Ler é fácil, difícil é interpretar, esta é a diferença entre dominantes e dominados ...

entrevista concedida ao escritor e poeta Leandro de Assis, para o blog Literatura Clandestina...


Leandro de Assis - Mulher, esposa, mãe, administradora de empresa, educadora social, professora, escritora, faz parte da organização do Fala Escritor, organiza sozinha o Fala Escritor Mirim na Biblioteca Monteiro Lobato, imortal da Academia de Letras do Brasil -Seccional Suiça, o que mais esperar de Renata Rimet?

Renata Rimet - Sou do tipo que não costumo esperar, se a oportunidade surge, arrisco, portanto, não espere nada, faça acontecer, só uma ressalva, não faça nada sozinho, busque aliar-se aos bons, assim como o Fala Escritor Mirim, esteja certo que não se trata de realização solitária.

Leandro de Assis - O que te motivou a começar a escrever e quais suas principais referências na literatura?

Renata Rimet - Se pensar é sinônimo de existir, certamente ler e escrever andam de mãos dadas... Sempre gostei de ler, quando pequena observava as figuras, depois comecei a devorar os livros didáticos ainda nas férias escolares, cresci mais um pouco e descobri um universo de aventuras no guarda roupa do meu irmão mais velho, variado e eclético, tinha Jorge Amado, Dom Quichote, Harold Hobbins, Sidney Sheldon e tinha também os romances que minha irmã consumia vorazmente, Sabrina, Júlia e tantos outros, que alimentavam minha imaginação e proporcionavam viagens de grandes distâncias, sem que desse um único passo. No ginásio tive o prazer de ser apresentada a Carlos Drummond de Andrade, apaixonei-me pela escrita livre da poesia e sigo de mãos dadas por caminhos incertos, de palavras fortes e contundentes, do universo subjetivo e reflexivo, costumo dizer a meus alunos, não dou resposta, questiono!

Leandro de Assis -  “A cultura assusta muito. É uma coisa apavorante para os ditadores. Um povo que lê nunca será um povo de escravos”. (António Lobo Antunes) Após ler esta frase o que pensar do povo brasileiro, escravos ou libertos?

Renata Rimet -  Escravos, uma legião deles, reféns dos fatores diversificados, desde a falta de oportunidade, do desestimulo, até o medo de sair da caverna e enfrentar e transformar sua verdade... Tornando cada vez maior o abismo entre os pólos de nossa sociedade; enquanto enxergarem nitidamente quem culpar o conformismo prevalece, é cômodo nas duas esferas. Ler é fácil, difícil é interpretar, esta é a diferença entre dominantes e dominados.

Leandro de Assis - Você organiza o Fala Escritor, um evento literário respeitado e consolidado na Bahia, como é essa experiência e quais os principais desafios ao organizar um evento como este?

Renata Rimet - A três anos este tem sido meu lazer e muitas vezes envolvendo a família, é um evento de oportunidade, de troca, não existem valores monetários ou cachês, o público é o artista principal, quem escreve, recita, declama ou apenas realiza uma leitura entusiasmada de um trabalho próprio e de qualidade; Desafio maior é convidar músicos e disputar com os dias de suas apresentações em locais pagos, mas graças a Deus e aos amigos, temos logrado sucesso. A experiência é gratificante, sabemos que estamos a cumprir o nosso papel de incentivador da leitura, escrita, livro e literatura, alguém precisa estimular o processo contemporâneo, a produção da história presente, são registros que no futuro terão seu valor e importância, não devemos ter pressa, apenas construir o caminho, passo a passo.

Leandro de Assis -  A Braskem colocou o projeto da Academia de Letras da Bahia (Prêmio Nacional de Literatura) em igualdade a outros projetos na busca de seu patrocínio, segundo a mesma, “desde o ano passado, todas as propostas passam por uma análise de acordo com as diretrizes corporativas e devem ser inscritas através do site da empresa”. A Academia não gostou e foi à imprensa dizer que “a empresa que financiava o projeto há 11 anos, suspendeu o apoio”. Como você, que desenvolve e participa de vários projetos literários interpreta a nova política de patrocínios da empresa?

Renata Rimet: Enquanto observadora, admiro a postura da empresa que financia, desta forma os critérios tornam-se justos e todos que desejam pleitear tais recursos, estarão em pé de igualdade; Vamos continuar observando, quero acompanhar e saber se a Academia irá se enquadrar nas atuais regras, candidatar-se e levar a fatia do bolo que um dia lhe pertenceu.

Leandro de Assis -  A Bienal Internacional do Livro de São Paulo 2012 bateu recorde histórico de visitação num mesmo dia, apesar disso enfrentou várias críticas, uma delas foi à falta de incentivo para as crianças, que, em seu espaço, ao invés de livros e bate papo com autores havia um monte de brinquedos velhos para elas se distraírem. Na Bienal do Livro da Bahia, existe uma preocupação com a formação de leitores? Você que é uma Educadora Social e já participou com o Fala Escritor e em outras oportunidades, qual a sua opinião sobre a “nossa” Bienal?


Leandro de Assis  - Estamos longe do ano da Copa do Mundo de Futebol e muitas coisas têm mudado em nosso país, inclusive leis. Em Salvador ganhamos um novo estádio. Em 2007 foi o ano municipal da leitura e em 2008 o ano municipal da alfabetização. Mais de quatro anos se passaram desde esses dois excepcionais anos para a população soteropolitana, após esses anos de foco principal da Prefeitura de Salvador na educação o que mudou em nosso município, temos mais leitores e menos analfabetos funcionais?

Renata Rimet : Não posso falar em dados estatísticos, mas antes de ser Educadora, sou Administradora de Recursos Humanos e atuo com a mesma determinação e paixão que escrevo, posso lhe dizer com conhecimento de causa, nós temos muitos analfabetos funcionais e já partimos para uma nova geração, a dos jovens, que chegam nas empresas com deficiências básicas de formação, precisamos fazer malabarismo para encaixá-los em determinadas atividades, algumas vezes somos levados a trabalhar leitura e interpretação de texto, para desenvolver o potencial de aprendente em tarefas muito simples. Se levarmos em consideração o desenvolvimento que ele apresenta e o que deveria apresentar, fica nítida a falha no processo de educação, que o mercado de trabalho termina por absorver e prepara-os para trabalhos repetitivos, rotineiros e que não exijam raciocínio lógico, ou seja, a nova geração de analfabetos funcionais, com diploma de conclusão do ensino médio e até avaliação do ENEM.

Respondendo outra questão, não, não consigo notar preocupação com a formação de leitores em nossa Bienal, é bem provável que estejam deixando esta responsabilidade para a Escola, sendo mais precisa, ao professor, na sala de aula; em contrapartida, quando estes conseguem despertar o interesse pelo universo do livro, esbarram na qualidade duvidosa do que pode ser adquirido através do "Vale Livro", por outro lado, fica o questionamento, se ao invés de vender tantas quinquilharias nos corredores, tivéssemos personagens e espaços interativos, será que despertaria o interesse infanto-juvenil pela leitura e criação literária?

A Bienal é algo pontual, que não produz milagres, mas sendo melhor utilizada, em parceria com projetos escolares o efeito poderia ser maravilhoso, na modesta opinião de observadora, vejo a Bienal como válvula de escape de grandes e médias livrarias, que desejam eliminar estoques e livrar-se do problema de fungos e bolores.

Com relação a Copa do Mundo, já passamos da hora de acordar, a data se aproxima e vai acontecer, quer tenhamos condições ou não de suportar, tivemos o ano da leitura e as Bibliotecas não foram revitalizadas,sequer escolas públicas produziram algo que registrassem o momento, depois o ano da Alfabetização e nossas crianças foram melhor alfabetizadas por isso?? Seguindo a linha de raciocínio vou sugerir o ano do circo, pois já estaremos com o traje e a cara do artista principal.

Leandro de Assis -  Você publicou de forma independe o seu livro “Um Pouquinho”. Como é ser escritor na Bahia, vivemos na terra das oportunidades?

Renata Rimet - Moro em Salvador, o livro foi editado em Minas Gerais, de forma independente, realizei o lançamento na Câmara Municipal de Salvador a partir de uma solicitação documentada ao Cerimonial responsável pelo Espaço Cultural, que me despertou para sua existência logo após o escândalo de uma formatura que ali fora realizada, assim, soube que o cidadão tinha direito a pleitear o espaço sem custos, lançado também no Projeto Fala Escritor e no Teatro da Universidade do Estado, durante o Fórum Social Temático; Creio que oportunidade é informação, sou da seguinte opinião, se quero fazer algo, vou buscar recursos para tal, em geral vou trabalhar, reunir verba suficiente e custear meu objetivo sem pedir favores, se existir um edital, um concurso, vou inscrever-me e pleitear o justo, porém escrever e publicar com recursos próprio não chega a ser o maior dos problemas, mas sim, como escoar a produção, como fazer a obra chegar ao conhecimento do público, como ser avaliado por um órgão sério, com críticas construtivas e relevantes, capaz de definir com clareza o material apresentado, e ter o direito de entrar na escola, chegando às mãos de educadores e educandos?     - Existe formação crítica de qualidade? Neste ponto defendo Machado de Assis e seu Ideal do Crítico, na busca pela maturidade literária e melhor desempenho da literatura brasileira como um todo, o que nos remete a uma constatação terrível, estamos a séculos de atraso.

Enquanto a terra das oportunidades não se consolida, vamos publicando em blogs e sites e nos deparando com a barganha do comentário, do tipo, comenta o meu trabalho que eu comento o seu, visita meu site que eu visito o seu... Leio o que me interessa, visito sites aleatórios e encontro coisas muito boas, outras nem tanto, comento sim, aquilo que me toca e ponto final, minha prateleira virtual é tão eclética quanto o guarda roupas de meu irmão, e a diversidade que me apresentou na infância...


 

Renata Rimet
Enviado por Renata Rimet em 28/03/2013
Reeditado em 08/10/2016
Código do texto: T4211682
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2013. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.