UM POUCO DE DGAR MORIN ( PARTE I )

maria helena sleutjes


Vive-se de morrer e morre-se de viver - é um pensamento de Heráclito adotado por Edgard Morin para explicar que uma sociedade auto produz-se pelo fato de se auto destruir sem cessar, o que é uma verdade inteira para o mundo contemporâneo.

Para quem não sabe, Edgard Morin, é filósofo, sociólogo, cientista, antropólogo e sobretudo, um grande pensador. Nasceu em 8 de julho de 1921 em Paris, e pode ser considerado um pensador poeta. Segundo Martinazo (2002)* sua obra se compõe de uma prosa sinfônica que arrebata, comove e convida a pensar, a sonhar e a querer. Todos os seus escritos são convites, a entender melhor a vida, a sociedade na qual estamos inseridos, agudizando a compaixão frente à dor do mundo. Sua trajetória de pensador incita a tomar parte na tarefa de construir uma humanidade que possa acolher a diversidade do ser e a multiplicidade do estar-no-mundo com os outros.

Para Morin, todo o segredo do mundo está em nós, mas ainda é incompreensível para nós e isto, diz, talvez seja o mistério dos mistérios.

Considerado como o grande artesão do tema complexidade, sua voz se tornou o alerta da atenção na confluência e divergência de tudo o que se pensa e faz. Esclarece que o pensar complexo exige um esforço permanente para, saber pensar, saber ser, saber agir e, sobretudo saber pensar o próprio pensamento. Em sua teoria da complexidade está contido o grande desafio da real possibilidade do burilamento do ser, da sua depuração – nada é simples, tudo é complexidade infinita.

Este pensador original nos diz que todo o conhecimento está ameaçado pelo erro e pela ilusão e é deste erro e desta ilusão que trataremos nesta primeira parte.
Para Morin o maior de todos os erros seria subestimar o próprio erro e a maior de todas as ilusões seria subestimar a ilusão num mundo onde este reconhecimento é extremamente difícil uma vez que é, e sempre foi, dominado pela ilusão a ponto de Engels ter afirmado que os homens sempre elaboraram falsas concepções de si próprios, do que fazem, do que devem fazer e do mundo onde vivem.

Morim nos lembra  que todas as nossas percepções são reconstruções cerebrais com base em sinais captados pelos sentidos. Há que se atentar também para os ruídos, erros e ilusões provenientes de perturbações aleatórias. E são muitos os erros e dentre os principais destaca o erro intelectual e o erro na subjetividade da interpretação. Assim diz: toda a projeção de nossos desejos, de nossos medos, e as perturbações mentais de nossas emoções, multiplicam os riscos de erro.

Aprofundando o pensar acerca do homem e seus erros, Morin afirma que a inteligência é inseparável da afetividade e que a curiosidade e a paixão são as molas propulsoras da vida. No entanto, a razão, aquela que domina a emoção, não é um estágio superior do existir no mundo, como se pensou por muito tempo. Para Morin, existe algo maior que pode ser entendido como um eixo-intelecto-afeto.
Algumas coisas para Morin devem ser consideradas quando se trata de erros mentais. Uma delas é que não é possível distinguir a alucinação da percepção, o sonho da vigília, o imaginário do real, o subjetivo do objetivo. Cada ser humano possui um mundo psíquico independente onde fermentam necessidades, sonhos, desejos, idéias, imagens, fantasias e ainda, este mundo infiltra-se na concepção do mundo exterior – observem a grande complexidade de tudo isto.

Assim, Morin ainda nos convida a considerar fatos como, mentir para si próprio; falhas da memória; o fato de que a mente tende a selecionar as lembranças que nos convêm e a apagar ou recalcar as desfavoráveis. Além, das falsas lembranças e das lembranças recalcadas a tal ponto que passamos a não acreditar tê-las vivido. Tudo tem que ser levado em consideração.

Para aumentar esta gama já tão complexa, ainda pode-se verificar quanto aos erros intelectuais que estes estão protegidos pelas ilusões criadas por nossos sistemas de idéias, nossa forma de pensar em determinado momento da história. Quanto aos erros da razão, o maior é a consideração de que a melhor proteção contra o erro da ilusão seja exatamente a razão quando esta se apresenta como um sistema lógico e perfeito fundado numa base falsa que nega a verificação empírica. A verdadeira racionalidade para Morin, dialoga, opera o ir e vir incessante entre a instância lógica e a instância empírica. Em outras palavras: não há conhecimento pronto, acabado.
Segundo Morin, reconhece-se a racionalidade pela sua capacidade de identificar insuficiências e começamos a nos tornar verdadeiramente racionais quando reconhecemos nossos mitos entre os quais os da nossa razão todo-poderosa. E brilhatemente, Morin afirma, um racionalismo que ignore os seres, a subjetividade, a afetividade e a vida – é totalmente irracional. 

* MARTINAZZO, Celso José.   A utopia de Edgar Morin: da complexidade à cidadania planetária.    Ijuí,RS:UNIJUÌ, 2002