O dia que me apaixonei por um homem.

Sentado sob a sombra da velha macieira, um homem fumando seu cachimbo, observava o tempo passar perdido em seus pensamentos, não se dando conta da chegada do menino. Um garoto gorducho e risonho que lentamente se aproximou e sentou ao seu lado.

-Tio, posso fazer uma pergunta?

O homem, meio que surpreso, respondeu com um meio sorriso e um aceno de cabeça positivo.

-Como o senhor me conheceu?

Tirando o cachimbo dos lábios, com sua voz grave e cheia de melancolia o homem respondeu:

-Faz tempo meu rapaz, quando você ainda era bebê.

Cheio de uma surpresa inocente a criança continuou com suas perguntas.

-E o senhor se lembra por que?

Com um novo sorriso, mais uma vez o homem respondeu.

-Lembro-me por que foi o dia em que me apaixonei por um homem.

Saltando de pé, com os olhos arregalados, o menino deixou escapar.

-Como é que é?

Rindo da atitude da criança, o homem após uma longa baforada respondeu.

-Sente meu rapaz, que conto para você toda a história.

Obedecendo, o menino cheio de curiosidade, ficou a fitar o tio fixamente nos olhos.

-O seu tio, sempre foi um homem solitário, de poucos amigos e sem atrativos para as mulheres. Na juventude ele até teve algumas namoradas, mas nenhuma suportou as manias desse velho aqui.

Quando a guerra começou, seu pai foi convocado e morreu em ação. Sem marido, dinheiro e grávida, sua mãe veio morar comigo. E isso me deixou feliz, pois depois de muitos anos eu tinha companhia aqui na fazenda. Após oito meses, sua mãe entrou em trabalho de parto, foi um parto complicado segundo o médico. Eu apenas fiquei esperando, cheio de preocupação. Mas após onze horas, o médico veio me dizer que um menino havia nascido e que era forte e saudável.

Fiquei preocupado e com várias dúvidas. Como eu iria agir? Eu sempre amedrontei as crianças que conheci. Sou um homem feio e sisudo demais.

Durante duas semanas eu evitei me aproximar de você. Sua mãe me chamava para lhe ver, mas eu sempre inventava uma desculpa.

Então durante um domingo, ao entrar em casa, eu encontrei você deitado no berço. Sua mãe o havia colocado na sala para me forçar a lhe conhecer.

Você dormia e cheio de medo de lhe acordar eu lentamente me aproximei. Você tinha cara de joelho meu rapaz, como todo bebê tem. Estavas todo enrolado em uma manta e apenas seu rosto estava descoberto. Quando o vi, pensei com meus botões: - Que criança feia.

Foi quando, para meu assombro, você abriu os olhos. No mesmo instante pensei que irias chorar e fiquei como se congelado.

Com seus olhinhos de bebê, você parecia procurar algo e então fixou os olhos diretamente nos meus e com uma boca sem dentes, sorriu para mim. Um sorriso franco e puro, que parecia dizer que estavas feliz por me ver. Nesse instante meu rapaz, eu tive certeza que eu havia me apaixonado por um homem.

Com uma expressão de dúvida a criança deixou escapar.

-Não entendi.

Batendo o cachimbo em sua mão para retirar as cinzas, o homem explicou.

-Veja meu rapaz, seu tio está velho para constituir família. Ter uma esposa e filhos. A vida, no entanto, foi generosa comigo, pois apesar de não ser da minha semente, meu deu um filho. Um menino do meu sangue, que pode não ser meu, segundo as leis ou a biologia, mas é meu filho. O meu menino. O filho do meu coração.

E com os olhos marejados, o homem se ergueu e levantou o menino, o seu menino, em um longo abraço.

TTAlbuquerque
Enviado por TTAlbuquerque em 08/12/2013
Código do texto: T4603172
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2013. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.