentos.

Mas, acima de tudo quero ser livre como a água que ocupa porções maiores que a terra firme.

Em meio à tudo e por tudo insisto ser a selvagem em solo de pavimentação asfáltica. Insisto em sonhar de compartilhar debruçada em teu colo os raios do sol e da lua.

Não importa nada, apenas minha incoerência e inconseqüência de ser tua índia urbana e de te amar assim, tendo como meu aliado Tupã.

Mary Rezende
Enviado por Mary Rezende em 07/03/2008
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