Irmã Gêmea por Amélie Klein

- Episódio 1 de uma Série em Poesia Narrativa


No Brasil, em 2000, Amélie nasceu como uma garota
E, condicionada a crenças sociais limitantes, se acha uma boba
Por ser tão medrosa pelas fracassadas e inúmeras tentativas
de conseguir um trabalho, nessa sociedade volátil e machista.

O fracasso de cada tentativa
o fez descobrir a melancolia
tão insistente que não conhecia
e que agora a atormenta todo santo dia!

Tornou-se uma fácil presa
para a melancolia que sem defesa
deixa Amélie num grande vão
que cada vez mais aumenta em seu coração.

Amélie não se sente capaz
de encontrar sua paz
E ir para qualquer lugar
Com a força do seu desejar...

Seus amigos a motivam!
Eles em vão a animam
Assim como seu melhor amigo
Em que dele guarda algo em sigilo.

Amélie angustiada vai para seu quarto.
De repente, se depara no espelho parado
O reflexo do seu "eu" com semblante sereno
mostrando a ela como é possível ver o seu ser pleno.

A sua irmã gêmea no espelho num gesto de acolhimento,
Subitamente, sorri a ela num dado momento.
Amélie pensou que estivesse delirando
Ou que quiçá estivesse tendo um sonho estranho.

Sua irmã diz a ela para não desistir
Porque ela vai, sim conseguir
Se de uma forma diferente persistir
E não se do mesmo jeito insistir...

Amélie ainda extremamente chocada
Com seu "eu" no espelho, que falava,
Desabafou a ele que estava desanimada
E com esse mundo machista e moderno preocupada.

Sua irmã gêmea do espelho assentiu.
E então, bem pensativa desistiu
De apenas palavras dizer.
Ela firme se virou para trás dizendo: Amélie, venha aqui ver!

Amélie não sabia bem o que fazer;
Mas arriscar era o único jeito de saber...
Ela abriu o espelho e não acreditou no que viu!
A surpresa foi tanta que seu coração acelerado sentiu...

No seu quarto, foi descoberta,
atrás do espelho, uma passagem secreta!!
Impressionada, ela entrou no que parecia
Num só cômodo ser uma outra moradia.

Havia um sofá em frente com um quadro acima,
um abajur lateral, uma estante com livros e uma caixa com roupa íntima.
Havia um armário, uma cama arrumada, um baú com mantimentos.
No fundo da sala, um berço e no chão alguns brinquedos.

Tudo estava extremamente empoeirado
Como se há muito tempo tivesse sido abandonado
Por alguém que o usou como talvez um cárcere ou esconderijo
Sabe-se lá por qual motivo...

Amélie continuou a caminhar
Até o momento que ouviu um som destoante ao pisar.
Quando percebeu que era um piso falso, o quebrou no meio
Até quando conseguiu tirar o azulejo com anseio e receio.

Havia um sebento diário
Com páginas amareladas difíceis de se ler
E um pequeno amuleto ao lado
Com a imagem de uma mulher e de uma bebê.

No diário, a mulher chamada Louise contava
Os tempos em que, nessa casa, em 1978, era violentada
Pelo marido que como chefe de polícia do bairro da cidade pacata do interior trabalhava
E por isso, sua família e a própria pequena cidade tão bem enganava.

O seu pai não se conformava
com a ideia de uma filha divorciada
porque seria uma desonra ao casamento
e à família reconhecida na cidade pelo respeito.

Para seu pai, a mulher tinha que ser uma boa esposa
e não inventar do marido qualquer coisa.
Seu pai escolheu seu marido
já que quem ela amava era proibido. 

Nessa cidade tão pequena do Nordeste, ninguém acreditava
que ela fosse mal tratada, mas sim, que era meio maluca e ingrata.
Aliás, o marido disfarçava muito bem serem uma boa família
como de "conto de fadas" todo o santo dia.

Por três anos, o marido a maltratou
naquele lugar que tanto odiou!
Ele a batia, humilhava, ofendia e tanto a abusou
Até chegar ao ponto em que a engravidou...

Nas vezes que ele chegava bêbado, ela tentava
nesse lugar ficar em silêncio trancada 
para evitar risco a sua bebê
já que por ela, ela poderia até morrer...

No seu diário, escreveu tantas palavras de dor carregadas e por lágrimas borradas!
Era tanta a angústia por não conseguir sair dali que pensou em se matar, sumir,
Mas ela insistiu... Tantos maus tratos ela engoliu
Por sua filha que, por tudo isso, tanto amor e ódio sentiu.

Ela era mantida presa sem janela naquele secreto lugar
para nunca sair dali quando ele fosse trabalhar!
E quando chegava, era obrigada a tudo mais fazer
que uma "boa esposa", segundo ele, deveria oferecer.

Com tanta depressão, ela perdeu a sua dignidade!
Com um vão no coração, ela perdeu sua vivacidade!
Com uma dose alta de um remédio, pensou em envenená-lo
já que estava no ápice do desespero naquele lugar fechado.

Até que sua irmã mais velha Ruth que morava no centro da cidade
veio visitá-la de olhos abertos à necessidade
Que Louise contava aos prantos desconsolada
Temendo que fosse envergonhada e desacreditada.

Beth não disse que louca ou boba ela estava
e ajudou Louise a sair imediatamente daquela casa
Mesmo com qualquer oposição
que o marido da irmã fizesse sem consideração. 

Louise pegou a sua filha já com três anos dormindo
e se permitiu ir se despedindo
de uma vida passada que não é cristalizada
já que de viver assim por nenhuma razão deve ser obrigada...

Com a Ruth, na delegacia no centro da cidade,
Louise denunciou o seu agressor dizendo cada detalhe
e precisou se reerguer morando com a irmã um tempo
enquanto via seu ex-marido sendo tratado e preso. 

Louise procurou com dificuldade trabalho!
Sua família se desculpou por não terem nela acreditado!
Com um vão no coração, sofreu...
E com uma cicatriz da superação, enfim, sobreviveu...

Amélie impressionada com o passado da sua casa
e sensibilizada com a ferida e a cicatriz dessa mulher tão determinada.
No final do diário, Amélie achou um anagrama inteligente
E ao desvendá-lo, encontrou o endereço de Louise mais recente.

Decidida como Louise, Amélie quis tentar encontrá-la!
Chamou suas amigas e amigos e todos fizeram suas malas....
Viajaram no final de semana seguinte e quando Amélie chegou,
Percebeu que o lugar numa ONG virou!

É uma ONG por Louise fundada e coordenada
Para a defesa das mulheres destinada
A fim de ajudar a elevar a autoestima ao ser violada
e em casos de depressão ser tratada.

Louise superou o que seu abusivo ex-marido dizia
De que era incapaz de fazer qualquer coisa na vida.
Ela se fez sujeito de si com autonomia,
Transformando a dor em ação com perseverança e valentia.

Louise com Amélie foi conversar
Para, se inspirando em seu exemplo, tentar ajudá-la a pensar
Em como tem capacidade, como mulher ou homem, de fazer uma singela diferença no mundo.
E isso ninguém anula nem por um segundo!!

Diferente do determinismo natural, a mulher não é frágil por si só!
Com o estudo, a mulher é capaz de sair de qualquer nó...
Não precisa ser dependente para enfrentar qualquer obstáculo
Que estiver a incomodando ao seu lado.

Amélie, por si mesma, foi violentada inconscientemente
não fisicamente como a Louise felizmente,
Mas ela mesma também se machucava psicologicamente
ao subestimar a capacidade de sua mente.

Por isso, Amélie tanto se identificou
com a história de dor e cicatriz que mostrou
ela mesma ou sua irmã gêmea no reflexo do espelho,
pois afinal, a pessoa que mais nos ajuda é nós mesmos!!

Os amigos de Amélie também a ajudaram!
Esse momento de crescimento auxiliaram
Por juntos estarem nessa jornada
Cada vez mais unidos em qualquer cilada!

Amélie a David, seu grande amigo,
Ainda não conseguiu confessar o seu segredinho,
Mas, para um dia desses, até que foi o suficiente ele a abraçar profundamente
E sussurrar em seu olvido que ela pode contar com ele sempre...

Ao voltar em seu quarto e ver seu espelho novamente,
Amélie Klein se chamou ansiosamente
Para agradecer por mostrar a ela mesma
Como é capaz de conseguir o trabalho que deseja.

Elas sorriram uma para outra
Com mais esperança nas coisas...
O presente é a semente do amanhã
ao reconhecer em nós mesmos a nossa irmã.

É uma irmã gêmea que nos revitaliza
Nos motivando nas nossas missões a cada dia!
É uma irmã gêmea que está em nosso coração
conosco para nos ajudar a tapar nele qualquer vão...

* Louise e Amélie foram inspiradas em pessoas reais e conhecidas por mim, menos a parte da passagem secreta. 

Beatriz Nahas
Enviado por Beatriz Nahas em 24/04/2020
Reeditado em 06/11/2022
Código do texto: T6927630
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