ENTREVISTA COM O RECANTISTA - WILDE GREEN: PROVOCADOR DE MENTES E ALMAS

Com o intuito de divulgar excelentes recantistas, criei uma simples entrevista que aborda apenas temas relacionados à escrita. Enviei para meus recantistas favoritos. Todos leio por amor e muito gosto. Após ler a entrevista, sugiro que procure pelo trabalho dos autores entrevistados, pois além de amar seus textos, novos vínculos de leitores poderão nascer a partir desse contato.

Agora falo de um talentoso recantista, cujo me tornei próximo através do amor pela literatura e aprendo muito com ele. Historiador, tem uma visão analítica aguçada, é um autor de peso no quesito conto. Também escreve poesias, artigos e qualquer outro gênero. Porém, no conto que seu maior tino se manifesta, sendo muito versátil, indo de horror à ficção científica, de realismo mágico à cotidiano. E é com grande orgulho que iremos conhecer mais sobre a experiência desse homem e a escrita.

CONHEÇA O PROVOCADOR DE MENTES E ALMAS

WILDE GREEN

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NOME: Welington Pinheiro

PSEUDÔNIMO: Wilde Green

QUANDO VOCÊ COMEÇOU A ESCREVER?

Acho que sempre tive um certo apreço pela ideia de escrever. Quando era criança tentei escrever tudo que eu sabia sobre Super Mario Bros 3 – itens, fases, macetes – mas não concluí, me distraía com outras coisas. Meu filho teve a mesma ideia este ano. Ele concluiu. Aliás, os “Compêndios de Mario” que ele fez estão todos no Recanto das Letras.

Quando eu tinha 12 anos nasceu o interesse pela minha profissão: historiador. Eu era fascinado pelas civilizações antigas e decidi escrever tudo que sabia sobre elas, uma por uma, não apenas aquelas que apareciam nos livros da escola, mas também na Enciclopédia Conhecer, que meu pai me dera de presente. Este livro eu terminei, até hoje guardo com muito carinho aquelas folhas amareladas.

Mas foi aos 16 anos que comecei a pensar em escrever literatura de ficção. Costumava transpor meus dramas adolescentes e minhas paixões para enredos literários. Nunca concluía, mas gostava de começar.

Depois disso escrevi algumas histórias, cheguei a escrever dois romances pequenos que não mostro a ninguém porque são péssimos. Foi aos 27 anos que comecei a produzir no gênero conto, que é meu preferido. Escrevi alguns, mas levava meses sem escrever porque a vida me obrigava a outras coisas. Este ano, com o isolamento social, passei a usar o tempo livre para fazer algo que fizesse o presente valer a pena. Não pensei mais no futuro, nem lamentei o passado. Então a literatura voltou com força.

Respondendo a sua pergunta: eu não sei quando comecei a escrever. Eu tive vários começos. Vários intervalos. E vários motivos para escrever.

POR QUE VOCÊ ESCREVE?

Fiquei dias enrolando para entregar as respostas desta entrevista por causa desta pergunta. Não sabia porque escrevo. A questão me perturbou e é por isso que eu gosto desse tal de Leandro (o entrevistador): ele me obrigou a pensar sobre isso.

Porque não penso em viver de literatura, mas também não sou daqueles que quero escrever só para mim. Então por que escrevo? Foi depois de dois dias de trabalho burocrático – sou professor e durante a pandemia, tenho que preencher dezenas de fichas e relatórios de alunos – que a resposta me ocorreu. Numa vida onde o trabalho não tem sentido, não oferece esperança de crescimento; num país onde tudo parece ir mal e não ter nenhuma luz no fim do túnel; numa existência finita, tudo é desprovido de sentido caso não tenhamos o empenho de construir um, a literatura me permite construir mundos, pensar outras possibilidades humanas através de meus personagens, mergulhar em reflexões ou simplesmente praticar a capacidade de contar uma boa história. E isto faz eu me sentir importante.

É sobre sentido de vida. É por isso que eu escrevo.

O QUE VOCÊ ESCREVE?

Eu gosto de escrever contos e noveletas. Meus temas preferidos são: terror e suspense, pela capacidade que têm de mexer com as emoções dos leitores; gosto de ficção científica pelos enredos elaborados; e gosto de transformar pequenas experiências cotidianas em momentos de grande imersão reflexiva. Frequentemente a ficção fala melhor sobre a realidade do que os textos que pretendem falar sobre o real. Tais textos – artigos, principalmente – boa parte das vezes são ingênuos: acreditam que o real se dobra ao entendimento humano. Tolice. Ele apenas se insinua.

COMO VOCÊ ESCREVE?

Normalmente no computador, mas às vezes começo a desenvolver uma ideia no editor de textos do celular ou no nosso velho e querido papel. Pela manhã ou pela madrugada. À tarde eu não existo.

POR QUE VOCÊ ESCREVE O QUE ESCREVE?

Primeiro porque gosto de criar. Segundo porque gosto de ver minhas ideias se transformarem em sentimentos nas outras pessoas. Terceiro porque gosto de elaborar possibilidades diferentes do mundo que vivo. E por último e mais importante, porque muitas vezes, diante do absurdo do mundo, resta-nos apenas a arte.

O QUE VOCÊ PRETENDE ESCREVENDO?

Um dia eu soube. Agora não sei mais. Acho que eu só pretendo fazer algo que considero importante. É sobre conferir valor à existência ou qualquer outra dessas bobagens filosóficas sem as quais eu não sei me entender no mundo. Eu não acredito em carreira literária no Brasil. Ainda mais para alguém que não tem a mínima noção de marketing e odeia vender coisas, como eu.

SE INSPIRA EM ALGUM(A) AUTOR(A)?

Muitos. Gosto do modo fabular de narrar histórias presente em Neil Gaiman, da mente inesgotável de Phillip Pullman, da arte dos grandes contistas brasileiros como Machado de Assis, Guimarães Rosa, Aníbal Machado, Lygia Fagundes e Clarice Lispector.

Mestres da literatura de horror e suspense, como Lovecraft, Poe e Stephen King (sim, eu gosto dele também). J.R.R. Tolkien, não poderia deixar de mencionar. E também os gênios da ficção científica: Verne, Asimov, Arthur C. Clark, William Gibson.

Tem muitos. Tenho 36 anos e sempre gostei de ler. Então, a lista é grande.

QUAL SEU PIOR TEXTO E POR QUÊ?

Cada texto representa o estágio que minha arte está e a sensibilidade em que estou imerso naquele momento. Quanto mais se recua no tempo, mais simples são os textos e mais imperfeições possuem. Mas eram o ponto que eu estava. Então gosto de todos os meus textos, todos foram e são importantes para mim.

Mas eu diria que “Minha Partida para o Mundo” é um texto que penso em tirar da internet e guardar num canto. Ele é uma memória muito importante para o meu amado pai que ele sempre se emociona quando conta. Às vezes penso que expus algo muito íntimo e precioso para ele. Será que ele queria que aquele texto estivesse à vista de todos? Sempre penso que não.

PODERIA DIZER DE CABEÇA QUAL O SEU TOP 5 TEXTOS AUTORAIS?

Para mim, é um tanto difícil dizer quais seriam “os melhores” textos. Isto é o leitor quem diz. Eu posso dizer quais foram os 5 que mais gostei de escrever. E aí estão eles.

1) “O Castanheiro”

2) “A Maldição de Redwood”

3) “Fundações”

4) “O Fantasma”

5) “Violinos Partidos”

6) “Dia do Julgamento”

Tá bom, eu falei seis. Faz de conta que você não viu, tudo bem?

(Nota do entrevistador: Oaszidéia)

NA SUA OPINIÃO, QUAL O SEU MELHOR TEXTO E POR QUÊ?

“O Castanheiro”. É meu melhor texto por dois motivos: pouca gente o leu e eu gostei muito de escrevê-lo. Pode parecer estranha esta resposta, mas quando a produção de determinado texto é uma experiência criativa intensa a gente vê um valor que parece ter certeza que ninguém mais será capaz de ver. E estranhamente é até bom que seja assim. É como se aquele texto fosse um presente da musa para o escritor, uma coisa para você guardar num canto da sua vida onde só você visita.

Quando escrevi “O Castanheiro” não pensei em mostra-lo a ninguém, queria guarda-lo numa gaveta, escrito com uma caligrafia exótica em papéis amarelados e enrolado como papiro, como se fosse um tesouro de mundo de fantasia. Foi uma brincadeira, apenas isto. Eu não pensei em colher elogios, nem reconhecimento algum, muito menos publicar. Escrevê-lo foi apenas um ato de várias camadas de liberdade: o adulto que brinca, o escritor que escreve para si, o homem que gosta do que faz sem precisar da opinião de ninguém; o fazer que não traz lucro nem promessas mas encerra-se na beleza que traz consigo; o presente que esqueceu do passado e suspendeu o futuro. Foi numa tarde, eu estava sozinho e era um dia muito inspirador, há cinco anos atrás. Aquele dia tinha uma cor bonita, uma iluminação dourada no mundo, com uma moldura verde de bordas irregulares, como galhos de árvore. E havia um vento fresco. Pelo menos é assim que eu me lembro.

Foi a única vez que escrevi com aqueles propósitos, sem pensar em mais ninguém que não fosse eu mesmo. Inclusive relutei muito em colocar aquele texto na internet, não queria que ele fosse criticado ou menosprezado por leituras que algumas vezes são apressadas ou pedantes. Por isso eu gosto do fato dele ter tido poucos leitores.

“O Castanheiro” é o melhor texto porque escrevê-lo foi uma experiência inesquecível.

SE VOCÊ PUDESSE OPTAR EM VIVER SÓ DO QUE ESCREVE, VOCÊ OPTARIA? POR QUE?

Seria legal. Mas me pergunto se isto não criaria pressões insuportáveis sobre a minha arte. E aí como ficaria a função dela na minha subjetividade?

TEM ALGUMA PERGUNTA QUE NÃO FOI FEITA E VOCÊ GOSTARIA QUE ELA FOSSE FEITA SOBRE ESSE TEMA?

Sim. “Para quem você escreve?”

Pode parecer uma pergunta contida nas outras questões, mas não é. Você tem um público, aquelas pessoas que compactuam dos mesmos valores, angústias e adversários que você. Quem são estas pessoas? Você é uma feminista criticando a opressão do patriarcado e jorrando suas desilusões no papel? Um conservador lamentando a deturpação dos costumes que lhe são sagrados? Um(a) apaixonado(a) incompreendido(a) desaguando seu mundo de decepções amorosas em versos? Ou um esteta que acha que é preciso recuperar o primor da arte, perdido na cultura vazia e superficial da modernidade?

Ou você escreve para as crianças? Ou para os entendidos? Ou para o público undergound apaixonado pelo ambiente cyberpunk? Ou para os sonhadores ilimitados que gostam de projetar suas mentes em futuros e lugares distantes?

Para quem você escreve?

SE VOCÊ PUDESSE DIZER ALGO PARA QUEM QUER ESCREVER, O QUE DIRIA?

Nenhum texto é perfeito. Seja porque existem escritores melhores que você, que observaram lacunas; seja porque existem escritores piores, que não entenderão seus propósitos. Seu texto deve ser perfeito para você. O que vier depois é lucro.

LINK PARA TEXTOS DO AUTOR:

https://www.recantodasletras.com.br/autor.php?id=216905

Leandro Severo da Silva
Enviado por Leandro Severo da Silva em 18/12/2020
Código do texto: T7138955
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