"Rai Al" O índiozinho protetor de Arraial do Cabo, por Lenardo Sanches

Narra a história de um indiozinho que se relaciona bem com a natureza e em certo momento, se vê no dever de proteger seus amigos animais e fugir para longe dos invasores da "Terra Nova".

Uma homenagem ao Mestre das Esculturas de Arraial do Cabo/RJ - Brasil

Andrelino Gomes de Oliveira (08/05/1940 – 25/11/2014)

Rai Al

(Uma história escrita por Lenardo Sanches)

Lenardo Sanches

“Rai Al”

2015/Arraial do Cabo/RJ

Por volta de 1488, numa das florestas mais ricas da face da terra, nasce um indiozinho, que ao crescer passa-se chamar “Rai Al”, que significa “Raio de Sal” na língua indígena local. Este nome o foi dado por sempre estar correndo como um raio no meio da mata, e como neste lugar, havia praias e uma lagoa enorme que continham muito sal, sempre que ele passava o dia mergulhando nestas águas, ao secar, ficava tão cheio de sal que quando o sol batia nele correndo, chegava a brilhar com o reflexo que o sal provocava ao refletir a luz em seu corpo, daí o efeito e o porquê de se chamar “Rai Al”.

Rai Al correndo feliz por viver com liberdade entre as árvores

- Uhuuu!!! Eu adoro isto tudo. Árvores, terra, água... O ar é tão puro. Iiuupiiii!!!

Rai Al corria como o vento. As folhas das árvores balançavam quando ele passava. Sua pele estava acostumada com o sol, e o sal em seu corpo dava um aspecto de brilho. O indiozinho vivia como parte daquilo tudo, seus pensamentos perguntavam e os espíritos da floresta respondiam, conversavam como grandes amigos.

Rai Al todo animado

- Que dia lindo floresta, você parece estar mais radiante que ontem.

Floresta feliz com Rai Al

- Rai Al, eu estou como sempre, são seus olhos felizes que me veem a cada dia mais bonita.

Rai Al

- Que nada! Estou sentindo seu cheiro mais puro, o ar está renovado, suas cores estão mais intensas.

Floresta

- Você é quem está mais puro, cheio de energia, parece um raio correndo pra lá e pra cá.

Rai Al

- Eu corro de alegria em poder viver livre, respirando este ar que a senhora me proporciona, sendo banhado de dia pelo sol que me energiza, e à noite poder descansar com a luz da lua me protegendo como um anjo. Só posso ser feliz!

Rai Al cresceu brincando entre as árvores, subia nelas, pulava de uma para a outra, observava os animais da região. Ele chegou a um grau de intimidade com macacos, bichos preguiças, tamanduás, araras, diversas espécies de pássaros, e sua energia era tão boa, amena e positiva, que chegou a ser aceito até entre as onças e demais felinos, entre outras espécies de animais do seu habitat.

Rai Al conversando com os animais

- Olá Macaco, tudo bem?

Macaco

- Olá Rai Al! Vai passear comigo hoje no alto das árvores? O dia está bonito hoje. Daqui a pouco vou pegar umas bananas para comer. Se quiser me acompanhar, esteja à vontade, tem banana para todos.

Rai Al

- Muito obrigado pelo convite Macaco, mas no momento estou sem fome. Bom apetite!

Dona Preguiça reclama

- Ôôôô bicharada!! Dá para fazer um pouco de silêncio que ainda tem gente dormindo. Com esse barulho todo, eu não consigo descansar.

Rai Al

- Me desculpe Dona Preguiça! Bom descanso.

Tamanduá

Cadê as formiguinhas que moravam aqui? Huummm... Acho que se mudaram. Vou ter que procurar outro restaurante para me alimentar.

Rai Al

Tamanduá, por que você não vai beber água no rio? Acho que um pouquinho de dieta líquida, não fará mal nenhum. E a água está tão fresquinha!

Tamanduá

- Só água não me satisfaz, preciso de iguarias exóticas para me sentir com mais vigor.

Rai Al olhando os pássaros sobrevoando um pouco acima dele e do Tamanduá

- Tamanduá, cuidado com a cabeça, os pássaros estão voando em nossa direção.

Tamanduá

- Aiii!!! Lá vem aquelas Araras que não se importam com quem está embaixo

Rai Al

- Olá Araras! Estão indo para onde?

Araras

- Estamos indo para as montanhas, andamos avistando intrusos se aproximando de nossas terras

Rai Al

- Intrusos? Ué! Que tipo de intrusos?

Araras

- Não sabemos. Estão chegando pelo oceano próximo a entrada principal da Ilha Maior.

Onça

- Como é que é? Tem intrusos se aproximando por nosso litoral? Vou espantá-los daqui pra já! Vou até lá agora mesmo botar todo mundo pra correr.

Rai Al

- Calma amiga Onça! Não sabemos do que se trata. As Araras sempre falam demais como os Papagaios. Não deve ser nada. Deixa que eu vou verificar, e assim que souber de algo, volto para contar a todos.

Onça

- Está bem! Mas se não retornar até o anoitecer, vou atrás de você para ver o que houve.

Rai Al

- Não se preocupe amiga Onça. Sei me cuidar. Não vai acontecer nada comigo. Vou e volto num pulo só.

Onça

- Está bem! Somente me preocupo em protege-lo.

Rai Al

- Muito obrigado pela preocupação amiga Onça, mas se Deus quiser, nada acontecerá comigo. Deus está em tudo e em todas as coisas a nossa volta, e não há uma folha que caia sem que Ele não saiba. Ele está sempre conosco, onde quer que estejamos.

Onça

- Você está certo. Se há fé, há esperança, e se há esperança, tenho fé que você retornará logo, são e salvo.

Rai Al

- E tem mais uma coisa, não se esqueça de que temos a Floresta como nossa companheira dia e noite. Ela está presente em todos os nossos passos, para onde vamos, ela não só nos alimenta com seu ar puro e alimentos saudáveis, mas nos protege com suas sombras, tocas entre o outras formas.

Onça

- Vá indiozinho! Vá logo para nos trazer informações o mais rápido possível. Não quero ficar mais ansiosa do que já estou. Já tenho manchas demais na pele. Não quero ficar com outros tipos de manchas que não sejam as minhas, isto me deixaria com cara de doente.

Rai Al

- Pode deixar! Nada há de mudar a rotina alegre e saudável da nossa terra mãe. Estou indo. Até logo amigos! Volto em breve com notícias.

Com o tempo, Rai Al aprendeu a mergulhar como um golfinho, nadava entre eles como se fizesse parte da família, tinha uma capacidade pulmonar extraordinária, ou seja, tanto na terra, quanto no mar, vivia como um igual aos seres que ali residiam, um espírito irmão para todos que o conheciam e conviviam com ele. Não tinha medo do mar, rios ou cachoeiras.

Mas um dia, tudo mudou, uma catástrofe, chegava sem avisar, quebrando toda a rotina saudável, linda e perfeita daquele lugar. Nos anos de 1500, chegam homens invasores nas terras onde Rai Al morava. Chegaram em canoas gigantes, movidas com o vento, sem fazer barulho, como uma tempestade que se aproxima de repente trazendo muita insegurança com sua força natural.

No caso destas “Naus” enormes, transportaram um futuro destruidor, estes piratas das “Terras Alheias”, já chegaram jogando suas âncoras pesadas nas pedras repletas de corais coloridos, arrastando-as em tudo que passava, machucando a vida marinha que estivesse no caminho.

Ao pisarem nesta terra, olharam e acreditaram terem descoberto uma nova esperança para explorarem o minério e tudo que pudessem levar como suas novas posses para o outro lado do oceano “Europa”. Eles tinham que trazer retorno ao reino que os mandou para tais explorações. A ideia era encontrar terra nova e toda riqueza que pudessem carregar em seus navios para reabastecerem seu reinado, que não se saciava com pouco, sempre querendo mais e mais para disputar e tentar mostrar para outros povos quem era mais rico em ouro, madeira, peles de animais e o que mais pudessem carregar.

Nesta época, o índio mirim Rai Al, estava com 12 anos, e ao perceber o perigo com a chegada desta gente abusada e sem respeito pela vida alheia, sentiu que precisava fazer algo rápido e urgente para ajudar seus irmãos animais.

Foi aí que, como o raio que era, rápido e sagaz, correu por todos os cantos no intuito de convencer a todos a fugirem para o mais longe que pudessem em direção ao interior das matas e montanhas, pois caso ficassem, iriam acabar mortos, capturados por aqueles homens sem noção de amor, respeito e consideração pelos outros.

Rai Al retorna e pede para que a Floresta o ajude a reunir todos para uma reunião

- Floresta, precisamos reunir todos para que fujamos daqui.

Floresta

- Mas como vocês vão fugir? Não tem para onde irem.

Rai Al

- Tem sim Mãe Natureza! Vamos para as montanhas. Lá estes invasores não chegarão.

Eles não conhecem a senhora como nós.

Floresta

- Tem razão indiozinho! Vou convocar agora mesmo que todos venham ao seu encontro para que explique o que está acontecendo. Você ficará responsável para guiar a todos e salvar as vidas dos que irão te seguir.

Rai Al

- Vou esperar aqui mesmo Floresta.

A “Mãe Natureza” convocou a todos, e os recomendou que seguissem Rai Al para que salvos ficassem em paz sem a intervenção dos intrusos estrangeiros.

Rai Al

- Irmãos, filhos da “Mãe Natureza”, realmente as Araras tinham razão. Desta vez não era somente um “Blá, blá, blá”. De fato, intrusos estrangeiros estão invadindo nossas terras, e precisamos nos apressar em fugirmos para nos protegermos.

Onça

- Eu não vou fugir de ninguém! Sou forte o bastante para lutar e expulsa-los daqui num rugir só.

Preguiça

- Ah! Mas não vou sair daqui mesmo. Estou com muita preguiça de sair por aí correndo em fuga. Vou ficar deitada num galho bem alto. Nem vão perceber que estou por aqui.

Tamanduá

- Eu realmente não sei o que dizer. Apesar de que não tenho encontrado mais formigas para meu almoço, muito menos para o jantar. Tenho estado com fome. Parece até que as formiguinhas ficaram sabendo a respeito destes invasores antes de nós.

Macaco

- Olha gente! Eu amo esta terra, adoro as árvores daqui. Mas a algum tempo atrás, avistei umas bananeiras no alto das montanhas. Acho que consigo me virar por lá.

Rai Al

- Com certeza Macaco! E todos vocês vão ficar bem para onde quero leva-los. Tem comida para todos, cachoeira como fonte limpa de água pura para nos alimentar e garantir nossa sobrevivência.

Onça

- Bem! Se é assim, acho melhor irmos com Rai Al para as montanhas. Não quero arriscar perder meu coro para estes invasores, piratas de terras alheias.

Todos gritaram

- Vamos! Vamos, vamos!

E assim foi, conseguindo salvar boa parte dos seus amigos animais que lá habitavam, fazendo com que entendessem e concordassem ser o mais certo, fugirem para longe dali. Rai Al os acompanhou, trilhando como guia por entre as matas, e nunca mais ouviram falar dele, somente que um indiozinho, havia sumido guiando várias espécies de animais pelo meio da floresta, desaparecendo como se fizesse parte dela, até não se ouvir, nem ver mais sons ou imagens destes.

Anos depois, em 1940, na cidade que veio a ganhar o nome de “Arraial do Cabo”, justamente em homenagem à aquele indiozinho que passou a fazer parte de uma lenda na região, salvando muitos animais a não serem capturados ou mortos pelos invasores da época, pois por ser chamado de “Rai Al” e àquelas terras terem o formato de uma flecha em direção ao oceano como se fosse a ponta de um cabo, recebeu este nome “Arraial do Cabo”. Uma criança nasce branquinha, cabelos e olhos clarinhos, e seus pais ao baterem os olhos no bebê que acabara de vir ao mundo, resolvem dar o nome de “Angelino”, pois que este parecia um anjo vindo do céu para os braços desta família. Angelino, cresceu, estudando, convivendo com os pescadores locais, aprendendo a arte de conviver neste ambiente da pesca e cultivo do sal. Mas em seus sonhos, sempre que dormia, se via numa floresta, com muitos animais, tinha e impressão de fazer parte daquilo tudo, grandes árvores, tigres, onças, leopardos, leões, girafas, como se fosse uma África, com o tempo, foi tendo o instinto natural de querer modelar grandes esculturas dando vida a animais, e aos poucos, foi se transformando no “Mestre das Esculturas”, realizou trabalhos manuais praticamente perfeitos, como por exemplo, um pescador com chapéu tipo sombreiro, trajes apropriados para o dia a dia destes trabalhadores artesanais, entre outras obras lindíssimas que aos poucos tomavam forma, e de um sonho, se transformavam em realidade visual para todos que por ali passassem e quisessem admirar a arte do Sr. Angelino.

O Sr. Angelino, casou, teve filhos, netos, foi ficando mais velho, querido pela comunidade local por seu jeito singelo de ser, pessoa humilde, bondosa, amiga, sempre com um sorriso no rosto passando alegria, sinceridade e positividade para os que o rodeavam, ou tinham o prazer de conhece-lo pelos tempos em que viveu.

Sr. Angelino, ao ficar mais idoso, como todos um dia, foi embora, se mudou para próximo dos irmãos que nos protegem, mas deixou como herança, toda a beleza daquelas obras esculturadas por suas mãos, lembranças de sonhos que se tornaram realidade eternizada em sua casa a qual passou a chamar de “Casa das Estátuas”.

Dizem alguns que o conheceram, acreditarem que o Sr. Angelino, foi um dia aquele indiozinho da tal lenda, em que Rai Al, salvou os animais da invasão dos estrangeiros, e que prometeu que um dia voltaria, e traria de volta de alguma forma seus amigos, irmãos de várias espécies novamente a um lugar seguro na região que outrora fora seu habitat natural.

Muitos visitam esta casa hoje em dia, e tem pessoas que chegam a comentar que sentem a energia boa no local e que com certeza sua luz está sempre presente como protetor daqueles que necessitem de ajuda, acolhimento, amor e fraternidade.

Fim

Esta é uma homenagem ao Sr. Andrelino Gomes de Oliveira (08/05/1940 – 25/11/2014), o verdadeiro espírito de luz que fez tudo isso acontecer. Nossos sonhos podem se tornar realidade, basta fazer como o Sr. Andrelino, sonhar, acreditar e construir um mundo mais bonito. Se cada um fizer a sua parte, a esperança não morrerá, estará viva para a eternidade através do amor ao próximo, amor a tudo e a todos que convivam como irmãos.

Sr. Andrelino e sua última obra. Deixou um verdadeiro “Rei Leão” para tomar conta da casa onde viveu por anos, dando vida aos sonhos. Com certeza sabia estar deixando sua representação de guardião da esperança.

(Homenagem feita por Lenardo Luís Sanches Vasconcellos)

Arraial do Cabo, 9 de setembro de 2015.

RJ/Brasil.

CASA DAS ESTÁTUAS

Endereço para visitação: Rua Antônio Pedro De Aquino. Nº 13, Monte Alto, Arraial do Cabo/RJ – Brasil.

CEP > 28.930-000

Telefone para contato: (22) 26629042

e-mail > andrelinogomesdeoliveira@gmail.com

http://srandreesculturas.blogspot.com.br/

aberto das 9h às 17h, de segunda a domingo

Sejam bem vindos!

Andrelino Gomes de Oliveira

(08/05/1940 – 25/11/2014)

Lenardo Sanches
Enviado por Lenardo Sanches em 09/09/2015
Reeditado em 28/09/2015
Código do texto: T5376061
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