DESPROVIDOS

Neste mundo apático, aos pobres não cabe muito. Nega-se-lhes quase tudo. Se algo lhes é oferecido vem na forma de sobejos caídos da mesa farta de quem muito tem.

Os pobres são permanentes sofredores; dizem que por conta do Sistema. São massa de todo tipo de manobra - principalmente eleitoreira -, pois é nas famigeradas campanhas político-partidárias que exercem sua cidadania ao avesso; desempenham a capacidade eleitoral ativa votando em alguém que nem mesmo conhecem de modo superficial e que, passado o pleito eleitoral, somem para regressar em nova campanha de falsas e indevidas promessas.

Os pobres: Sempre os derradeiros da fila. Têm salários os mais aviltados possíveis, quando os têm. Não recebem sua remuneração em dia e ainda agradecem por tal gesto, pois há tantos outros iguais que não poderão esperar para recepção do salário por terem sido demitidos; mesmo porque é melhor ter para receber, ainda que em demora.

São tratados como gente que deve reconhecer seu lugar de condição ‘sabuja’, uma vez que os melhores lugares aos opulentos pertencem, mesmo nas igrejas.

Os pobres morrem sempre sem assistência condigna nas casas de saúde, nos hospitais, nas santas casas - que de santas nada têm. O Sistema Único de Saúde é o que lhes resta enquanto alento para os males do corpo; de outro modo apelam à religião, pois não podem pagar por um bom plano de saúde. O Sistema é o coveiro e o SUS é a sua cova rasa, similar à cova de alguém jogado num buraco como reles indigente.

Seus filhos vão para a escola pública, ruim, que pouco forma e muito deforma. Não podem, geralmente, matricular o filho na escola particular por ser esta muito cara. A universidade é um sonho em muitos casos, pois todos têm que trabalhar desde muito cedo para o aumento da ‘renda’ em casa.

Nunca é convidado para a festa do patrão e quando o é figura como porteiro ou garçom. As vezes se ilude no meigo sonho de achar que o chefe lhe quer bem por proporcionar-lhe um agrado minguado nas grandes festas do ano, uma camisa como presente no santo natal, camisa, de regra, já usada...

O pobre é ninguém e ninguém lhe seve de alcunha. Só leva nome de gente quando está no banheiro ou na seção eleitoral a sufragar o nome de alguém que precariamente conhece.

Quase não tem amigos, poucos querem ser amigo de pobres! Seu cachorro é seu melhor amigo e seu gato seu companheiro a se enroscar em suas pernas a lhe fazer um carinho.

N’alguns lugares aos pobres resta o último banco da igreja. O pior lugar possível lhe é dispensado, sempre oferecido sob pretensa condição de que se assenta em qualquer espaço sem maiores reclamações.

A periferia é seu mundo, sua morada, quando não os subúrbios mais longínquos e desassistidos de toda sorte. Mora lá onde “o diabo perdeu as botas”, como diz o brocardo popular.

Ao pobre não é dado ter conta em banco, exceto se for conta-salário. E na maioria das vezes só vai ao Banco para quitar pequenos débitos. Faz uma fezinha nos jogos da Caixa, os de azar e sempre leva azar, pois jamais acerta. Na casa lotérica vai para pagar conta de água e luz ou receber o escasso recurso do Bolsa-Família.

E no dia das crianças sofre por não poder presentear seus filhos. Do parco e mísero salário que recebe até poderia dar, tirar algo, um centavo que fosse; mas, faria falta para assunção de compromissos no outro dia...

Pouco visita aos seus parentes por não ter condução e quando o faz é por meio de lotação e se tiver um bom amigo, vai de carro emprestado cercado de enorme preocupação: nem acabou de sair e já pensa na volta.

O pobre não come além da conta, e se tiver as três refeições diárias já se sente muito feliz; e agradece perante um mundo excludente e consumista...

Então, reza, desprovido, pois lhe foi dito que a vida é assim mesmo...

José Luciano
Enviado por José Luciano em 01/04/2017
Reeditado em 01/04/2017
Código do texto: T5958507
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