Um Vento que se apaixonou - parte dois

Um Vento que se apaixonou 2ª Parte

Oh! Diana!!! Que maravilha são os teus cabelos, uma cachoeira de pérolas negras brota da tua fronte e jorra por sobre a tua nuca! E agora com essas mechas douradas... pérolas negras e douradas, se misturam, por causa dos fios dourados os negros ficaram achocolatados, uma calda de chocolate então deslizava por sobre tua cabeça, uma cabeça que inspira beleza, sabedoria, inteligência, elegância, de maneira que é impossível não olhá-la, observá-la, prender-se a essa observação, se deter a este ato que se torna para mim algo muito intenso; às vezes, pego-me neste ato de forma tão intensa que observar-te me faz também te envolver em meus braços... braços de vento... puro ar... ar que respiras, ar que penetra em ti pelas tuas narinas, entrando pela faringe e indo até os pulmões, lá eu sou despedaçado, desmoleculado, é tirado de mim o oxigênio que se transforma em combustível para o teu coração, por isso não me importo de ser em ti desmembrado, porque, estarei em você sempre.

Lembro-me desses momentos com ternura indizível. Vou agora ao Olimpo, pedir ao pai Zeus que me dê forma, como a dos humanos, dos homens, para poder te abraçar, te colocar nos braços, meus braços, braços de homem, não mais de vento... e estar contigo. Quero que me sintas, que me vejas, que tenhas saudades de mim quando me demorar para chegar. Vou para o Monte Olimpo, serei um ser humano, me tornarei um ser vivente que respira, come, dorme, chora, ter pele... será incrível!

Zeus, no Monte Olimpo, está em companhia de outros deuses olimpianos, Apolo, Atena, Ares e Hermes, quando o grande salão em que estão é invadido de maneira calma e acalentadora pelo vento. Entrou como quem entra numa reunião de altíssima importância. O salão, com suas colunas gigantescas de modo a segurar um teto invisível feito de uma estrutura de nuvens com bordas douradas e avermelhadas, como o crepúsculo de um verão brasileiro nas praias cariocas.

Sabendo Zeus dos acontecimentos últimos pelo qual o vento tinha passado, e já desde alguns dias o próprio Zeus tinha percebido umas alterações no comportamento deste vento. Acolheu-o em suas mãos, foi então para um lugar à parte, e, como quem segura a um filho com uma perplexidade pelo que aconteceu com ele, “o vento”, algo que não era normal acontecer. E perguntava-se o próprio Zeus: como isto aconteceu com você? Você foi feito com outras propriedades, outras funções, não era para você ter anseios, vontade, desejos, sentimentos; estas são qualidades únicas dos homens e dos deuses. O que farei com você agora? Você esteve tanto tempo em proximidade com eles que aprendeu a ver, a sentir e até a si comportar como eles. O amor que sinto pela humanidade é assaz grandioso e me traz muitas angústias por querer livrá-los e eles não me deixam fazê-lo; temo que você sinta essas mesmas angústias, pois, estás a amar, criastes em ti mesmo a capacidade de amar.

Vá! Atenderei a sua petição. Realizarei o seu desejo, mas tenha cuidado! Terás as duas naturezas em ti. Serás humano e serás também vento! Terás controle sobre essas duas naturezas, e para isso é preciso que pratiques, e muito... porque tenho algo mais para você... terás uma forma humana e para isso irei te dar autonomia e domínio sobre os elementos terra, água e fogo além da autonomia sobre ti mesmo, pois és vento, a união destes quatro elementos lhe dará uma forma humana. Agora vá! Vá aos campos Elísios e pratique bastante, você mesmo terá que dominar e ter controle sobre si mesmo, pois não serás mas um só, serás quatro em tu mesmo que dará forma a um novo você e te chamarás Éolo. Zeus estendeu sua mão para cima e num raio lançou o vento aos campos Elísios. Lá chegando todo empolgado, ele estendeu os braços de ventos, braços invisíveis, mas os elementos foram se chegando até ele dando forma aos seus braços, começando pelos ossos, foram se juntando os cálcios e as outras propriedades ósseas, todos os minerais que compõem os tecidos ósseos foram se chegando e agrupando-se e dando forma ao esqueleto Éolo. Dedos ósseos, braços ósseos, crânio, tórax, o fêmur, clavícula. Continuou com os braços, agora esqueléticos, estendidos, e foram se chegando a eles outros elementos que compõem os tendões e nervos. Os nervos e tendões foram se agrupando em locais apropriados para dar locomoção aos ossos, continuando com os músculos, a carne revestindo aqueles ossos, se juntando e encontrando seus pares de combinação, de forma que gordura ficava junto de gordura e carne junto de carne, a pele por sobre os músculos e por fim os pelos.

Um momento indescritível esse de formação do vento, ele estava vendo agora braços, seus braços, braços do vento, mas não mais feitos de vento ou com o vento, era agora sólido, e sentiu o ar tocando seus dedos, esse ar, era o seu? Não! Esse vento era outro, o vento dos Campos Elíseos. Era gelado! Da ponta dos dedos esse frio foi passando para os braços e também para o tórax por onde ia-se tomando forma as sensações iam vindo e saindo, sentidas por sua pele agora, pele de cor clara, suas pernas tomada forma, sua cabeça tendo forma, os fios de cabelos loiros caracolados, aparecendo como fios dourados em sua fronte, estava todo com frio e nu. Um raio caiu ao seu lado trazendo roupas ocidentais e um par de tênis.

Estava em pé e, num intuito foi pegar a roupa, num intuito ainda de vento, caiu... tentou se levantar com braços de ventos, houve então um tremor de terra lembrou-se dos braços, outros braços, braços de homem, então, levantou-se e, levantando o pé direito perdeu o equilíbrio, caiu de novo, não pensou que seria tão difícil... ficou de pé, num passo atrás do outro com muita dificuldade chegou até as roupas, vestiu-as com uma desenvoltura infantil. Continuou a andar, andar com os braços balançando, com eles sendo jogados para cima, como criança se descobrindo com um novo brinquedo. Deu cambalhotas, virou mortal, fez maracutáias várias, se pendurou em árvores, pulou por sobre pedras e delas também.

Então já estava andando seguramente, podia já se apresentar com segurança a alguém sem que causasse transtornos, já tinha pleno domínio das suas habilidades. Mas havia mais guardado... deu vontade de ver Diana...!!! Sentiu saudades... se descobriu por outro ângulo... não tinha se visto daquela maneira ainda em nenhum momento da história desde que foi formado vento... mas agora era diferente, estava diferente, sentia-se diferente, sentia-se humano.

Pensou em Diana com a intensidade de sempre e, no mesmo instante como algo comum, começou a flutuar, não, não se assustou, isso era-lhe peculiar, voar estava intrínseco em sua natureza de vento. Estava agora voando como se fosse o próprio vento... e não o era ainda? ou, não o era mais? Sim! Era-o sim! E era muito bom sentir o vento, outro vento que não fosse ele mesmo, com os braços abertos no ar, fazia piruetas tantas de alegria, e pensava em Diana. Chegou nas proximidades da cidade em que Diana morava, foi planando até descer totalmente e colocar os pés no chão. “Voar é o máximo” disse o vento em seu pensamento, “mas andar também é formidável”. Para ele, sentir suas pernas, o peso da terra em contato com os seus pés, isso o deixava eufórico, radiante.

Saiu, ora andando, ora pulando e batendo com os dois pés no ar. Já estava próximo à entrada da cidade quando fazendo isso passou por ele um Pálio azul escuro, quatro portas, placa de Aracajú-Sergipe, quatro pessoas dentro. Olhando todas para aquele homem de cabelos loiros caracolados. Perguntavam-se: será que é doido? Aconteceu algo incrível, de forma singular. Por ter ele, o vento domínio sobre a pressão do ar, mesmo em lugares abertos, quando em suas mentes disseram isso, pelos impulsos cerebrais e os movimentos neurais ele soube exatamente o que todos eles tinham dito no recôndito de suas mentes...

Olhou para eles, primeiro ficou estático, como quando o vento ficava pairando sem nenhum movimento, depois perplexo... “eu consigo fazer isso?” perguntava-se. “Pancada! Eu entendo o que eles dizem sem que abram a boca? Pancada, pancada, pancada três vezes”. A galera do carro que diminuiu a velocidade ficaram a afirmar sentenças maiores ainda. Uma das senhoras no banco de trás disse: “pobre coitado, tão jovem, tão bonito, no entanto, tão louco, bichinho!”

Foram se distanciando aos poucos, ele ria cada vez mais alto do incompreensível acontecimento. Ao passo que foi se aproximando do primeiro acesso a cidade, mais pessoas passavam por ele agora. Diminuiu então seu riso, percebeu que não estava ouvindo os pensamentos dessas pessoas, então entendeu que por distração não tomava nota dos impulsos cerebrais delas. Caminhando ainda, procurou se concentrar: começou a ouvir as vozes dos que estavam por perto, muitas vozes. Então confirmou o que previra.

Na entrada da cidade, um grande arco de cimento e concreto dando as boas vindas aos visitantes daquela cidade, em seu ponto mais alto tinha um brasão da família mais antiga e respeitada da cidade, a família Silva, muito bonito, de cores verde, amarelo e azul. Passou por ele, logo a frente uma praça enorme se estendia sobre o chão asfaltado, bem arborizada, muitos bancos, num deles, lá estava a razão de ser humano o vento.

José Wilker da Silva
Enviado por José Wilker da Silva em 26/08/2011
Reeditado em 29/07/2013
Código do texto: T3183018
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