O Pássaro na Gaiola

Eu ouvi o cantar de um pássaro, era triste, era como as cantigas de despedidas numa casa em velório. Cada nota daquele canto, aramando-se em acordes de farpas agudas, cada nota é uma lágrima, cada lágrima é uma lembrança de um tempo livre.

Ele parece se esforçar para o canto sair melhor, mais nítido aos ouvidos seletos de seu algoz que tanto cuida, quanto fere limitando-o a viver ali.

Por um momento se cala. Parece esperar respostas de algum lugar, como os náufragos jogam suas garrafas nas ondas e esperam por um milagre. Vem, vem! É o que se entende. Como se buscando ajuda de algum lugar, o pássaro deseja o que eu nunca vou saber, exceto liberdade, e daí, já nada se sabe mais. Eu quero vê-lo, desejo ajuda-lo! Me aproximo daquele canto e o vejo preso, na gaiola. Que dilema enclausurante, não sei o que faço agora. Pronto. Agora chega! Abri a portinha miúda tecida de talo de palmeira de babaçu, pus a mão lá dentro e o bichinho alvoroçado voa de um lado para o outro, assustado e com medo de morrer esmagado por tão grande mão. O peguei com cuidado e cá fora abri a mão e ele voou, e depois voltou. Seu semblante demonstrou tamanho desapontamento que sentou na gaiola e cantou olhando nos meus olhos. Cantou por várias vezes e voou novamente. Depois voltou à gaiola que ainda se encontrava de porta aberta, entrou e me olhou e comeu, bebeu e voltou a cantar sempre me olhando.

Então para a minha surpresa ele parou de cantar e disse: o que pensa que está fazendo? Não sabes tu que o mundo está em guerra e que há passarinheiros em todos os lugares? Um dia eu fui de uma grande espécie, e cantavam meus ascendentes nas árvores da floresta e nos alimentávamos com tantas frutas e sementes, depois bebíamos e descansávamos nos galos das árvores e lá criávamos nossos filhos.

Onde estão meus irmãos e onde está a floresta, e as arvores de verdade, tudo agora é de plástico para que o homem não se dê ao trabalho de regar. E as frutas, e a água para bebermos? Meu amigo humano, vocês acabaram com tudo e agora tudo o que me resta é viver sob a ordem oculta de um cantar funcional, e se aqui dentro é triste o meu cantar, mas triste é saber que morrerei por um tiro, ou se muita sorte tiver, morrerei cantando, sedentário nessa gaiola comendo e cantando até que eu morra à sombra dessa prisão.

Por isso, tome juízo e me deixe viver, embora preso, pois mais vale a prisão por inocência, que a morte por consequência.