INSÔNIA
O celular tocou a primeira vez. Eu estava cansado, meu dia tinha sido estafante, já passava da meia noite, não estava a fim de atender.
Meus olhos se fecharam ao som da música dos Beatles.
Novamente o celular tocou. O mesmo número sem identificação de um nome em minha agenda.
Quem seria o chato para ligar a aquela hora. 1:30 da manhã.
Relutei, mas atendi.
Uma voz suave e sexy de mulher perguntou.
---- tudo bem? Cansado?
Eu estava era com o saco cheio, sendo acordado naquela hora por alguém sem identificação.
Minha resposta foi curta e grossa.
---- mocinha, trabalhei 12 horas durante o dia e boa parte da noite, se tiver algo importante para dizer, diga, caso contrário vou desligar.
Acho que foi impressão minha, mas ela pareceu sorrir, mesmo eu não vendo esse sorriso.
---- nossa está bravo, não fique eu só quero a sua companhia. - afirmou em voz suave e excitante.
---- acho que ligou para a pessoa errada, estou noivo e vou me casar daqui há um mês.
Agora escutei um riso sarcástico.
---- não sou ciumenta, o que você faz na vida? - a indagação não mereceria uma resposta, mas aquela voz estava me deixando louco.
--- porque você acha que eu vou responder a sua pergunta, nem a conheço.
Um silêncio perturbador.
--- porque você esta excitado e sua noiva viajando, só vai voltar daqui há uma semana.
Fiquei perturbado. O que ela afirmava era verdadeiro, como sabia da minha vida íntima. Então ela sabia qual era a minha profissão.Pensei por alguns segundos. Seria alguma amiga da minha noiva querendo me testar? Ou seria a minha própria noiva pedindo para que uma outra mulher provocasse o futuro marido.
---- não sei o que pretende, mas com certeza não vai dar certo.
---- verdade. Então porque não desliga. - insinuou a voz sexy do outro lado da linha.
Eu queria desligar, mas não sei se era a curiosidade ou o tesão a flor da pele que me mantinha ao celular.
Perguntei.
---- qual e o seu nome.
A resposta veio imediatamente.
---- insônia.
Eu ri.
---- ta. Você tem insônia e agora fode com o meu sono.
O riso dela foi sarcástico ao mesmo tempo que luxuriante.
----- adorei a palavra que você usou, eis algo interessante.
Ela estava me deixando fora de controle. Precisava encerrar aquele diálogo antes que algo mais grave pudesse acontecer.
Fiz menção de apertar o botão stop no celular, quando de repente ouvi um choro de recém nascido.
Era um choro tênue, que mais parecia um pedido de socorro.
--- seu filho está chorando, e pelo jeito está com fome ou dor, porque você não vai cuidar dele.
A voz antes suave e sensual, tornou-se agressiva e violenta.
--- filho porra nenhuma, não tenho filho, e nunca vou ter.
Um novo choro, desta vez o pedido de socorro parecia entrar por meu cérebro e ir de encontro ao meu coração.
Insisti.
--- O seu filho esta chorando, porque você não vai cuidar dele.
A voz agora se tornou melancólica, suicida.
--- logo não vamos mais precisar de cuidados, estaremos todos juntos novamente.
Com certeza aquela mulher estava demente. Existe uma doença após o parto, chamada de PSICOSE PUERPERAL.
Peguei o meu telefone celular particular, que eu só uso para contatos com a minha noiva, filhos, e amigos. Liguei para o Hospital na Maternidade.
Deus ilumina sempre o meu caminho.
--- Maternidade. Santa Casa. Simone Ribeiro.
Era madrugada, e a enfermeira Simone
é a chefe da maternidade ela não trabalha a noite, mas sem dúvida a pessoa de quem eu precisava naquele momento.
Enquanto isto eu fazia algumas perguntas a mulher que se denominava INSÔNIA, para ganhar tempo nas minhas investigações.
--- Simone, sou eu....
Ela não deixou eu terminar a frase.
--- eu sei que é o senhor dr....., porque esta ligando a esta horas.
--- não vou nem perguntar o que você esta fazendo no hospital, não é horário seu, mas preciso que veja o se lembra de algum parto complicado nos últimos 15 dias.
Silêncio.
--- sim doutor, aquela paciente de 18 anos, parto normal, que o noivo sofreu um acidente quando vinha visitá-la e faleceu. Ela ficou desnorteada, saiu medicada com ansiolíticos. Acho que ainda tenho o prontuário dela aqui no arquivo.
--- Veja o endereço para mim. È muito importante, ela e o filho correm perigo de vida.
Voltei a conversar com a senhora INSÔNIA.
--- Desculpe-me, fui ao banheiro, não estou acostumado a ficar acordado neste horário, como você está? -
A voz dela estava estranha quando me deu a resposta, parecia bêbada, prestes a cometer alguma besteira.
--- não me importo, nada mais tem importância em minha vida.
Com certeza algo de ruim estava prestes a acontecer.
Um chorinho de sofrimento soou ao fundo.
Simone, falou no outro celular.
--- doutor o endereço é Av. Antonio da Rocha Marmo, 261, Vila.
--- eu sei onde é, avise o Resgate, diga que é suicídio eu estou indo para lá.
desliguei o meu celular particular.
--- Insônia. Cade você?. - perguntei
Não veio resposta. Apenas um gemido, e um chorinho de recém nascido pedindo clemência.
Coloquei a roupa igual um louco e fui para o endereço citado, eu sabia onde era.
Cheguei junto com o Resgate, a Luz da casa estava acesa, um odor de gás saia pelas frestas da porta. O tenente Máximo enquanto escutava o que eu dizia, arrombou a porta com os pés. Entramos eu e a equipe de socorro. A a casa era pequena, sala,banheiro,quarto,cozinha.
Auxiliares abriam todas as janelas e porta. O botijão de gás, fechado e retirado do ambiente.
Enquanto isso a equipe médica, oxigenava a mãe e o recém nascido estirados no carpete da sala abraçados um ao outro. O telefone celular estava caído. Eles ainda viviam.
O Resgate fora eficiente, ela começou a apresentar vômitos, o filho também, foram levados com urgência para o hospital.
Sobreviveriam.
Meu celular tocou.
--- bom dia amor. - Disse a minha noiva. Continuando.--- estou ligando para te acordar, assim você não perde a hora.
A bateria estava acabando.
--- bom dia meu amor, você não imagina como é bom ouvir sua voz, já estou acordado, vou tomar um banho e pegar o plantão, vai acabar a bateria do celular, ligo assim que chegar no hospital.
TE AMO Aline Perini.
O Celular ficou mudo.
Eu tinha um horário a cumprir. Olhei para o relógio. Sete horas, com certeza iria chegar atrasado, mas tudo bem, o cansaço tinha uma boa causa.
Leiam sobre PSICOSE PUERPERAL.